O relatório final da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) contra a prefeita de , Vanda Camilo (PP), apresentado durante a sessão da Câmara Municipal desta terça-feira (17) pede abertura de Comissão Processante por irregularidades e indícios de improbidade administrativa.

“As evidências de direcionamento de licitações, inexecução contratual, possível peculato e outras condutas irregulares que emergiram ao longo da investigação não podem ser ignoradas. Tais condutas representam uma violação grave dos princípios da administração pública e podem causar prejuízos significativos ao erário e à coletividade”, diz parte do documento.

A narrativa apresentada também solicita que o Ministério Público Estadual seja informado das conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito e, “se necessário, seja convidado a atuar no processo de apuração”, destaca.

O grupo de investigação foi criado para apurar a execução inadequada de obras públicas, os indícios de desvio de recursos públicos, crime licitatório das empresas contratadas pelo município, diante de indícios de subcontratação, e infrações às regras dos certames.

Segundo o presidente da comissão, vereador Junior (PSDB), o relatório foi finalizado no dia 13 deste mês. A abertura da Comissão Processante foi anunciada na sessão desta terça-feira e será votada na próxima sessão, dia 24 de outubro.

A CPI foi conduzida pelos respectivos vereadores; Presidente – Enelvo Felini Junior (PSDB), Relator – Cleyton Martins (PSB), Secretário – Ademir Gabardo (PSDB), além dos membros Adavilton Brandão (MDB) e Izaqueu Diniz (Patriota).

A abertura de Comissão Processante permitirá que a investigação reúna mais elementos probatórios, que podem resultar na cassação da chefe do Executivo municipal.

Vanda Camilo por sua vez, disse que foi informada hoje do relatório e aguarda o recebimento do documento para avaliação jurídica dos fatos apresentados. “O pedido de formação de uma comissão processante é um assunto que a Câmara irá julgar. Confio que será uma avaliação coerente, feita com maturidade e responsabilidade, visando o crescimento e desenvolvimento da cidade”, disse.

“Impedir o progresso do município com artifícios que possam gerar instabilidade política não é o caminho. O momento das disputas eleitorais chegará; agora é a hora de trabalhar. E é assim que eu vou continuar, aberta ao diálogo e à união, sempre visando ao bem comum de todos os sidrolandenses”, completou a nota encaminhada ao Midiamax.

Operação Tromper

No último dia 21 de julho, foi realizada a segunda fase da Operação Tromper, em Sidrolândia. Dois empresários e um servidor público foram presos preventivamente.

Os presos são Ueverton, Roberto da Conceição Valençuela e o servidor municipal Basso da Silva, depois exonerado do cargo.

Além de Tiago, outros três servidores também teriam ligação com o esquema. Na primeira fase da operação, o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) já havia feito pedido de prisão preventiva dos acusados, mas só teve deferidos os pedidos de busca e apreensão.

O prédio da Prefeitura de Sidrolândia também foi alvo desta segunda fase da operação. O vereador Otacir Figueiredo (PP), presidente da Câmara, relatou que já pediu há mais de 30 dias informações sobre os contratos investigados, mas não teve retorno da prefeitura.

Depois disso, foi feita uma sessão extraordinária e aberta CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para apurar os contratos fraudulentos.

Esquema de fraudes

O esquema de corrupção sobre licitações da Prefeitura de Sidrolândia envolve empresários da cidade, que fraudavam documentos das empresas concorrentes, para garantir que seriam as contratadas. Mesmo assim, sem estrutura, essas empresas terceirizavam os serviços pelos quais receberam milhões de reais do dinheiro público.

Conforme a peça em que foram embasados os pedidos de prisão e de busca e apreensão, da primeira fase da Operação Tromper, o esquema de corrupção teria iniciado em 2017.

Desta forma, os empresários aproveitavam dos CNPJs para participar das licitações, mesmo sem qualquer tipo de experiência, estrutura ou capacidade para executarem os serviços ou fornecimento nos contratos firmados.

Empresas se uniam para vencer licitações

Ainda conforme o documento, na fase de investigação foi feito pedido de afastamento do sigilo telemático e dados de nuvem dos investigados. A partir daí, foram identificadas as irregularidades em algumas licitações.

Como exemplo, em um pregão presencial para contratação de empresa para fornecimento de materiais de construção, elétrico e hidráulico, foram encontrados erros de grafia semelhantes nos documentos apresentados por empresas diferentes. São palavras como “torneria e benheiro”.

Para a acusação, isso indica a montagem do procedimento. Também foi identificada ausência da assinatura na ata da sessão pelas empresas não ganhadoras. Nesta licitação, a empresa Rocamora participou, mesmo tendo sido aberta um mês antes.

Em outro caso, em uma carta convite para contratação para poda de árvores no município, foi identificada a participação de uma empresa de lava jato, que sequer poderia prestar tais serviços por falta de estrutura.

Ainda na cotação de preços, aparece uma empresa com atuação no ramo de dedetização. O que o identificou é que essa empresa foi consultada por um dos investigados para fazer serviço de dedetização no cemitério.

A partir da proposta de valor, o documento teria sido fraudado e usado na cotação de preços da licitação com a prefeitura, pelo grupo criminoso. A responsável pela empresa confirmou que não tinha participação nesse certame.

Também em caso de pregão presencial, foi aberta licitação para contratar empresa para limpeza de fossas. Uma das empresas também teve documento fraudado, conforme identificado posteriormente.

Para o MPMS, as empresas montaram um grupo criminoso para garantir que ganhariam, mediante prévio acordo, as licitações em Sidrolândia. Assim, desviavam dinheiro público.

Participação de servidores

Mais ainda do que as fraudes, as empresas contavam com a participação de ao menos quatro servidores públicos, identificados nas investigações. Assim, ajustavam previamente os interesses para conseguir um bom contrato com o município.

Documentos demonstram vínculo entre os investigados, pelo compartilhamento de informações entre eles, que deveriam ser confidenciais. São eles proposta de preço, documentos pessoais, carimbos das empresas e elementos que indicam a existência de ‘conspirações' e acordos ilegais entre os envolvidos.

Os quatro servidores em questão são acusados de corrupção passiva. Um era na época chefe do setor de execuções e fiscalização da prefeitura, em 2020. Ele teria recebido R$ 2.000 da empresa Rocamora, em Pix.

Já o outro servidor, que teve contra ele pedido de prisão preventiva feito, recebeu cerca de R$ 7,5 mil da mesma empresa. Ele atuava como fiscal de contrato e ainda responsável por atestar notas fiscais.

Ficou esclarecido, inclusive, que em um contrato com empresa investigada para fornecimento de sacos de lixo, ele chegou a assinar as notas fiscais mesmo sem que 30 mil produtos tivessem sido entregues.

Outro servidor ainda recebeu R$ 4,6 mil de empresário, também em 2020. Ele era integrante da comissão de licitação naquele ano. Por fim, um quarto servidor, que atuava no setor de compras, é investigado por fazer as pesquisas de preços com as empresas investigadas.

Isso, porque ele fazia os levantamentos já sabendo que essas empresas nem tinham capacidade técnica para serem contratadas. Conforme a Prefeitura de Sidrolândia, os servidores foram afastados após a operação.

Prefeitura de Sidrolândia pagou R$ 2,3 milhões para empresa

O Jornal Midiamax noticiou que em um intervalo de apenas quatro dias, incluindo o próprio dia da ação do Gaeco a empresa garantiu ao menos R$ 900 mil em três atas de registro de preços que foram publicadas pela prefeitura.

Isso significa que a empresa venceu a concorrência e ficou habilitada para fornecimento de materiais que podem chegar ao montante de quase R$ 1 milhão. Além de garantir a bolada, a Rocamora já recebeu mais de R$ 2,3 milhões em valores repassados pela prefeitura desde o dia 1º de janeiro de 2023.

Os valores constam nas despesas da prefeitura lançadas no Portal da Transparência do município. A reportagem apurou que do início do ano até agora, foram pagas centenas de ordens de serviço contempladas a partir de oito contratos firmados com a empresa.

Em apenas um dos contratos, a Rocamora já recebeu R$ 1,5 milhão para fornecimento de materiais e serviços como instalação elétrica, material de copa e produtos de higiene.

O que chama atenção na relação da prefeitura com a investigada pelo Gaeco é que o ramo de atuação da empresa é bastante diverso. A Rocamora fornece desde alimentos para merenda escolar, presta serviços de chaveiro, faz manutenção em ar-condicionado e até fornece vidros para a prefeitura de Sidrolândia.

Essa variedade no ramo de atuação da empresa foi um dos motivos que levaram os agentes do Gaeco a investigar a fundo as contratações da empresa.

Vale ressaltar que, segundo apurou a reportagem, todos os itens contratados nesses editais de registro de preço foram fornecidos pela empresa. O TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado) também monitora as contratações.