A Rota Bioceânica, um projeto logístico ambicioso, transcende fronteiras e promete transformar não apenas a dinâmica econômica, mas também os desafios e oportunidades na segurança pública em Mato Grosso do Sul. Esta via intercontinental, cujos principais protagonistas são o Brasil, Paraguai e Chile, busca estabelecer uma ligação eficiente entre os oceanos Atlântico e Pacífico. Apesar dos benefícios econômicos e comerciais que a rota deve proporcionar, sua implementação traz consigo desafios significativos que precisam ser considerados, especialmente no contexto da qualidade de vida da população local.

Histórico e Objetivos: A ideia da Rota Bioceânica, remontando a décadas passadas, ganhou força recentemente devido à busca por soluções logísticas mais eficientes. Essa rota multimodal, envolvendo rodovias, ferrovias e portos, visa não apenas reduzir os custos logísticos, impulsionar o comércio e fortalecer a integração regional, mas também alterar a dinâmica econômica em Mato Grosso do Sul. Com o potencial de aumentar a competitividade regional e agregar valor aos produtos, a rota pode desencadear uma mudança significativa no perfil econômico do estado, historicamente centrado na atividade agropecuária.

Impactos na Segurança Pública: Com a perspectiva de crescimento econômico e expansão das atividades comerciais ao longo da Rota Bioceânica, a segurança pública em Mato Grosso do Sul enfrenta desafios complexos e interligados. A oportunidade de melhoria logística também é vista pelas organizações criminosas, destacando a necessidade de um planejamento estratégico por parte dos órgãos de segurança pública. Ações planejadas, como o aumento da fiscalização em fronteiras e rodovias, tornam-se essenciais para mitigar o potencial aumento de crimes transfronteiriços. Todavia, não é o único e nem o principal desafio, pois não se pode negligenciar a segurança pública local que será pressionada em razão de aumento populacional, implantação de empresas com grande potencial financeiro e produtivo e os riscos ambientais inerentes ao processo.

Crimes Urbanos nos Municípios: O incremento no fluxo de pessoas, mercadorias e investimentos ao longo da Rota Bioceânica pode gerar um aumento populacional significativo nas áreas urbanas próximas. Esse crescimento demográfico, historicamente vinculado ao aumento dos índices de crimes urbanos, destaca a necessidade de preparação por parte das autoridades locais. Investimentos em infraestrutura de segurança, treinamento policial e programas sociais preventivos são imperativos para garantir a segurança da população e a qualidade de vida nas regiões afetadas. Aumento do efetivo policial militar nas cidades diretamente impactadas é urgente, pois sabemos o prazo de um processo seletivo, treinamento e formação policial. Melhoria da infraestrutura local com construção, ampliação e modernização das infraestruturas, assim como aquisição de viaturas, equipamentos e comunicação modernas para o desenvolvimento das atividades preventivas nos municípios que serão impactados.

Crimes Transfronteiriços: A interligação de países ao longo da rota torna as fronteiras mais permeáveis, facilitando a movimentação de criminosos transnacionais. O tráfico de drogas, contrabando, crimes ambientais e outros crimes encontram oportunidades em uma rota logística extensa como essa. Cooperação internacional e acordos bilaterais de segurança tornam-se cruciais para uma resposta coordenada entre as forças policiais dos países envolvidos, protegendo não apenas Mato Grosso do Sul, mas toda a região. Sendo importante que os órgãos estaduais estejam preparados para os novos desafios que advirão, principalmente na área urbana no tocante aos crimes patrimoniais, que tendem a aumentar consideravelmente com aumento populacional e circulação de valores.

Conclusão: A Rota Bioceânica não apenas promete transformações econômicas positivas em Mato Grosso do Sul, mas também apresenta desafios cruciais na esfera da segurança pública. Uma abordagem integrada, considerando a especificidade do estado, envolvendo cooperação internacional, investimentos em segurança e políticas sociais adaptadas à realidade local, é essencial. Mas, principalmente no tocante ao governo estadual, investimento e planejamento na atividade preventiva (policial militar), de forma a se preparar para as novas demandas sociais e econômicas que serão postas nas áreas urbanas.

Com relação as fiscalizações de fronteiras e divisas o governo federal tem a sua incumbência e não pode transferir para o Estado, que por óbvio pode auxiliar, mas de forma subsidiária, sem abrir mão de priorizar o seu papel constitucional no atendimento da população local, por meio da polícia ostensiva e preservação da ordem pública. O desenvolvimento econômico deve estar alicerçado em sustentabilidade ambiental, social e uma governança eficiente que proporcione agilidade, otimização e eficiência dos serviços públicos, incluindo a segurança.

Olhar a rota somente pelo viés de porta de entrada, saída e passagem torna míope a visão do problema, pois os desafios vão além, os municípios impactados diretamente e indiretamente serão pressionados em suas áreas urbanas com problemas para a população. Por isso, os investimentos devem visar o incremento da atividade policial preventiva, de forma a garantir à população local a preservação da ordem pública e por conseguinte a sua qualidade de vida.

Somente assim os benefícios econômicos podem ser plenamente realizados e transformados em serviços de qualidade, a rota pode se consolidar como um vetor de desenvolvimento seguro e sustentável para Mato Grosso do Sul, que trará riquezas sim, mas, principalmente traduzindo-se em uma melhoria significativa na qualidade de vida da população sul-mato-grossense sem impactar negativamente na sua tão importante e almejada segurança pública.

* Coronel da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso do Sul