Vacina contra dengue não deve ser tomada por quem nunca teve o vírus, diz Anvisa
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) decidiu elevar a restrição em relação à vacina da dengue produzida pela Sanofi Pasteur, a única até agora aprovada e disponível no país. Na prática, a agência passará a contraindicar o uso desta vacina em pessoas que nunca tiveram contato com nenhum dos quatro sorotipos do vírus da […]
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A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) decidiu elevar a restrição em relação à vacina da dengue produzida pela Sanofi Pasteur, a única até agora aprovada e disponível no país.
Na prática, a agência passará a contraindicar o uso desta vacina em pessoas que nunca tiveram contato com nenhum dos quatro sorotipos do vírus da dengue.
A medida ocorre após estudos feitos pela empresa apontarem risco de pessoas que nunca tiveram a doença desenvolvam formas mais graves de dengue caso sejam infectadas pelo mosquito Aedes aegypti.
O resultado faz parte de um estudo de monitoramento da Sanofi em pacientes que receberam a vacina na fase de estudos clínicos em outros países, os quais avaliam a eficácia e segurança do produto.
Em novembro do ano passado, a agência já havia inserido uma advertência na bula recomendando que pessoas soronegativas para a dengue não tomassem essa vacina, conhecida como Dengvaxia. A alegação, à época, é que a medida ocorria como cautela até que fossem feitas novas avaliações sobre o caso.
Com o término dessas avaliações, a Anvisa passa a contraindicá-la para esse grupo.
“A bula anterior dizia que era uma precaução verificar a sorologia do paciente. Hoje essa precaução se transforma em uma contraindicação à vacina [para quem nunca teve o vírus]”, diz a diretora de autorizações e registros da agência, Alessandra Bastos Soares.
Ela lembra que, até novembro do ano passado, a vacina era indicada para pessoas de 9 a 45 anos que moram em áreas endêmicas, independentemente ou não de já terem tido a doença.
Agora, a vacina continua a ser indicada para esse grupo, desde que haja confirmação de que a pessoa é soropositiva para dengue. “É fundamental que seja feita a sorologia do paciente”, diz Soares, que recomenda que profissionais de saúde peçam exames antes de orientar sobre a aplicação.
Em outra mudança, a Anvisa também passa a definir como “área endêmica” todos os municípios onde mais de 70% da população já foi infectada por um dos quatro sorotipos da dengue.
A previsão é que as bulas sejam alteradas em até 30 dias. No caso de vacinas já distribuídas, a ideia é que novo documento seja enviado às clínicas até o fim desse período. No mesmo prazo, a empresa também terá que apresentar um plano de mitigação de riscos, o qual deve envolver acompanhamento de pacientes já vacinados, informa.
Aprovada em 2015 pela Anvisa, a vacina produzida pela Sanofi foi a primeira a ganhar a permissão para ser comercializada no país. Outras empresas, como Instituto Butantan, também desenvolvem vacinas contra a doença -tais produtos, porém, ainda estão em fase de testes.
Apesar da aprovação, a vacina da Sanofi já era vista com ressalvas por técnicos do Ministério da Saúde, para quem o produto tem baixa eficácia -cerca de 66%. A situação fez com que a discussão sobre sua inclusão no Programa Nacional de Imunizações fosse postergada.
Atualmente, a vacina está disponível em clínicas particulares, ao custo de até R$ 135 a dose. Desde agosto de 2016, a vacina também é usada em campanhas pelo governo do Paraná. Ao menos 300 mil pessoas, 30 municípios do estado, já foram vacinadas.
RISCO ‘POTENCIAL’
Questionada pela reportagem, a diretora-médica da Sanofi, Sheila Homsani, afirma que os dados sobre risco ainda são preliminares. Ainda assim, afirma que a empresa deve cumprir a decisão da Anvisa.
“Não temos certeza se teria risco, mas como os dados mostraram essa possibilidade, estamos de acordo com a decisão. Se a pessoa já teve dengue antes, ela vai se beneficiar da vacina. Ao mesmo tempo, evitamos o risco por soronegativos”, diz.
De acordo com a Anvisa, o risco seria de cinco casos de internação a cada mil pacientes que nunca tiveram dengue e vacinados contra a doença. Já os casos de dengue severa (também chamada de dengue com sinais de alarme, etapa anterior ao quadro grave) somariam dois a cada mil.
Para Homsani, os dados não tem “relevância estatística”. “Pode ser que o resultado ocorra por acaso. Precisamos de um estudo maior. Enquanto isso, entendemos que é melhor não vacinar soronegativos.”
Presidente da Sociedade Brasileira de Dengue e Arboviroses, o infectologista Artur Timerman contesta e diz que os dados mostram alerta e exigem monitoramento. Ele também orienta que pacientes que tomaram a vacina reforcem medidas de precaução contra o mosquito.
“É preciso alertar as pessoas que tomaram a vacina de que elas esto correndo esse risco. Ao primeiro sintoma, devem procurar o serviço médico, porque o tratamento precoce pode evitar evolução para formas graves”, diz.
Apesar de ver a decisão da Anvisa como correta, Timerman diz que o critério de recomendar a vacina a pessoas positivas para dengue e que vivem em áreas endêmicas traz uma lacuna: a falta de estudos soroepidemiológicos no país.
“Hoje, não sabemos quantas pessoas já tiveram dengue. E com a zika, há uma confusão, porque as sorologias às vezes se cruzam. Quem teve zika, pode aparecer com anticorpos contra a dengue”, diz ele, para quem o ideal é que a vacina só seja indicada quando não haja dúvidas sobre o quadro anterior.
Mas o que leva a esse aumento no risco para quem nunca teve contato com o vírus?
De acordo com a Anvisa, o risco provavelmente ocorre porque a vacina, neste caso, seria interpretada pelo organismo do paciente soronegativo como uma primeira infecção. Em geral, novas infecções por dengue tendem a ser mais graves do que a primeira.
A agência reforça que, para pacientes soropositivos, a vacina ainda é indicada e apresenta eficácia de 73%, evitando casos mais graves que levariam a internações, informa.
Dados do governo do Paraná e de clínicas particulares apontam que ao menos 350 mil pessoas já receberam a vacina contra a dengue no país.
Já a Sanofi diz não ter esses dados. A empresa, porém, afirma que foram aplicadas 1 milhão de doses desde que a vacina foi aprovada. Não há informações de quantas receberam mais de uma dose –a vacina precisa de três para ter eficácia.
Ainda de acordo com Homsani, pessoas que já tomaram uma das doses devem completar o esquema normalmente para manter a proteção. “O indivíduo que era soronegativo e se vacinou, já recebeu a vacina.
Não temos como saber se era soronegativo antes. Neste caso, tem que terminar o esquema vacinal. Não faz sentido parar, porque já recebeu os antígenos”, afirma.
Já aquelas que ainda não iniciaram o esquema e desejam se vacinar devem fazer exames para verificar se já tiveram contato com o vírus, informa.
A VACINA DA DENGUE Nome: Dengvaxia
Fabricante: Sanofi Pasteur (França)
Aprovação pela Anvisa: Dezembro de 2015
Aplicação: Três doses, uma a cada seis meses
Indicação: Pessoas entre 9 e 45 anos de idade, soropositivas para dengue e que moram em áreas endêmicas (onde 70% ou mais pessoas tiveram dengue)
Contraindicação: Pessoas soronegativas para a dengue, ou seja, que nunca tiveram contato com o vírus, além de gestantes, pessoas com risco de reações alérgicas ou baixa imunidade, entre outros
Preço em clínicas particulares: até R$ 138,53 a dose (aplicação também pode ser cobrada)
Na rede pública: Não está disponível a nível nacional
Em outros países: Foi aprovada em 19 países (o Brasil foi o 2º, depois do México)
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