Após a conversão do para preventiva dos nove indígenas presos na retomada Ñhu verá, encravada entre as aldeias Jaguapiru e Bororó, na Reserva Federal de , o clima ficou ainda mais tenso na maior cidade do Interior. Caso eles não sejam liberados, há promessas de fechamento da rodovia.

Inconformadas, as famílias clamam pela libertação dos envolvidos na retomada de uma área que é considerada por eles como tradicional, mas que também é reivindicada por um grupo privado para a construção de um condomínio de luxo. As obras já foram iniciadas, com parte do muro já levantado.
“Quero meu marido de volta. O que fizeram com ele é uma grande injustiça. Nós apenas estamos reivindicando o que é nosso. Tenho dois filhos pequenos que pedem pela presença do pai. Além disso nossa família está sofrendo ameaças de jagunços de outras propriedades que estão rondando nossos barracos. Estamos todos com muito medo”, diz a indígena de 24 anos, esposa de um dos presos.

Segundo a indígena que pediu para não ser identificada, além das crianças, com ela também moram mais quatro irmãs e dois idosos. Um deles de quase 120 anos. “Se acontecer algum ataque não temos para onde correr e nem eles teriam condições físicas para isso. Quem anda armado são eles”, comenta a esposa de um dos detidos, com lágrimas nos olhos à reportagem do Midiamax.

“Se não soltarem nossos maridos, nós vamos fechar a rodovia (que dá acesso a Campo grande e Itaporã). Essa terra aqui foi grilada. Ela é nossa e não dessa empresa que quer construir um condomínio de luxo em meio aos nossos barracos. O que será de nós e das nossas criancinhas que já estão sem nada”, questiona a esposa de outra liderança presa durante ação do Batalhão de Choque da Polícia Militar.

Segundo a indígena, inúmeras famílias vivem confinadas em barracos que abrigam até uma dúzia de pessoas, amontoadas quase umas em cimas das outras não só na Ñhu Verá, mas nas outras nove retomadas que fazem parte do entorno da Reserva Federa. “Tem gente que pensa que a gente gosta de viver assim, igual bicho. Claro que não! Não somos porcos para vivermos em chiqueiro provisório. Apenas reivindicamos o que é nosso”.

Depois da retomada da área, que já está com parte do muro de lajotas levantado, cresce a cada hora o número de barros em meio aos restos de materiais deixados pela construtora. No local também estão dois contêineres de ferramentas fechados e também uma caçamba de entulhos. Um contraste de cores em meio às lonas pretas.

Prisão preventiva

A de Dourados converteu a prisão do ex-candidato ao governo de Mato Grosso do Sul nas últimas eleições, Magno Souza (PCO), e outros oito indígenas de flagrante para preventiva. Na decisão, a Justiça apontou uso de armas como uma das justificativas para a conversão.

Entre as evidências apontadas pelo magistrado da 2ª Vara Federal, estão a agressividade na conduta dos presos e o uso de armas, como facas, facões, além do porte da arma de fogo apreendida, que era compartilhado.

Além disso, o juiz entendeu que há ameaças diversas: lesão corporal dolosa e a associação de diversas pessoas para cometer crimes, evidenciando que a colocação dos presos em liberdade representa risco à ordem pública.

Indígenas foram detidos pela polícia no sábado (8) – Foto: Marcos Morandi/Midiamax

“Pelo que consta dos autos, resta claro que medidas cautelares diversas da prisão são insuficientes para resguardar a ordem pública e a paz social”, relatou o magistrado. Entre elas, estaria o comparecimento em Juízo, conforme pedido da DPU (Defensoria Pública da União).

Já o MPF (Ministério Público Federal), que não é favorável à da prisão preventiva, reconheceu que há risco à ordem pública, defendendo a proibição dos flagrados retornarem ao local dos fatos e chegando a sugerir monitoramento eletrônico, caso fossem liberados.

“Com efeito, entendo devidamente demonstrado, pela autoridade policial, o risco à ordem pública, o que fora ratificado pelo membro do Parquet estadual, órgão apto a proferir o parecer quando da audiência de custódia realizada no plantão da Justiça Estadual”, fundamenta o magistrado da 2ª Vara Federal de Dourados.

Entenda o caso

O ex-candidato ao Governo de Mato Grosso do Sul, Magno Souza (PCO), e mais oito indígenas foram detidos no último sábado (8), durante a retomada de área indígena onde é construído um condomínio de luxo pela Corpal – Incorporadora e Construtora, em Dourados. A Justiça Federal deve seguir analisando o caso.

O MPMS (Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul) pediu pela prisão preventiva do ex-candidato e dos demais detidos. No entanto, por serem indígenas, o caso será analisado pela Justiça Federal.

Os indígenas estavam no local desde a última quinta-feira (6) e, sem conflitos, o grupo foi preso no sábado. Um idoso de 77 anos, que estava entre os dez indígenas presos, foi ouvido e liberado após intermediação da DPE (Defensoria Pública do Estado) do Mato Grosso do Sul.

Os outros nove continuam detidos e respondem pelos crimes de ameaça, lesão corporal, esbulho possessório, associação criminosa e porte ilegal de arma.

Prisões de lideranças indígenas são questionadas

Organismos de proteção indígena questionam as ações da Sejusp-MS, que mandou homens da elite da PM para realizar as prisões em flagrante. Um deles, um idoso de 77 anos, chegou a ser liberado após intermediação da Defensoria Pública.

Em depoimento à Polícia Civil, os indígenas negaram as acusações, e afirmam ter ocupado o terreno em protesto contra o início das obras do condomínio. Os indígenas afirmam que a área faz parte do território indígena.

O Cimi (Conselho Indigenista Missionário) denuncia que a operação foi realizada sem mandado judicial. Após as prisões, dezenas de indígenas se dirigiram à área retomada, em solidariedade aos detidos, aguardam a liberação dos presos na audiência de custódia.

Indígenas prometem fechar rodovia

Desde a madrugada de segunda-feira (10), várias famílias indígenas voltaram a ocupar a área onde está sendo construído um condomínio de luxo em Dourados.

Os grupos também pretendem fechar rodovias se os nove presos no último sábado (8) não ganharem a liberdade.

A equipe do Jornal Midiamax esteve no local na manhã dessa segunda-feira (10). Os índios prometem resistir e barrar a construção. Eles alegam que a obra está feita em uma área que faz parte do território indígena.

“Nós não vamos atacar ninguém, apesar de estarmos sendo ameaçados. Mas também não queremos ser atacados. A gente está retomando apenas o que é nosso. Não estamos invadindo nada”, explicou uma liderança ouvida pela reportagem.

A Corpal Incorporações e Construções admite que tinha conhecimento de ofício do MPF (Ministério Público Federal) solicitando informações sobre a construção de um condomínio de luxo em área reivindicada como terra indígena pela comunidade Ñhu Verá, no anel rodoviário de Dourados, a 229 km de Campo Grande.

Conforme nota enviada ao Jornal Midiamax, a Corpal afirma que no dia 29 de março – 15 dias após o envio do ofício do MPF – paralisou as obras na área. No entanto, a reportagem esteve no local na manhã desta segunda-feira (10), e lideranças indígenas afirmaram que a construção seguia na data da retomada, na quinta-feira (6).

Ainda conforme apurado pela reportagem, apesar da afirmação da empresa de que as obras haviam sido paralisadas, informações colhidas no local dão conta de que a construtora estava com máquinas e trabalhadores no local.

Depois da ação policial arquitetada pela Sejusp-MS (Secretaria de Justiça e Segurança Pública), que resultou na prisão de 10 indígenas – sendo um idoso de 77 anos que foi liberado após intervenção da Defensoria Pública -, a empresa teria retirado o maquinário e operários do local.

Em nota, a Corpal afirmou que está prestando os esclarecimentos ao MPF, que questionou o motivo da construtora estar erguendo um muro no perímetro da área, que é reivindicada como tradicional indígena.
Além disso, afirma que o terreno está em situação regular. “Todas as ações relacionadas ao terreno em questão seguem rigorosamente as legislações em vigor e que possui todas as autorizações e licenças exigidas pelos órgãos responsáveis para a construção do empreendimento”.

Por fim, a incorporadora conhecida pelas construções de Spas Resorts, afirma que “mantém contato permanente e diálogo aberto com representantes das comunidades indígenas residentes em áreas no entorno de seu empreendimento”.