‘Deu Zebra’ não chega nem perto de donos do jogo do bicho e policiais se revoltam em Campo Grande
Após 10 fases e crise que rachou cúpula da Polícia Civil, sindicato questiona pressão com ‘cota mínima’ de apreensões por delegacia
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Desde a primeira fase da Operação ‘Deu Zebra’, em 3 de setembro, até a décima realizada nesta terça-feira (30), mais de 45 boletins de ocorrência por jogo do bicho foram registrados nas delegacias de Campo Grande. Foram vários donos de bancas levados para as unidades, TCOs (Termos Circunstanciados de Ocorrência) lavrados, mas nenhum dos verdadeiros responsáveis pela contravenção preso.
Dos ‘cambistas’ de jogo do bicho, há quem tenha visitado as delegacias da cidade mais de uma vez. É o caso do homem, de 71 anos, que tem uma banca na região do Cruzeiro. O primeiro TCO foi feito no Garras (Delegacia Especializada de Repressão à Roubo à Bancos Assaltos e Sequestros), em 23 de setembro de 2020.
Naquele dia, foi deflagrada a Operação Black Cat, uma das fases da Omertà, com várias bancas que comercializavam títulos de capitalização e também o jogo do bicho. O dono da banca foi visto fazendo as apostas de forma velada, escondendo os talões do bicho embaixo das cartelas do Pantanal Cap e acabou detido pelo Garras.
Advogado foi até a delegacia e acompanhou o procedimento, até que o cliente fosse liberado. Em 6 de outubro deste ano, ele voltou a ser detido, desta vez pela 2ª Delegacia de Polícia Civil, na Operação ‘Deu Zebra’. Foi então que ele revelou que trabalha com jogo do bicho há 35 anos. Além disso, contou que da outra vez “o pessoal responsável pelos jogos mandou um advogado até a delegacia e que, ao sair de lá, o orientou a voltar aos jogos no mesmo dia, sendo que se algo ocorresse eles resolveriam”.
Menos de um mês depois, ele voltou à mesma delegacia pela mesma contravenção. Ele confessou, entregou os talões e novo TCO foi lavrado. Desta vez, o homem se limitou a dizer que é honesto e que vende o jogo do bicho para complementar a renda. Ainda assim, não consta nos registros a identificação dos responsáveis por fornecerem os jogos ou recolherem os valores.
Enxugando gelo
Todo procedimento feito nas delegacias por conta do jogo do bicho é encaminhado para a Deops (Delegacia Especializada de Ordem Política e Social). A partir daí é instaurado procedimento para investigação. O Jornal Midiamax encontrou apenas dois processos por conta dos TCOs lavrados que chegaram ao Judiciário, no Juizado Especial Central.
Mesmo assim, nos processos não há informações sobre quem seriam os responsáveis pelo jogo do bicho em Campo Grande. Nos interrogatórios, os donos das bancas se limitam a contar que um rapaz em uma motocicleta passa sempre no final do dia para recolher o valor arrecadado.
Nos registros feitos em boletim de ocorrência, os autores dão as mesmas respostas. Alguns começaram a trabalhar com o jogo do bicho há poucos meses, após serem procurados por desconhecidos. No entanto, nunca chegam a falar sobre os verdadeiros donos ou responsáveis pela contravenção.
A exemplo do homem de 71 anos, dono de banca, o trabalho da polícia acaba consistindo em encaminhar o autor para a delegacia, lavrar o TCO e depois de dias voltar a encaminhar a mesma pessoa para unidade policial. Ainda assim, continua acontecendo a Operação ‘Deu Zebra’, em Campo Grande, que chega à décima fase nesta terça-feira.
‘Cota mínima’
O Jornal Midiamax apurou que, no plano de operação da décima fase da ‘Deu Zebra’, foi estipulada cota mínima para cada equipe policial. Ou seja, cada equipe deve identificar ao menos duas bancas responsáveis pelas apostas do jogo do bicho, que apresentem resultado positivo para apreensão de objetos e identificação de autoria.
O prazo para cumprir a missão vai desta terça até o dia 3 de dezembro, quando cada equipe apresentará relatório com o resultado final da operação. Em ofício, o Sinpol-MS (Sindicato dos Policiais Civis de Mato Grosso do Sul) alegou que o andamento de procedimentos das delegacias especializadas e distritais estão prejudicadas por conta do uso dos investigadores na ‘Deu Zebra’.
Além disso, o cumprimento da ‘cota’ que cada delegacia deve cumprir acaba prejudicando ainda mais o trabalho. Foi solicitado que desdobramentos da operação sejam executados apenas por policiais das delegacias encarregadas pelo inquérito policial.
Disputa pelo controle do jogo do bicho
No dia 8 de novembro, o Jornal Midiamax noticiou que, dentro da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul, servidores suspeitam que as ações no âmbito da ‘Deu Zebra’ estariam ligadas à suposta tentativa de interferência na briga pelo controle do jogo do bicho em Campo Grande. O caso resultou em denúncias ao MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) e pedido de afastamento do delegado-geral.
Em meio à crise na diretoria da corporação, Adriano Garcia recebeu 15 dias de férias, até o fim de novembro, sendo substituído pela delegada adjunta Rozeman Geise Rodrigues de Paula. Informações obtidas pelo Midiamax são de que Adriano retornaria das férias já em outro cargo, não mais como delegado-geral, após desgaste sofrido com as recentes denúncias.
Crise na Polícia Civil
Inicialmente, os delegados não se incomodaram por achar que participavam de uma ofensiva concentrada da Polícia Civil contra o jogo do bicho na Capital de MS. Mas, estranharam ao descobrir que as batidas foram organizadas em paralelo à atuação da força-tarefa após delegados supostamente terem mantido sob sigilo informações que investigados teriam tentado acessar através do delegado-geral da PCMS.
“Tirar equipe de uma especializada dos trabalhos cotidianos para isso, isolando os colegas que estavam mais inteirados sobre o assunto é, no mínimo, estranho”, confirmou um delegado à reportagem. Os delegados que integram a força-tarefa não quiseram se manifestar.
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