Prefeitura de MS tenta mudar lei para derrubar exigência de nível superior para comissionados
Prefeitura de Juti enviou à Câmara Municipal proposta que altera legislação; nomeações já foram consideradas ‘farra’ e entraram na mira do MPMS
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A Prefeitura de Juti –a 316 km de Campo Grande– enviou para análise dos vereadores projeto de lei que visa a retirar a exigência de Nível Superior para preenchimento dos cargos em comissão no município. A proposta chegou ao Legislativo 24 horas depois de, sob a mira do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, o município ter exonerado 17 comissionados, incluindo secretários, sem a qualificação atualmente exigida pela legislação local.
A alegação para a elaboração da proposta é a dificuldade para encontrar quadros com essa graduação, em que pese o fato de a administração anterior ter consolidado no plano de cargos do município o diploma universitário como exigência desses postos de trabalho. Inclusive com cobranças do MPMS nesse sentido.
Em troca do diploma, a administração do prefeito Gilson Marcos da Cruz (PSD) quer a comprovação de experiência profissional ou “notório conhecimento” na atividade para a qual o comissionado será nomeado.
Os cargos de livre nomeação não exigem concurso público. Como o próprio termo diz, cabe ao gestor avaliar se o possível nomeado atende às necessidades das funções –que também devem ser em atividades-meio e, em geral, de direção, chefia, gerência e assessoramento.
A proposta deve ser votada na tarde desta quarta-feira (2) pela Câmara Municipal de Juti, escrevendo um novo capítulo na polêmica gestão de comissionados da prefeitura, já alvo de recomendações do MPMS para acabar com a suposta “farra” nas nomeações.
“É sensato e até louvável que todos os cargos comissionados sejam preenchidos exclusivamente por servidores de Nível Superior. Ocorre que tal regra não pode ser geral e sem exceções, pois a realidade local torna sua aplicação impossível e até mesmo prejudicial ao bom andamento da administração municipal”, alegou o prefeito na justificativa do projeto de lei complementar 5/2021.
‘Grau de responsabilidade e complexidade’ de cada cargo
O novo texto extrai a exigência de Nível Superior para comissionados do artigo 10 da lei complementar 23/2017, que trata do plano de cargos, carreiras e remuneração dos servidores da Prefeitura de Juti. O parágrafo único do texto hoje em vigor determina que “os cargos em comissão são destinados a habilitados em curso de Nível Superior e àqueles que tiverem notórios conhecimentos técnicos para seu exercício”.
A nova redação, em três artigos, fixa em seu primeiro parágrafo que “os cargos de provimento em comissão são de livre nomeação e exoneração, nos termos da Constituição Federal, e deverão ser preenchidos pelo critério da compatibilidade entre o grau de responsabilidade e complexidade das atribuições de cada cargo, justificada a nomeação com a publicação do currículo que ateste o conhecimento do nomeado na área de atuação”.
Os outros 2 artigos pedem que servidores de Nível Superior em cargos comissionados apresentem registro no órgão de classe, quando a atuação envolver a atividade técnica nas quais sejam formados; e fixa a jornada de 40 horas semanais para os cargos em comissão, com convocação a qualquer momento e hora “sempre que houver necessidade e no interesse da administração”.
Fábio Ebbing Urbieta, secretário municipal de Administração e Planejamento, defendeu com palavras similares às do prefeito a mudança na lei. Segundo ele, as dimensões de Juti –com 6.787 habitantes estimados em 2020– e a impossibilidade de pagar altos salários na administração pública dificultam a incorporação de quadros com Nível Superior.
Ao mesmo tempo, ele reforça que muitos desses funcionários já atuam há anos nas funções, possuindo mais conhecimento prático que alguns diplomados.
“[O comissionado] vai ter de comprovar experiência. Muitos estão na área há muitos anos, são funcionários públicos, sem Nível Superior, mas com capacidade comprovada”, afirmou, antevendo a exigência para todos os cargos –embora o texto do projeto restrinja esse afrouxamento para o segundo escalão.
O fato é que mesmo entre secretários municipais há aqueles sem Nível Superior, mas, conforme Fábio, há anos responderam por chefias de postos de Saúde ou gerências de Obras. “O município sempre tocou desta maneira. Acreditamos que para ter as pessoas desenvolvendo os seus setores não necessariamente precisam ter Nível Superior para o cargo”.
Exonerações de 17 incluíram diretores, gestores e secretários
As nomeações na Prefeitura de Juti são, desde 2019, motivo de trabalho para o MPMS. Naquele ano, a 1ª Promotoria de Justiça de Caarapó recomendou à então prefeita Elizângela Biasotti dos Santos (a Laka) que desse fim à “farra dos comissionados”: descobriu-se que muitos servidores de livre nomeação não ocupavam funções de confiança, mas sim áreas técnicas, que exigem concurso público.
Com isso, foi aprovada a lei complementar 35/2020, que destinou 44 cargos de confiança para servidores efetivos com capacidade técnica –a livre nomeação ficou restrita ao Procurador Jurídico, Controlador-Geral, Chefe de Gabinete e secretários Municipais de Administração e Planejamento, de Assistência Social, de Educação, Cultura e Esportes, de Finanças, de Infraestrutura e de Saúde Pública.
Contudo, assim que tomou posse, Gilmar alegou que a medida inviabilizava a administração. Com isso, restringiu a apenas 7 (15% do total) os cargos em comissão reservados a servidores. Os demais 37 voltavam a ser de livre nomeação. Isso motivou nova investigação do MPMS, que apurou as mudanças e anotou a exigência de Nível Superior para os cargos.
Foi expedida outra recomendação à Prefeitura de Juti para exonerar comissionados que não tivessem o diploma de Terceiro Grau. O Diário Oficial da Assomasul (Associação dos Municípios de Mato Grosso do Sul) de segunda-feira (31) trouxe a exoneração de 17 servidores. E, agora, foi apresentado o projeto.
A lista de dispensa incluiu os diretores de Controle Patrimonial, de Comunicação Social, de Aquisições Governamentais, do Transporte Escolar, de Informática, dos Departamentos de Esportes, de Vigilância em Saúde e de Programas e Projetos Culturais, além de superintendentes de Ação Comunitária, Agricultura e Pecuária, Obras e Administração.
Até os secretários municipais de Saúde Pública e de Infraestrutura foram exonerados, como consta na portaria 252/2021, assinada por Gilson da Cruz.
Dificuldade para encontrar quadros com Nível Superior em cidades pequenas
“O Ministério Público mandou recomendação para que fizéssemos as exonerações e apresentássemos ao MP. Foi feito um estudo da Auditoria Interna que indicou quem não tinha os requisitos da lei”, afirmou Fábio Ebbing. “Cumprimos a recomendação do MPMS e fizemos o projeto para o alterar a lei e que os gestores possam continuar trabalhando”.
O secretário de Administração apontou barreiras para preencher os cargos da administração. “Às vezes, em um município maior, as pessoas têm qualificação técnica e nível de instrução maiores que no interior. Fica mais fácil para o gestor da cidade maior ter pessoas com essa qualificação. E, se não tem no município pequeno, poderia trazer de fora, mas aí somos questionados por dar chance a quem é de fora. Tem essa questão cultural”.
Paralelamente a isso, o secretário complementa dizendo, ainda, que “não é qualquer pessoa que aceita esse desafio”, tanto por conta do momento político como pelos rendimentos de um secretário em pequenas prefeituras, que não é atrativo.
A sessão da Câmara de Juti será virtual, por videoconferência, com início previsto para as 16h30. A página do Legislativo no Facebook não informou se haverá transmissão.
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