Tragédia anunciada: Mais de 2 mil animais morreram em estradas de MS em três anos

Anta, tamanduá-bandeira e capivara são os animais silvestres que mais morreram por colisões veiculares

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animais silvestres
Tamanduá e tatu estão entre animais mais mortos nas rodovias (Foto: Divulgação)

Estudo realizado pelos pesquisadores do ICAS – Instituto de Conservação de Animais Silvestres e publicado na revista científica Austral Ecology, da Wiley (Austrália), analisou os dados de um levantamento realizado entre os anos de 2017 e 2020 em Mato Grosso do Sul (MS).

O resultado foi o registro de 2.159 carcaças de animais silvestres de grande porte, mais especificamente de anta, tamanduá-bandeira e capivara, e que morreram por colisões veiculares. Um número assustador e que coloca em risco a vida de todos.

A coleta destes dados ocorreu em apenas 15% das rodovias pavimentadas no Estado, ou seja, se os números forem ampliados para todas as estradas sul-mato-grossenses e até mesmo para o Brasil, o impacto deste problema será muito maior e alarmante, comprovando a necessidade e a importância da implementação de diversas medidas de mitigação.

Mestre em recursos florestais e primeiro autor do artigo, Yuri Ribeiro, explica que a pesquisa realizou a indicação/previsão dos pontos mais críticos nas estradas e rodovias em todo o território de MS através de modelos espaciais.

Para chegar neste resultado o pesquisador utilizou informações de base ecológica, ou seja, as variáveis que avaliam o uso do solo a distância de rios e a topografia da região, além dos dados de colisões coletados pelo projeto Bandeiras e Rodovias, executado pelo ICAS, no período de 3 anos, cerca de 2.000 quilômetros de rodovias no MS.

“Nós pegamos estes dados e fizemos a predição de risco para o sistema de estradas pavimentadas e não pavimentadas do Estado. Isso possibilitou o mapeamento dos pontos mais críticos e onde as medidas de mitigação serão mais eficientes para proteger a vida das pessoas e dos animais. Este estudo mostra que as colisões veiculares com fauna não é simplesmente uma fatalidade. Ela é sim, uma tragédia anunciada”, explica o pesquisador.

Yuri durante mapeamento de ponto mais críticos para colisões em MS (Foto: Divulgação)

Metodologia da pesquisa

O primeiro passo do estudo foi compreender a distribuição das colisões veiculares com as 3 espécies que representam maior risco a segurança humana e que são amplamente impactadas e atingidas no MS. Posteriormente, foi realizada a identificação das características do ambiente, como, por exemplo, a distribuição de áreas de vegetação nativa, se tem a presença de rios, córregos, relevo mais acidentado, altitude, entre outras informações. Os dados foram analisados em grandes escalas no entorno de estradas, resultando na modelagem da probabilidade de ocorrência destes animais e o risco de colisões com cada uma delas ao longo das rodovias.

De acordo com o fundador do ICAS, Arnaud Desbiez, o monitoramento das rodovias serviram de base para a modelagem deste novo estudo, que classificou uma grande extensão da malha rodoviária de MS como prioritária para mitigação. Com isso, a pesquisa oferece importantes informações com o objetivo de proporcionar uma melhor segurança viária para as pessoas e à biodiversidade.

“É preciso que haja o diálogo entre os diferentes setores público, privado, instituições de pesquisas e sociedade civil, para que haja um consenso sobre a priorização, especialmente no que diz respeito a melhoraria no processo de licenciamento ambiental, que deve, obrigatoriamente, incluir informações e orientações embasadas cientificamente, sobre onde as medidas de mitigação devem ser implementadas primeiro”, ressaltou o presidente do ICAS.

Vista aérea de um dos pontos críticos identificados pelo estudo em MS (Foto: Mario Alves / Projeto Bandeiras e Rodovias)

Políticas públicas

Além do estudo realizado, os pesquisadores do ICAS têm divulgado os dados para os diferentes setores da sociedade. A equipe participa de eventos e reuniões que envolvem a concessão e a privatização de estradas e rodovias, começando pela BR-163, que atualmente encontra-se em fase de discussão proposta pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

O trecho que está sendo debatido é chamado de “Rota Pantanal”, e tem extensão de 379,6 quilômetros, do entroncamento com a BR-262, em Campo Grande (MS), ao fim da Ponte Rio Correntes, na divisa com Mato Grosso, e que possui um alto índice de colisão veicular com fauna e diversos pontos críticos para a implementação de medidas mitigadoras.

Em 17 de dezembro de 2021, foi lançado o “Manual de Orientações Técnicas para Mitigação de Colisões Veiculares com Fauna Silvestre nas Rodovias Estaduais do Mato Grosso do Sul”, uma publicação do ICAS elaborada em parceria com a Secretaria de Infraestrutura do Estado de Mato Grosso do Sul (SEINFRA), Agência Estadual de Empreendimentos de Mato Grosso do Sul (AGESUL), Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (IMASUL) e Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS).

A publicação deste manual, enquanto ação de política pública, foi um importante avanço para mitigação das colisões veiculares com fauna silvestre. Entretanto, para que os resultados de fato ocorram, as orientações contidas no material devem ser implementadas com urgência.