Marcelo Martins reafirma críticas contra o Judiciário, mas não cita nomes de magistrados que teriam vínculo com o chefe do jogo do bicho

O ex-presidente da OAB/MS, Marcelo Barbosa Martins, voltou a reafirmar as supostas ligações de membros do TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) com o dono do jogo do bicho, Jamil Name.

Contudo, o advogado não citou nomes de desembargadores que teriam vínculo com o contraventor, como desejava a Amamsul (Associação dos Magistrados de MS). Em resposta à entidade, que exigiu explicações, o jurista disse que vai mandar para o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) “os processos em que existem provas ou mesmo indícios de corrupção, nos momentos oportunos”.

A declaração de Barbosa Martins foi entregue por meio de ofício encaminhado nesta segunda-feira (8)) à Amamsul. Duas semanas atrás, o ex-presidente da OAB fez um pronunciamento em que citou a suposta ligação de desembargadores com o bicheiro e também com o presidente da Assembléia Legislativa, Jerson Domingos, do PMDB, cunhado de Jamil Name.

Fórum MS pela Ética

A declaração dele surgiu no prédio da OAB, durante reunião dos integrantes do Fórum MS pela Ética.

No dia 4 deste mês, na semana passada, a Amamsul mandou um ofício ao advogado pedindo a ele os nomes de dos desembargadores ligados ao contraventor.

“Reafirmo o conteúdo daquele pronunciamento. Penso que o desejo dos advogados de nosso Estado é que os indícios de práticas corruptas por desembargadores do TJMS sejam apuradas, ao contrário do que vem acontecendo, quando infelizmente a impunidade vem sendo a tônica”, diz trecho da resposta de Barbosa Martins.

Em trecho do ofício, o ex-presidente da OAB retoma o ataque: “é notória a amizade de vários desembargadores com o banqueiro do jogo do bicho nesta capital. Eles são vistos na residência do sr. Jamil Name em ocasiões festivas e em eventos públicos como leilões de gado fino, quando os magistrados sentam-se na mesa do banqueiro e juntos tomam de sua bebida”.

Barbosa Martins lança, ainda, outra suspeita sobre o Poder Judiciário, de gravidade igual à da suposta ligação com o bicheiro: “o tráfico de influência existente no TJMS é também fácil de ser percebido: vários advogados, filhos de desembargadores, rapidamente auferem sucesso profissional, ao contrário dos comuns dos mortais”.

O ex-presidente da OAB/MS sustenta parte de suas acusações nas declarações do deputado estadual Ary Rigo, do PSDB, exibidas no youtube, rede de compartilhamento de vídeos, durante o período de campanha.

Rigo, sem saber que era gravado, disse que parte do dinheiro da Assembleia Legislativa era rateada entre o governador reeleito André Puccinelli, do PMDB, desembargadores e Ministério Público Estado.

Veja o argumento de Barbosa Martins, acerca da fala de Rygo: “não disse na oportunidade [no pronunciamento] qualquer fato novo. Há algum tempo, comenta-se a existência de um “mensalão” entre número expressivo de desembargadores, cujo valor teria origem no Executivo, de onde é repassado ao Legislativo e daí chega aos desembargadores. Tal fluxo foi confirmado pelo deputado Rigo, que agora tenta fazer-nos crer que o repasse afirmado nos vídeos seria devolução de valores não utilizados. Pensa o deputado que nós cidadãos somos ingênuos”.

Barbosa Martins segue dizendo no ofício que “não cabe” a ele passar à Amamsul “os nomes dos desembargadores criticados. Mesmo porque em função do silêncio dos bons, paira dúvidas sobre a probidade de vários membros dessa Corte”.

Logo adiante, ele afirma que vai encaminhar ao CNJ processo com “provas ou indícios” de corrupção supostamente implicando os desembargadores.

O comando do TJ informou que não ia se manifestar porque o caso é tratado pela Amamsul, associação dos magistrados..

Eis a resposta completa de Marcelo Barbosa Martins, encaminhada hoje a Amamsul

“Campo Grande, 08 de novembro de 2010

Prezado senhor presidente da Amansul,

Tendo recebido em 04 de novembro último ofício dessa presidência, pedindo que nomine os desembargadores a que me referi em pronunciamento feito na OAB/MS, dia 22 de outubro último, tenho a lhe informar o seguinte:

Como membro nato da OAB/MS, de onde tive o prazer de ser o presidente no período de julho 1987 a janeiro de 1989, na oportunidade falava ao plenário do conselho daquela entidade.

Tentei interpretar o pensamento de grande parte dos advogados de Mato Grosso do Sul, no que se refere às denúncias de corrupção veiculadas pela imprensa, a partir das gravações feitas ardilosamente com o deputado Ary Rigo.

Reafirmo o conteúdo daquele pronunciamento. Penso que o desejo dos advogados de nosso Estado é que os indícios de práticas corruptas por desembargadores do TJMS sejam apuradas, ao contrário do que vem acontecendo, quando infelizmente a impunidade vem sendo a tônica.

Não disse na oportunidade qualquer fato novo. Há algum tempo, comenta-se a existência de um “mensalão” entre número expressivo de desembargadores, cujo valor teria origem no Executivo, de onde é repassado ao Legislativo e daí chega aos desembargadores. Tal fluxo foi confirmado pelo deputado Rigo, que agora tenta fazer-nos crer que o repasse afirmado nos vídeos seria devolução de valores não utilizados. Pensa o deputado que nós cidadãos somos ingênuos.

Deixei claro que existem desembargadores corretos, mas diante do silêncio geral, todos acabam juntos, em uma vala comum, confundidos aos maus julgadores. Desejo esclarecer, nunca ouvi sobre corrupção nos juízos de 1º grau, onde os magistrados julgam de acordo com suas convicções. Destes, reclama-se de alguns magistrados que desrespeitam as prerrogativas de advogados, sejam estes jovens ou mais experientes.

É notória a amizade de vários desembargadores com o banqueiro do jogo do bicho nesta capital. Eles são vistos na residência do Sr Jamil Name em ocasiões festivas e em eventos públicos como leilões de gado fino, quando os magistrados sentam-se na mesa do banqueiro e juntos tomam de sua bebida.

O tráfico de influência existente no TJMS é também fácil de ser percebido: vários advogados, filhos de desembargadores, rapidamente auferem sucesso profissional, ao contrário dos comuns dos mortais.

Os advogados vêm com preocupação a subserviência do Judiciário ao Executivo. Em nome de falsa supremacia do interesse público sobre o privado, a administração pública pratica injustiças, muitas vezes não corrigidas pelo Judiciário.

Por outro lado, penso que a propalada independência dos poderes somente existirá quando houver autonomia financeira do Judiciário e Legislativo. Quem não conhece a dificuldade dos representantes do Judiciário, quando discutem com o Executivo os valores e rubricas de seu orçamento? Nestas oportunidades, o Judiciário costuma ser tratado como Poder menor, dependente daquele que define sua capacidade financeira. Chega-se ao cúmulo de o Executivo desejar eleger as prioridades do outro Poder.

O que nós advogados denunciamos foi repetido com todas as letras pela Ministra do STJ, Eliana Calmon, em entrevista publicada pela VEJA de 29 de setembro último. Dentre outras irregularidades, ela afirmou a carreira dos juízes é geralmente marcada pelo envolvimento com autoridades do Legislativo e Executivo. Tal se dá em busca de progressão funcional, gerando inevitáveis trocas de favores.

No dia 20 de outubro passado, a Comissão Executiva do Fórum MS Pela Ética, em contato com a dra. Eliana Calmon, atual Corregedora do CNJ, teve a oportunidade de relatar nossa preocupação com esse estado de coisas.

Penso que não cabe a mim ou a outra pessoa, individualmente, passar à Amansul os nomes dos desembargadores criticados. Mesmo porque em função do silêncio dos bons, paira dúvidas sobre a probidade de vários membros dessa Corte. Entretanto, saberemos enviar ao CNJ os processos em que existem provas ou mesmo indícios de corrupção, nos momentos oportunos.

Lembro também que todos os operadores do direito são igualmente atingidos pelas denúncias. Se há corruptos, há corruptores. A única forma de se separar o joio do trigo é fazer-se uma investigação profunda, que deverá contar com a participação dos órgãos do Judiciário e com o auxílio das entidades que representam nossas categorias profissionais.

Finalizo, lembrando-me que há cerca de três anos estive no gabinete do juízo de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, à época dirigido pelo senhor, para lhe cumprimentar por decisão que havia tomado em processo que lá tramitava, em que mostrara sua coragem e independência. Aproveito para em seu nome, cumprimentar os juízes e desembargadores justos de nosso Estado, que julgam de acordo com o direito e suas convicções, sem levar em conta interesses desse ou daquele poderoso. A todos, o meu respeito.

Àqueles que desonram a toga, espero sejam processados, garantindo-lhes o direito de defesa. Se considerados culpados, desejo deixem seus lugares àqueles comprometidos com a justiça e o desenvolvimento de nosso povo.

Da mesma forma que o ofício a mim enviado foi divulgado pela mídia local, tomarei a liberdade de encaminhar essa resposta à assessoria de imprensa da OAB local.

Atenciosamente,

Marcelo Barbosa Martins, advogado”

Saiba mais sobre esse caso em notícias relacionadas, logo abaixo