Ricardo Barros concedeu entrevista à BBC Brasil

O ministro da Saúde, Ricardo Barros, declarou – em entrevista à BBC Brasil -, “que pesquisadores que defendem um sistema universal de saúde não são técnicos, nem especialistas, são ideólogos que tratam o assunto como se não existisse o limite orçamentário, como se fosse só o sonho”.

A afirmação do ministro ocorreu depois que ele foi questionado sobre a opinião do professor da UFBA Jairnilson Paim (autor do livro “O que é o SUS”), “para quem um sistema que atende menos pessoas tende a ser pior”. Para Ricardo Barros, o governo tem saldo negativo nas contas e a crise “se deve a decisões do governo anterior”.

“Falar que tem que pôr mais gente demandando, sendo que o recurso é limitado, é uma incoerência. (…) O SUS é tudo para todos, ou tudo que está disponível no SUS para todos?”, questionou também. O , ainda assim, elabora um projeto de “planos de saúde acessíveis”, com cobertura de atendimento reduzida para o público de menor renda. O objetivo, segundo declara o governo, é que as pessoas utilizem o sistema privado e “desafoguem” o SUS (Sistema Único de Saúde).

Doações de campanha e PEC 55

O maior doador individual da campanha de Ricardo Barros (PP) para deputado federal pelo Paraná em 2014 foi o sócio do Grupo Aliança, administradora de benefícios de saúde. Elon Gomes de Almeidadisponibilizou' R$ 100 mil para a campanha de Barros. A Aliança mantém registro na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), vinculada ao Ministério da Saúde.

 

 

O grupo de trabalho do ministro para ‘reformular o SUS' também inclui outros representantes da indústria de planos de saúde. “Associações médicas também têm se oposto à ideia. Para os críticos, a medida vai contra a tendência dos últimos anos, de ampliar as exigências mínimas de tratamentos oferecidos pelos planos, com objetivo de melhorar o serviço”, afirma.

Com relação a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 55 – que deve ser votada ainda este ano no Senado – o ministro bateu novamente na tecla de que os especialistas, que avaliam o impacto na redução de verbas, ‘não sabem muito bem o que falam'.

Caso a Proposta seja aprovada, a partir de 2017 o Governo federal fica limitado a gastar o mesmo valor do ano anterior, apenas corrigindo a inflação do período. Para a Educação e a Saúde, a regra só começaria a valer em 2018. Na Educação, o governo teria que empenhar por mais um ano 18% da receita de impostos – conforme prevê a Constituição -, antes de congelar os gastos.

No caso da Saúde, em 2017, a norma que vale é a que passou a vigorar em maio de 2015 com a Emenda Constitucional do Orçamento Impositivo, que afirmava que, gradativamente, o Governo deveria aumentar o percentual de sua receita corrente líquida para a área até chegar a 15% em 2020. A União, no entanto, antecipou a aplicação dos 15% para 2017 (ano em que seria 13,7%) e, assim, congelará a verba em patamar maior em 2018.

Na prática, especialistas ouvidos pelo El País Brasil afirmam que, à partir de 2019, a saúde começa a perder verba. Francisco Funcia, consultor da Comissão Intersetorial de Orçamento e Financiamento do Conselho Nacional de Saúde (CNS) afirmou que “qualquer ganho de receita, no futuro, deixará de ser repassado”.

“Isso acontece porque, na atual regra, a verba repassada para a área é vinculada à receita da União e, se o Governo arrecada mais dinheiro com os impostos, o dinheiro para a saúde também aumenta na mesma proporção. A PEC 55 mudará isso”, explica a reportagem.

O conselheiro é autor de um estudo apresentado pelo CNS que mostra que, até 2036, a mudança estabelecida pela PEC poderá fazer com que o SUS ‘perca pouco mais de 430 bilhões de reais, projetando-se um crescimento do Produto Interno Bruto anual de 2% neste período e uma inflação de 4,5%', declara o El País Brasil.

A estimativa também foi levantada por pesquisadores do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). “Para efeitos de comparação, o Orçamento para saúde em 2017 será de 113,7 bilhões de reais. Ou seja, é como se em 20 anos o SUS perdesse quase quatro vezes todo o Orçamento inteiro da Saúde de 2017. Ou como se perdesse oito vezes o Orçamento inteiro do município de São Paulo (50,3 bilhões de reais em 2017)”, compara a reportagem.

À BBC Brasil, o ministro afirmou que “irá escrever um livro”. “Vou escrever um livro: ‘Eu e os especialistas'. Como tem especialista para tudo, né? Pode escrever qualquer tese maluca que não se sustenta. Não dá para trabalhar nesse nível de conversa”, afirmou.

Ele nega que a PEC irá reduzir o dinheiro para a Saúde: “isso não existe”, disse.