O defensor público Helkis Clark Ghizzi, pai do advogado Bruno Ghizzi, se tornou réu no âmbito da Operação Courrier, que apurou a chamada Sintonia dos Gravatas, e conseguiu liberdade provisória. O grupo de advogados estaria atuando com o PCC (Primeiro Comando da Capital).

Após a suspeição do juiz Márcio Alexandre Wust dos processos, que tramitam na 6ª Vara Criminal, o juiz Roberto Ferreira Filho assumiu a decisão pela denúncia contra o defensor público. Na peça, o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) aponta que investigou conversas entre Bruno e Helkis.

Em alguns prints, foram identificadas mensagens entre Bruno e Helkis, em que o defensor estaria auxiliando o filho com informações possíveis de serem obtidas apenas por servidor público. Um então assessor na época estaria captando clientes para o escritório de Bruno, também identificou a acusação.

A operação em que Helkis foi preso identificou que ele era tratado como ‘Mestre’ pelos outros integrantes da organização criminosa. A denúncia foi recebida pelo magistrado no dia 13 de julho.

Liberdade com fiança

Na mesma decisão, o juiz concedeu a substituição da prisão preventiva de Helkis Clark, detido em março deste ano, por prisão domiciliar. Neste período, no entanto, ele fica proibido de manter qualquer contato com os outros réus no processo.

Também não pode se ausentar da cidade sem prévia comunicação ao juízo e teve a função pública como defensor suspensa. Ele cumprirá recolhimento domiciliar noturno, com monitoração eletrônica.

Para ser solto, foi imposta fiança de 30 salários mínimos. Logo após a decisão, a defesa do réu anexou o guia de pagamento, no valor de R$ 39.600.   

Denunciados

Conforme as investigações do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), Bruno frequentava a Defensoria Pública, onde costumava ir até a sala do pai. Na sala, o defensor trabalhava junto com o assessor. Em diversas páginas da denúncia, conversas entre o advogado e o assessor são relatadas.

Nos trechos, é possível identificar o advogado pedindo informações sigilosas sobre determinadas pessoas. Tais informações eram acessadas pelo login e senha de Helkis, segundo o Gaeco sob anuência do defensor.

Depois, tudo era repassado ao advogado. Desta forma, ele também captava clientes, mesmo após apresentarem declaração de hipossuficiência, devendo serem representados pela Defensoria.

Os pagamentos eram feitos de maneira irregular. Além disso, Bruno repassava valores ao pai e ao assessor, o que configura o crime de corrupção ativa e passiva.

Ainda conforme apurado pelo Gaeco, o crime foi cometido mais de 10 vezes. Nas investigações foi identificado que Bruno teve acesso a informações privilegiadas de uma operação.

Na ocasião, em outubro de 2020, Bruno soube da Operação Ponto Cego, do Gaeco. Nesta ação, os alvos eram integrantes do PCC. Um deles foi alertado por Bruno a ocultar provas, como os celulares.

Já em 2021, linha telefônica que era interceptada pelo Gaeco foi usada pelo advogado para pedir informações sigilosas ao assessor. Tudo foi documentado e agora consta como prova contra os acusados.

Para a acusação, a atuação do trio permitia que o advogado tivesse acesso aos principais bancos de dados sigilosos do Estado. “Para o desempenho das atividades privadas do escritório GHIZZIADVOCACIA, o que, somado aos demais episódios de corrupção descritos nas outras denúncias oferecidas em decorrência da Operação Courrier, outorgou-lhe, perante os integrantes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital, o título de ‘PAPA DA EXECUÇÃO PENAL’”, pontua a denúncia.

Tal fama de conseguir dados sigilosos era questionada, mas Bruno dizia que tinha familiares no Fórum de Campo Grande. Já no Gaeco, em interrogatório, ele confirmou que ia até a sala do pai para consultar as informações.

Mestre

A partir das fases da operação, novas provas foram produzidas contra pai e filho. Bruno foi preso em março de 2022, na primeira fase da Courrier. Nesta fase, foi cumprido mandado de busca na sala de Helkis Clark.

Lá, foram apreendidas procurações assinadas, todas apontando Bruno como advogado responsável pelo patrocínio. Ainda para o Gaeco, Helkis era quem coordenava essas ações.

O assessor ainda foi exonerado após a operação, contra a vontade do defensor, como aponta a denúncia. Na casa de Helkis foi identificado um escritório de advocacia, “atuando ilicitamente com advogados subordinados a Bruno antes da prisão dele”, diz trecho da peça.

Na operação denominada ‘Mestre’, como Helkis era chamado pelo grupo, advogado foi ouvido como testemunha e confirmou que viu o nome do defensor como uma das pessoas que cessou processo sigiloso.

Além disso, Bruno entrou em contato com o cliente da ação. Essas consultas ao processo foram feitas em período noturno, o que causou estranhamento.

Além do pai, Bruno também teria recorrido a duas servidoras do Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito), em uma cidade do interior. Conforme os outros processos, ele também já teria buscado ajuda de servidor do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) e até policial penal.

No dia da Operação Maître, Helkis teria se recusado a entregar os aparelhos celulares, alegando que estavam estragados. Isso configurou para o Gaeco o crime de embaraçar investigação e obstrução à Justiça.

Além disso, os dois advogados que estavam na casa de Helkis seriam ouvidos como testemunhas. Para evitar os depoimentos, Helkis constituiu as testemunhas como advogados dele.

Assim, eles passam a usar prerrogativa de “recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo profissional”.

Por fim ainda foi identificado crime de falsidade ideológica contra Helkis, por inserir informação falsa em documento público. Ele teria inclusive solicitado à Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública) quem havia pesquisado o nome dele.

Isso, porque sabia que o nome estaria no ‘radar’ do Gaeco após as operações. Os dados foram repassados e ele obteve as informações sobre os policiais do Gaeco. Então, passou a eliminar provas ao entender que seria alvo da operação.

Também foi configurado crime de advocacia administrativa. Conforme o Gaeco, Helkis usou de meios próprios para pedir a transferência do filho de presídio. Assim, usou o poder de defensor público para interesses pessoais.

Com isso, Bruno, Helkis e o ex-assessor foram denunciados pelos crimes de corrupção ativa e passiva, violação de sigilo funcional, divulgação de segredo de Justiça, obstrução à Justiça, falsidade ideológica, advocacia administrativa e concurso material.

Ainda foi solicitada perda do cargo de defensor público por Helkis Clark.