Há cinco anos, um crime chocou toda a população campo-grandense: a jovem Carla Santana Magalhães, de apenas 25 anos, foi sequestrada no dia 30 de junho de 2020, a menos de 60 metros da própria casa. Durante três dias, familiares, amigos e policiais fizeram buscas pela moça, mas, o que ninguém desconfiava, é que o corpo de Carla estava na casa ao lado.
Para relembrar esse caso, e exibir as investigações policiais até prenderem o autor do crime, o Delegado Carlos Delano cedeu uma entrevista exclusiva à reportagem do Jornal Midiamax e contou detalhes do caso.
Sequestrada em frente à própria casa
Em 2020, o delegado estava à frente da DHPP (Delegacia Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa) e, na época, a delegacia estava sediada no Cepol (Centro Integrado de Polícia Especializado). O primeiro contato de Delano com o caso foi quando a mãe de Carla foi registrar o boletim de ocorrência de desaparecimento.

“Quando essa ocorrência entrou, já comunicaram a nossa equipe de homicídios, disseram que tinha uma situação peculiar. Uma moça, muito perto da entrada da própria casa, deu uns gritos de socorro e sumiu. Deixou alguns pertences perto do portão da entrada e sumiu”, contou o delegado.
A primeira linha de investigação indicava que um carro havia parado e raptado Carla. “A imprensa levantou um vídeo que mostrava um local bem próximo onde o fato aconteceu, não mostrava o infrator em si, mas tinha captação de áudio, e dava para escutar a moça gritando”, esclarece. Ainda nessas imagens, era possível ver um farol de um carro.
Os policiais ficaram empenhados nessa hipótese por dias, buscando câmeras de segurança aos arredores para tentar identificar o modelo e cor do veículo. “Isso levou um trabalho, tomou uma força que, lamentavelmente, não nos levou a avanço algum”, relembrou.
“A cidade estava entrando em uma situação de um temor generalizado, as pessoas já estavam se mobilizando para fazer passeatas”, contou Delano. Enquanto os agentes estavam empenhados na investigação, a população e, principalmente, as mulheres, estavam desesperadas com a falta de resolução do crime.
Além das buscas pelo suposto veículo, os policiais acreditavam que esse era um caso de feminicídio, então passaram a interrogar familiares, amigos e antigos relacionamentos amorosos de Carla. Eles já tinham algumas hipóteses, mas dependiam de uma prova que relacionasse os suspeitos com o crime.
Corpo deixado a poucos metros do lugar do sequestro
“O corpo apareceu a mais ou menos 60 metros da porta da casa dela, na varanda de um bar, desnudo e com um corte muito grave no pescoço”, relembrou o dia em que o corpo de Carla foi localizado. Após a vítima passar por um exame de necropsia, foi constatado que ela também sofreu violência sexual.

“É uma situação muito diferente, porque o autor voltou para deixar o corpo ali, o que indicava um vínculo emocional muito próximo, uma espécie de recado, de vingança. Ou o autor estava ali, nunca saiu dali”, explicou o delegado Delano.
Dias após encontrarem o corpo de Carla, uma equipe do Batalhão de Polícia de Choque abordou o vizinho da vítima. Ele estava sentado em frente ao portão, e acompanhou os policiais enquanto revistavam a sua residência. “Encontraram panos com sangue, ele falou que usava para outras coisas e foi liberado”, contou.
No dia seguinte, os policiais retornaram à casa do até então suspeito. “A impressão que eu tenho é que ele tinha escapado da abordagem anterior e estava muito seguro”, relembrou. Tamanha era sua segurança, que o vizinho não tinha se desfeito dos retalhos encontrados.
Conforme o delegado, não dava para ligar diretamente esses retalhos ao crime porque, pelo modo que Carla foi assassinada, teria saído um fluxo maior de sangue, e seriam necessários mais panos. “Me parece evidente que o grosso do que ele utilizou para limpar já tinha ido embora, e aquilo tinha sido só o resquício”, explicou.
No entanto, durante a conversa, um policial avistou uma gota vermelha na parede, próximo à cama e, ao levantar a base do móvel, havia uma grande quantidade de pingos de sangue. “Ele pediu para ter uma conversa em particular, e quando o pessoal saiu, ele disse: ‘fui eu’”, relatou.
3 oitivas
Ao decorrer das três oitivas as quais Marcos André Vilalba foi submetido, ele descreveu o que teria motivado e como cometeu o crime. “Ele disse que estava sentado na porta da cozinha, tomando pinga, a moça passou, ele pegou ela pelo pescoço e quando começou a gritar levou para dentro”, detalhou o delegado.
Segundo Delano, após Carla perder a consciência e desmaiar, Marcos praticou o primeiro abuso sexual, depois o autor cortou a vítima com uma faca no pescoço e, por último, teria abusado novamente da mulher. “Ele colocou o corpo debaixo da cama e foi cuidar da vida, dormiu, trabalhou e, só no terceiro dia, quando começou a cheirar mal, ele colocou o corpo nos ombros e jogou no bar”, esclareceu.
Essa descrição de Marcos mudou a imputação do crime, além de vilipêndio — ato de abusar do corpo de uma pessoa morta —, ele estuprou a vítima. “Ele disse que praticou o abuso com ela inconsciente, que é o estupro, matou e depois violou de novo. Então, são três crimes”, esclareceu.
“Interrogatório não é sessão de terapia”
Durante os interrogatórios a que Marcos foi submetido, ele não apresentou arrependimento ou culpa pelo que havia cometido. O delegado Delano disse que não esperava que isso acontecesse, que os autores de crimes graves não se desarmam para demonstrar o seu sentimento.

“Então, no fundo mesmo, a gente espera uma certa humanidade, ou algo que arrefeça o nosso sentimento de injustiça, mas o que o camarada está fazendo é tentando resolver a situação dele. […] Então, eu não espero isso mesmo porque eu nunca vi isso acontecer”, contou Delano.
Condenação de Marcos
Marcos André Vilalba, 22 anos, foi condenado a 31 anos e 9 meses de prisão pelo feminicídio qualificado de Carla Santana Magalhães, de 25 anos. O julgamento aconteceu em agosto de 2021 e a defesa tentou recurso, que foi negado, conforme publicação do Diário da Justiça do dia 10 de dezembro de 2021.
Em plenário, os jurados decidiram por condenar Marcos por homicídio qualificado pela condição de mulher, ou seja, feminicídio, também qualificado por motivo fútil, meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima. Ele também responde por ocultação de cadáver e, no andamento do processo, foi descoberto ainda o crime de vilipêndio, ter relações com a vítima após a morte.
📍 Onde buscar ajuda em MS
Em Campo Grande, a Casa da Mulher Brasileira está localizada na Rua Brasília, s/n, no Jardim Imá, 24 horas por dia, inclusive aos finais de semana.
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As ligações para o número 180 podem ser feitas por telefone móvel ou fixo, particular ou público. O serviço funciona 24 horas por dia, 7 dias por semana, inclusive durante os finais de semana e feriados, já que a violência contra a mulher é um problema sério no Brasil.
Já no Promuse, o número de telefone para ligações e mensagens via WhatsApp é o (67) 99180-0542.
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⚠️ Quando a Polícia Civil atua com deszelo, má vontade ou comete erros, é possível denunciar diretamente na Corregedoria da Polícia Civil de MS pelo telefone: (67) 3314-1896 ou no GACEP (Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial), do MPMS, pelos telefones (67) 3316-2836, (67) 3316-2837 e (67) 9321-3931.
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