Juiz aceita nova denúncia por suspeita de R$ 90 milhões de propina em MS

Decisão partiu da 1ª Vara Criminal de Campo Grande, para onde acusação da Lama Asfáltica foi direcionada pelo TJMS.

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Policiais na rua durante deflagração de fase da Operação Lama Asfáltica | Foto: Arquivo Midiamax
Policiais na rua durante deflagração de fase da Operação Lama Asfáltica | Foto: Arquivo Midiamax

O ex-governador André Puccinelli (MDB) voltou a responder como réu a denúncia da Operação Lama Asfáltica, conforme despacho do juiz de Direito da 1ª Vara Criminal de Campo Grande. Despacho nesse sentido, comunicando sobre a aceitação de ação do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) relativa à segunda fase da operação pelo juiz Roberto Ferreira Fialho foi publicada nesta terça-feira (25) no Diário de Justiça do Estado.

Puccinelli responde à ação ao lado de outros réus, como o advogado João Paulo Calves –apontado como sócio do Instituto Ícone, do advogado André Puccinelli Júnior, também denunciado na Lama Asfáltica. O ex-governador é acusado de ter recebido cerca de R$ 90 milhões em propinas, bancadas por meio de notas frias de empresas emitidas para a JBS.

A ação volta à 1ª instância do Judiciário de Mato Grosso do Sul após manifestação do desembargador Jairo Roberto de Quadros, do TJMS (Tribunal de Justiça do Estado), que apontou competência da 1ª Vara Criminal em analisar ações da Lama Asfáltica, antes na esfera federal.

Entre os personagens da ação, estão nomes como os empresários Joesley e Wesley Batista, sócios da J&F (controladora da JBS), cuja delação premiada apontou pagamento de propinas ao ex-governador tendo como intermediários o pecuarista Ivanildo Miranda e o ex-secretário-adjunto de Fazenda, André Cance.

Pela delação dos Batista, Ivanildo seria o intermediário no recebimento de propina, missão passada depois a Cance. Conforme a acusação, algumas empresas emitiam notas frias para justificar pagamentos que, na verdade, seriam propinas do frigorífico –que havia se beneficiado de incentivos fiscais concedidos pelo Estado– para o ex-governador.

A lista de empresas implicadas pelos delatores inclui a Proteco (que tem como sócios Elza Cristina e João Amorim), Gráfica Jafar e Gráfica e Editora Alvorada (ambas de Micherd Jafar) e Instituto Ícone de Ensino (em nome de Jodascil Gonçalves Lopes e João Paulo Calves, apontados como “testas de ferro” de Puccinelli Júnior, segundo a denúncia citada pelo juiz que trata a empresa como uma “poupança de propinas” do ex-governador), “entre outras não denunciadas nestes autos”.

Ainda em seu termo de colaboração, Wesley Baptista incluiu o atual governador, Reinaldo Azambuja, entre o beneficiário de propinas, também via negociações de Ivanildo –que em delação chegou a confirmar sua atuação como intermediário de Puccinelli com a JBS no recebimento de propinas– e Cance.

Propina seria composta por R$ 30 milhões em dinheiro vivo e R$ 60 milhões via terceiros, acusa MP

Apenas na gestão de Puccinelli, as propinas teriam totalizado R$ 90 milhões, sendo R$ 30 milhões em dinheiro vivo e R$ 60 milhões por meio de terceiros indicados por Ivanildo. Valdir Aparecido Boni, diretor de tributos da JBS quando a Lama Asfáltica estourou, revelou que em todos os Tares (Termos de Acordo de Regime Especial, que garante os incentivos) celebrados entre a empresa e o Governo do Estado de 2007 a 2016, foram pagos cerca de R$ 150 milhões.

A denúncia ainda cita outras empresas investigadas ao longo da Lama Asfáltica, que atuavam em diferentes contratos com a administração estadual –como a PSG Tecnologia, de João Baird, que teria emitido nota de R$ 710 mil para a JBS, como citado pela sócia Neiva Marcon. Antônio Celso Cortez, citado como acusado, também falou do trânsito de documentos a Baird e confirmou o valor.

João Maurício Cance, da Congeo, foi outro a relatar emitir nota fiscal de aluguel de equipamentos para a JBS, no valor de R$ 2,1 milhões, a pedido do seu irmão, André Cance, que também solicitou o repasse do dinheiro a ele –que teria sido repassado a Puccinelli. O ex-secretário também teve celular apreendido cuja perícia indicou conversas com a ex-mulher que indicam pagamentos de propina ou de lavagem de dinheiro.

O despacho que rememora parte das acusações da Lama Asfáltica ainda aponta inconsistências em quatro processos administrativos que sugerem direcionamento de aquisições da Gráfica e Editora Alvorada –recentemente citada em decisão do Tribunal de Contas do Estado acerca da produção de livros que acabaram estocados nos armazéns da Secretaria de Estado de Educação. Quanto a Proteco, é citado laudo pericial que sugere serviços executados a menor que o pactuado e com qualidade inferior ao mínimo necessário para produção de rodovias.

O processo conta, ainda, com planilha anexada pelo Ministério Público que mencionam, “ao menos em tese”, valores supostamente repassados como propina a Puccinelli por seus colaboradores, vinculados a benefícios fiscais concedidos à JBS e comprovantes de pagamentos.

Réus têm 20 dias para apresentarem respostas às acusações

O despacho que aceitou a denúncia dá prazo de 20 dias para que os denunciados apresentem respostas à acusação, sob possibilidade de a Defensoria Pública ser acionada para responder aos autos. Os advogados e o MPMS devem se manifestar em 5 dias sobre o sigilo do processo –indicando que partes devem ser ocultas. DVDs com materiais da Lama Asfáltica deverão continuar em cartório para consulta às partes.

O juiz responsável se recusou a analisar pedido do Ministério Público para sequestro de bens dos denunciados, uma vez que a medida já havia sido analisada anteriormente –quando o caso corria na esfera federal. A defesa de Puccinelli, porém, manifestou-se que o bloqueio existiria em ação de 2016, derrubado no mesmo ano e novamente validado em 2017 –por isso, foi orientada a refazer pedido para tentar levantar o sequestro de bens.

A Lama Asfáltica foi uma das maiores ações do MPMS a apontar indícios de corrupção na administração estadual, sobretudo no Governo Puccinelli. Obras rodoviárias, contratos de locação de bens e serviços e a conclusão do Aquário do Pantanal –até hoje inacabado– teriam sido atingidos pelo esquema que também teve entre seus investigados nomes como o ex-secretário de Obras de Puccinelli, Edson Giroto.

A investigação teve início em força-tarefa dos Ministérios Públicos Estadual e Federal e da Polícia Federal, e tramitou na seara federal até que decisões do Judiciário entenderam que o julgamento dos feitos caberia ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul –onde a ação atual começou a tramitar.

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