Em sabatina, Janot ironiza acusação de que fez acordo com o Planalto

Procurador-geral da República participa de sabatina na CCJ do Senado

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Procurador-geral da República participa de sabatina na CCJ do Senado

Em meio à sabatina a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, negou “veementemente” e ironizou nesta quarta-feira (26) a acusação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de que ele teria feito um acordo com o Palácio do Planalto para poupar investigados na Operação Lava Jato. O chefe do Ministério Público classificou a acusação de “factoide” e disse que, para fechar tal acerto, teria de “combinar com os russos”.

Ao anunciar, no mês passado, seu rompimento com o governo federal, Cunha acusou o Planalto de ter se articulado com o procurador-geral da República para incriminá-lo na Operação Lava Jato. Na última quinta (20), Janot apresentou denúncia ao STF (Supremo Tribunal Federal) contra Cunha por corrupção e lavagem de dinheiro.

Em uma nota divulgada no dia da denúncia, Cunha voltou a atacar o procurador-geral, insinuando que ele havia sido “escolhido” para ser investigado pela PGR. Além disso, o peemedebista disse que com o desenrolar dos fatos, o país assistiria à comprovação da atuação do governo no episódio de sua denúncia à Suprema Corte.

“Ainda que quisesse fazer um acordo desses, teria que combinar com os russos, 20 colegas e um grupo de delegados muito preparados da Polícia Federal”, ironizou.

“Eu nego, veementemente, a possibilidade de qualquer acordo que possa interferir nas investigações. Senador, há mais de 35, 36 anos, fiz opção pelo direito. Há 31 anos, fiz opção pelo Ministério Público. A essa altura da minha vida, não deixaria os trilhos da atuação técnica do Ministério Público para me embrenhar num processo que não domino e não conheço, que é o caminho da política”, acrescentou o chefe do MP.

Indicado pela presidente Dilma Rousseff para mais um mandato à frente da Procuradoria Geral da República (PGR), Janot precisa, para ser mantido no cargo, ter seu nome aprovado pela CCJ do Senado e, posteriormente, pelo plenário principal da Casa.

Ao fazer sua apresentação inicial na sabatina, o procurador-geral da República afirmou que sua tentativa de ser reconduzido ao cargo por mais dois anos não tem como objetivo a “satisfação de seu ego” ou a “sofreguidão do poder”.

“A minha motivação para tentar a recondução ao cargo não se presta à satisfação do ego ou à sofreguidão do poder. Não é isso que me move. Me move a firme vontade de continuar a servir à minha nação. Venho aqui após ter tido o reconhecimento de 799 colegas do MPF e de ter sido indicado pela presidente da República”, declarou Janot em sua primeira manifestação na sabatina do Senado.

Um dos políticos denunciados pela PGR na Operação Lava Jato, o senador Fernando Collor (PTB-AL) foi o primeiro parlamentar a se acomodar no plenário da CCJ do Senado para a sabatina do chefe do Ministério Público. Suplente do colegiado, o ex-presidente da República chegou ao plenário da comissão por volta das 9h40 e se sentou na primeira fileira de assentos do recinto (veja ao lado). Exatamente 20 minutos depois a sessão teve início.

Diante de Collor, o procurador-geral defendeu, durante seu breve discurso antes de começar a responder aos questionamentos do colegiado, a punição de culpados “sem distinção de qualquer natureza”.

“A mensagem que a linguagem simples do povo traduz no ‘pau que dá em Chico, dá em Francisco’ transmite à sociedade mensagem essencial de igualdade, de republicanismo, de isenção de privilégios, de impessoalidade, e, acima de tudo, de funcionamento regular do estado”, enfatizou.

Sem citar diretamente a Operação Lava Jato, o procurador-geral da República afirmou que o país vive um momento em que “fatos graves são investigados”.

“No campo de atuação do Ministério Público Federal, esse momento, no qual fatos graves são investigados, é a oportunidade para que o embate jurídico entre acusação e defesa se caracterize pela lealdade recíproca e a consolidação de ideais éticos que são a base da sociedade democrática”, declarou.

Dez dos 13 senadores investigados na Lava Jato compõem a comissão responsável por sabatinar Janot. Uma dificuldade que o procurador-geral poderá enfrentar na sessão é o desgaste gerado pelas investigações do esquema de corrupção que atuava na Petrobras.

Todos os 81 senadores podem comparecer à comissão, se desejarem, para fazer perguntas ao procurador-geral. Porém, somente os membros titulares terão direito a votar o parecer que a CCJ encaminhará ao plenário do Senado, recomendando ou não a aprovação do nome de Janot. Na ausência de um titular, um suplente do mesmo bloco adquire o direito de votar.

 

Collor

Denunciado por Janot por corrupção e lavagem de dinheiro, Collor passou a fazer parte da CCJ uma semana antes da sabatina do procurador-geral. Na última terça (18), o senador de Alagoas passou a integrar o colegiado como suplente, no lugar do senador Douglas Cintra (PTB-PE).

Assim que Janot terminou seu pronunciamento inicial na sabatina, Collor questionou ao presidente da comissão, senador José Maranhão (PMDB-PB), detalhes sobre a ordem de inscrição dos senadores para formular perguntas ao chefe do Ministério Público. Maranhão informou ao senador alagoano que, como suplente, ele seria o quarto parlamentar a ter o direito de questionar Janot.

Collor reclamou ao dirigente da CCJ que queria ser tratado na comissão como se fosse um integrante titular, na medida em que um dos três membros permanentes de seu bloco na CCJ não estava presente à sessão. A reivindicação gerou ironias de outros senadores.

“Gostaria de lembrar o seguinte: essa praxe de dividir suplentes e titulares concorre se o titular e o suplente estiverem presentes. Mas quando o titular não está presente e o suplente está, ele passa a ser titular”, ressaltou Collor ao presidente da CCJ.

Maranhão disse que concordava com o senador do PTB, entretanto, ponderou que, na hipótese de Collor ser classificado como titular, ele seria o décimo terceiro parlamentar a ter o direito de se manifestar, e não mais o quarto. Segundo Maranhão, a regra do colegiado determina a alternância das manifestações entre membros titulares e suplentes.

Em tom irônico, o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) interveio e disse que esta era a primeira vez que ele via titulares e suplentes serem tratados da mesma forma na comissão.

 

Foro privilegiado

Ao ser questionado na sabatina sobre se o Congresso Nacional deveria acabar com o foro privilegiado, Janot sugeriu ao Congresso Nacional a redução da quantidade de autoridades que têm o benefício, ou seja, a possibilidade de ser julgado em instância maior do Judiciário.

O procurador respondeu que essa é uma decisão política e que, portanto, cabe ao Congresso decidir.

“Se pudesse sugerir, era restringir o número de  autoridades submetidas à prerrogativa de foro. São várias autoridades”, disse Janot. Atualmente, ministros, senadores, deputados e outras autoridades têm essa prerrogativa.

No caso da Lava Jato, as pessoas citadas que têm foro privilegiado – como o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o senador Fernando Collor (PTB-AL) – terão seus casos julgados pelo Supremo Tribunal Federal, e não na primeira instância do Judiciário.

 

Delação premiada

Janot disse que há um “mal entendido” sobre a colaboração premiada. “O colaborador não é um dedo duro, não é um X9. […] O colaborador, pela lei, tem que reconhecer a prática do crime. Ele vem, confessa a pratica do crime e diz quais são as pessoas que estavam também envolvidas na prática daqueles delitos”, disse.

O procurador defendeu as delações premiadas, que, segundo ele, aceleram as investigações. “Investigação é tentativa e erro”, disse.

Janot reforçou que a lei estabelece que o colaborador estará cometendo um crime se mentir sobre a participação de um terceiro no crime. Ele disse, ainda, que o “mero depoimento” do delator não configura uma prova.

“O que você tem que fazer é comprovar a circunstância e a vinculação da pessoa. Cabe ao Ministério Público fazer essas comprovações, aí sim ganha força o depoimento do colaborador”, esclareceu.

 

Acordo de leniência

Janot reafirmou o entendimento de que os acordos de leniência, que podem ser firmados pela CGU (Controladoria-Geral da União) e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), devem ter a concordância do Ministério Público para ter efeito na esfera penal (assista ao vídeo acima).

“Esses acordos de leniência, a não ser que o Ministério Público com ele concorde, eles não têm reflexo na esfera penal”, disse. “Ele tem reflexo no âmbito da CGU e do Cade, mas não no âmbito penal”, completou.

 

Pedaladas fiscais

Ao sabatinar Janot, o senador Aloyzio Nunes (PSDB-SP) questionou ao procurador sobre a suposta demora dele para responder a uma representação de PSDB, PPS e DEM para que sejam apuradas, sob o aspecto penal, as manobras fiscais do governo nas contas públicas, as chamadas “pedaladas fiscais”.

Janot, então, ressaltou que seu gabinete tem prazos fixados para tramitação dos processos, mas explicou que, neste caso específico, foi necessário solicitar manifestações de todas as autoridades envolvidas antes de tomar uma decisão. Conforme ele, atualmente ele aguarda as respostas da Presidência da República.

 

Presidente da República

Janot defendeu que a jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal (STF) entende que o presidente da República em exercício não pode ser alvo de investigação durante o mandato.

Ele argumentou que uma decisão anterior do ministro Celso de Mello que diferenciava a fase da investigação da etapa da responsabilização, sustentando ser possível apurar a atuação do presidente durante o mandato, mas não responsabilizá-lo, ficou ultrapassada.

“Conheço essa decisão do ministro Celso Mello. Após essa decisão, houve outras em sentido contrário”, observou Janot.

 

Porte de drogas

Janot reforçou em meio à sabatina sua posição contrária à descriminalização do porte de uma quantidade mínima de drogas. O tema está sob análise do Supremo.

Na última quinta (20), o ministro do STF Gilmar Mendes votou a favor da descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal. O julgamento, no entanto, foi interrompido por um pedido de vista do ministro Edson Fachin, que alegou a necessidade de analisar melhor o caso antes de apresentar seu voto. Não há previsão de quando o tema voltará a ser apreciado pelos magistrados do Supremo.

Aos senadores, o procurador-geral argumentou que a discussão em torno do porte de drogas não está bem focada, já que não especifica qual entorpecente passaria a ser permitido.

“Quando se fala em porte de uma quantidade mínima, se associa à maconha. Mas o porte se refere a qualquer droga”, ponderou Janot, exemplificando outras drogas, como crack e cocaína.

Janot argumentou, ainda, que a estrutura do tráfico de drogas teria condições de “rapidamente montar um exército de formiguinha”, se o porte de pouca droga for descriminalizado.

 

Swissleaks

O primeiro a questionar Janot na sabatina foi o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), relator do processo de indicação do procurador a um novo mandato no comando da PGR.

Ferraço, que também ocupa o posto de relator da CPI que apura eventuais irregularidades relacionadas a brasileiros nas denúncias do “Swissleaks”, questionou ao chefe do MP quando a comissão de inquérito poderá ter acesso a dados da PGR sobre as contas de brasileiros na filial suíça do HSBC.

O senador do PMDB argumentou que há indícios de que o caso poderia estar ligado à Lava Jato. “Há um conjunto de indícios de que esse caso poderia ter ligação com a Operação Lava Jato, porque há circunstâncias e conexões de denunciados na Lava Jato que poderiam ser correntistas dessa agência bancária na cidade de Genebra”, destacou Ferraço.

Janot, então, explicou que a PGR tem os dados divulgados pelo o ex-técnico do HSBC Hervé Falciani, que é conhecido como “Edward Snowden do setor bancário”, em referência ao ex-técnico da CIA que revelou o esquema de espionagem dos Estados Unidos.

O procurador-geral disse que há um problema técnico para acessar os dados e argumentou que o órgão não tem autorização de autoridades francesas para compartilhar as informações com a CPI. “Esses dados chegam de forma protegida. A divulgação contamina a possibilidade de acordo entre países.”

Janot informou ainda que esteve com um juiz ligado ao caso, na Europa, e que ele disse que “assustou com o número de brasileiros e com o valor dos depósitos que estão naquele banco”.