A 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande negou recurso de dois réus em uma ação civil pública e manteve o bloqueio de R$ 880 mil em bens por suspeita de atos de improbidade administrativa que podem ter resultado no desvio de R$ 13,2 milhões na Agepen-MS (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário). A decisão é do juiz Ariovaldo Nantes Corrêa.

O caso veio à tona em 2018. Conforme a petição, o esquema seria liderado pelo ex-diretor-presidente da Agepen, Deusdete de Oliveira, que consistia na emissão de notas fiscais falsas, com desvios de recursos, procedimentos falsos de compras, que provocaram um rombo de mais de R$ 13 milhões aos cofres públicos.

Além de Deusdete, foram denunciados pelo crime de associação criminosa, peculato e corrupção passiva outros funcionários da Agepen, na época: Roseli Ribeiro Figueiredo, chefe do núcleo de compras; Pedro César Figueiredo, diretor administrativo de finanças; Maria Granja Macedo, chefe de divisão de compras; e Paulo Freire Tomaz.

Além deles, também foram denunciados por associação criminosa, coautoria e concurso material de crimes, os empresários Tânia Regina Cortez, Paula Sue Whitsell, Izolito Amador Campagna Júnior, Fernando Augusto Cortez e Frederico Jorge Cortez. 

Em janeiro de 2020, o juiz determinou o bloqueio de até R$ 880 mil de cada um dos réus. Tânia e outro denunciado, Fernando Augusto Cortez Calux, recorreram ao TJMS (Tribunal de Justiça) contra a decisão.

O desembargador Marcos José de Brito Rodrigues determinou em outubro que o magistrado de primeira instância revisse o bloqueio com base na Lei 14.230/2021, que reformou a Lei de Improbidade Administrativa para passar a exigir dolo nos atos denunciados à Justiça.

Porém, Ariovaldo Nantes Corrêa entendeu que a mudança na lei, apesar de ser benéfica aos réus, não deve ser aplicada. O juiz observou que o eventual dano ao patrimônio público pode ser “irreparável ou de difícil reparação”, sendo possível manter o bloqueio mesmo com a nova redação da Lei de Improbidade Administrativa.

“A probabilidade do direito alegado pelo requerente tem amparo na demonstração da aquisição e do pagamento de produtos não entregues ao sistema prisional, na ausência dos respectivos processos ou justificativas para a aquisição de parte desses produtos e das respectivas notas fiscais, bem como da tabulação de consumos mensais dos presídios de Amambai, Aquidauana, Cassilândia, Dourados, Jateí e Paranaíba entre os meses de janeiro de 2014 a maio de 2015 em dissonância com a quantidade de produtos hortifrutigranjeiros adquirida, demonstrando a desproporcionalidade entre a necessidade da massa carcerária e a aquisição de insumos, o que revela indícios de fraude e desvio de verba pública, além de que a aparentemente a situação não foi isolada em um único estabelecimento penal, mas constatada de forma sistêmica e conjuntural no sistema carcerário do Estado de Mato Grosso do Sul, sendo que os valores indicados na inicial foram apurados em auditoria realizada pela Secretaria de Estado da Fazenda, o que indica as incompatibilidades alhures destacadas e o montante despendido”, pontuou.

A decisão é de 4 de novembro e o juiz determinou ainda que uma cópia seja enviada ao desembargador Marcos José de Brito Rodrigues para prosseguimento do recurso em segundo grau.

Desvios na Agepen

Conforme a denúncia do MPMS, que corre sob sigilo, os réus simulavam procedimentos administrativos de compras, com listagem de necessidades de produtos para as penitenciárias do Estado, mas que, às vezes, nem sequer precisavam dos produtos. A Agepen recebia por produtos “fantasmas”.

Para os desvios, eram feitos os pedidos de materiais de limpeza, de colchões, de alimentação, sendo que ou parte apenas era entregue, ou nenhum material era entregue. Em um desses pedidos foram solicitados cerca de 11.430 colchões, mas só 2.793 foram entregues. 

Em um mês, foi pago a uma das empresas fornecedoras de hortifrutigranjeiros o valor de R$ 91 mil, para abastecer seis presídios de Mato Grosso do Sul: Amambai, Aquidauana, Cassilândia, Dourados, Jateí e Paranaíba. E, segundo dados do MP, o valor era desproporcional à massa carcerária em todo o Estado.

Ainda foi descoberto que até material de construção foi pedido, sem que fosse encontrado um projeto básico para as obras ou justificativa para a aquisição de R$ 704,4 mil. Somente dois processos de compras foram localizados.