Um dos fundadores do PT, ele afirma que a presidente havia prometido em dezembro recebê-lo

O primeiro senador eleito pelo PT deixará o Senado neste sábado (31), após 24 anos de mandato, com a frustração de não ter sido recebido sequer uma vez pela presidente Dilma, sua companheira de partido. Há um ano e meio, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) aguarda ser chamado pela presidente. O pedido foi reiterado pessoalmente em dezembro, quando ele a cumprimentou durante a sua cerimônia de diplomação. Na última terça (27), Suplicy enviou uma carta a Dilma em que questiona se alguém do Palácio do Planalto quer impedir o encontro entre os dois. Novo e-mail foi encaminhado na quinta-feira (29) ao gabinete de Dilma com o mesmo propósito. Nenhum retorno até o momento.

Prestes a assumir a Secretaria de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo, Suplicy disse ao Congresso em Foco que não perdeu as esperanças – mesmo diante do fato de que seu mandato chega ao fim, na prática, nesta sexta-feira (30), e ele ainda terá compromissos acadêmicos no Nordeste (os novos senadores assumem no próximo domingo, 1º de fevereiro). O senador viajou para fazer palestras na Universidade Federal do Maranhão, mas ressalta que voa imediatamente para Brasília se Dilma chamá-lo para uma audiência.

“Eu disse a ela que há 24 anos sou senador do PT pelo Estado de São Paulo, que ela sabe o quanto eu a tenho apoiado em praticamente todas as pautas discutidas, e sempre votado de acordo com o governo. E que seria justo que ela pudesse me receber. Estou nessa expectativa”.

Perguntado sobre a razão de Dilma não tê-lo recebido em mais de quatro de anos de mandato, Suplicy não tergiversou. “Você vai precisar perguntar para ela”, disse, bem- humorado. No dia 6 de janeiro, o senador enviou uma mensagem à presidente, lamentando o veto que ela impôs a um projeto de sua autoria que instituía a linha de pobreza oficial no País.

“Vamos marcar”
Na última carta enviada à petista, Suplicy lembra que ela mesma assumiu o compromisso de recebê-lo ainda como senador. A declaração foi arrancada de Dilma por Suplicy em dezembro, quando a presidente foi diplomada para o seu segundo mandato presidencial.

Na ocasião, em meio aos cumprimentos, o senador perguntou à companheira de partido se não considerava justo o encontro, dada sua importância histórica como um dos fundadores do PT e de sua atuação fiel como membro da base no Parlamento. E dela ouviu: “Mais do que justo!”, disse-lhe Dilma, acrescentando: “Vamos marcar”.

Na véspera de enviar a carta a Dilma, ainda na segunda-feira (26), Suplicy consultou o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Miguel Rossetto, para saber se alguém do Planalto queria impedir seu encontro com a presidente. Rossetto garantiu ao parlamentar que não havia qualquer objeção e que falaria com a própria Dilma para que o recebesse.

Papa e Evo Morales
A preocupação do senador é relatada na carta em que lembra a dificuldade que o presidente da Bolívia, Evo Morales, teve para ter uma audiência com o Papa Bento XVI no Vaticano. Segundo Suplicy, Evo passou dez anos em vão à espera de um encontro com o sumo pontífice que nunca se realizou. Coube ao Papa Francisco, argentino, realizar o desejo do presidente boliviano. “Ele (Evo) queria muito conversar, uma vez que justo na Igreja Católica da Bolívia havia forte oposição a ele. Souberam que todas as vezes que ele tentava, a Cúria na Bolívia se movimentava para que não acontecesse”, escreveu Suplicy, que conta ter sido aconselhado por petistas a se “postar no Palácio do Planalto até ser recebido”.

Os desencontros entre Suplicy e Dilma não são de hoje. Em 1º de novembro de 2010, um dia após a petista se tornar a primeira mulher a conquistar a Presidência da República, o senador levou orquídeas até a casa dela. Mas não pode entregar o presente. Aliás, não passou do portão: foi barrado por assessores de Dilma. “Disseram que ela está descansando. Na hora que ela quiser, voltarei para dar um abraço pessoalmente”, declarou a jornalistas, na ocasião, o senador.

Apesar das dificuldades na relação, o senador nunca se queixou da presidente. Em entrevista ao Congresso em Foco, ele disse que faltou sensibilidade e diálogo ao governo ao vetar o projeto que instituía a linha de pobreza. Os palacianos não teriam entendido, segundo o senador, as diretrizes da sua proposta. Na tão esperada audiência com Dilma, Suplicy pediria a constituição de uma comissão para discutir como será implementado o seu programa de Renda Básica de Cidadania, um complemento de renda a que cada cidadão terá direito, independentemente de classe social. Ele evita dizer se sente magoado com Dilma.