Em relatório com 293 páginas enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal), a PF () detalha o caminho que percorreu na apuração do suposto atentado sofrido pelo deputado federal (PSL) em16 de fevereiro de 2020. Os investigadores concluem que o parlamentar sequer foi perseguido ou monitorado antes de chegar na BR-060 – onde supostamente uma caminhonete L200 azul teria feito os disparos contra o parlamentar e seu assessor, Ciro Fidelis – e que tal vigilância seria ‘imprescindível' se de fato houvesse ocorrido ataque.

A apuração da PF percorreu parte do trajeto de deslocamento de Trutis e de seu assessor antes do então possível atentado. Para tanto, foram verificadas câmeras de vigilâncias no caminho por onde o Corolla preto, carro em que estava o deputado e seu assessor, em locais por onde passaram. Até o desembarque do deputado no Aeroporto Internacional de , três dias antes, foi rastreado. Na ocasião, não foi identificada nenhuma pessoa que pudesse estar seguindo ele.

Segundo o relatório, os dois passaram pela Rua Paraisópolis até a Avenida Guaicurus, depois nas ruas Pontalina, Francisco Aguiar Pimenta e na rua onde Ciro mora. Eles contornaram o quarteirão e foram em direção à , parando em um posto de combustível. No caminho, foram verificadas câmeras de alguns estabelecimentos, como oficina mecânica, farmácia e o local de abastecimento onde pararam. “Não foi observado nenhum outro veículo acompanhando/seguindo tal carro”, já traz um dos trechos da apuração.

Apesar das imagens de outra empresa verificada, ainda na Gury Marques, ‘não apresentarem boa qualidade', novamente não foram identificados veículos que estariam seguindo o Corolla preto. Ainda ao longo da investigação, os policiais identificaram e tomaram depoimento de motoristas que cruzaram com as supostas vítimas na madrugada em 16 de fevereiro. Todos disseram não se recordarem de situações atípicas naquele dia, tampouco foi identificada relação deles com o suposto atentado.

A conclusão no relatório da Polícia Federal, encaminhada ao MPF (Ministério Público Federal), aponta que não houve qualquer identificação de acompanhamento do veículo de Trutis em momentos anteriores ao atentado falso. E afirma: “portanto, para que o atentado ocorresse, é imprescindível que o parlamentar estivesse sendo monitorado e acompanhado, sofrendo vigilância. Analisadas todas as câmeras de vigilância presentes no trajeto realizado pelas supostas vítimas, ‘não ‘ foram identificados veículos em acompanhamento”

Não sairia ileso

Ainda de acordo com o documento, na manhã de 16 de fevereiro, o parlamentar trocou de lugar dentro do carro por duas vezes. Primeiro, estava sentado no banco do motorista, foi para o banco do passageiro, ao lado, no posto de combustível. Depois de parar em uma farmácia, se sentou no meio do banco de trás. Quanto à trajetória dos disparos dentro do veículo, o laudo também “concluiu que apenas em uma situação muito específica, com o primeiro disparo atingindo o porta-malas, o ocupante do banco traseiro sairia ileso da ação”.

Também não foram identificados veículos com as características indicadas pelo deputado e seu assessor como responsável pelos disparos. Aliás, o único carro encontrado que bateria com as informações é ‘bastante antigo e encontra-se deteriorado, sem condições mecânicas razoáveis para ser utilizado em um atentado'.

‘Narrativas fantasiosas'

A investigação afirma que, em todo momento, as supostas vítimas trouxeram ‘narrativas fantasiosas e adotaram os mais diversos meios para atrapalhar as investigações e inovar nos fatos'. O conteúdo levantado ao longo da investigação traz ‘provas suficientes da materialidade dos crimes de comunicação falsa de crime, porte ilegal de arma de fogo e dano', cita a apuração em determinado trecho.

Em decisão da ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), é citado que forçar situação para ser capitalizada politicamente em defesa do porte de arma foi a motivação para o ataque simulado. No dia 11 de novembro, Trutis foi alvo da Operação Tracker, deflagrada no bojo da investigação citada no texto, e chegou a ser preso por porte de arma de uso restrito, mas foi liberado no mesmo dia.

A reportagem tentou contato com Trutis e Ciro, mas nenhum dos dois respondeu até o fechamento e publicação deste texto. Um dia após a operação, o deputado postou vídeo tomando suco de laranja, ironizando a situação. Disse que a imprensa mentiu e que não foi preso, mas não mencionou qualquer palavra sobre a investigação da PF.