Ciclo do medo a vergonha acaba prendendo mulheres em relacionamentos violentos na Capital

Estudo mostra como funciona o ciclo da violência doméstica

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Caso de repercussão nacional, a prisão do DJ Ivis e posterior divulgação de vídeo em que ele chora e se diz arrependido expõem fases do ciclo da violência doméstica. O ciclo foi identificado no estudo de uma psicóloga e tem três fases, a fase do aumento da tensão, seguida da fase do ato da violência e, por fim, o arrependimento e comportamento carinhoso.

No caso do DJ, o vídeo em que ele pede desculpas mostra o suposto arrependimento. Muitas vezes, nos casais que passam por situação de violência doméstica, a mulher acaba desculpando o agressor. O momento em seguida, antes do próximo conflito, é como uma ‘lua de mel’, como apontado na pesquisa da psicóloga norte-americana Lenore Walker.

(Reprodução, Instituto Maria da Penha)

Na primeira fase do ciclo, o homem externa a violência e raiva de outras formas, como socos na parede ou quebrando objetos. Na segunda, ele desconta a situação com a violência contra a companheira. Já na terceira, o falso arrependimento, quando o homem pede desculpas e diz que vai melhorar, vai mudar, e muitas vezes acaba convencendo a vítima, até que o ciclo se repita.

Conforme dados da Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública), em Mato Grosso do Sul, do dia 1º de janeiro até 19 de julho de 2021, foram 3.368 boletins de ocorrência registrados por crimes de violência doméstica, dos quais 1.871 em Campo Grande. Ou seja, mais de 16 casos por dia em todo Estado e mais de 9, diariamente, só na Capital.  

Como encerrar o ciclo?

Em conversa com o Midiamax, o advogado criminalista e professor de Direito Penal Luiz Carlos Saldanha Rodrigues Júnior, ressaltou a importância da vítima buscar ajuda. “Esse tipo de violência dificilmente é enfrentado se a vítima não buscar o socorro”, disse.

O fato é que, sem a denúncia da vítima, o caso não chega aos órgãos competentes, como Polícia Civil ou Ministério Público. “Esse caso do DJ Ivis não é uma exceção, passa a ser uma regra. As mulheres, muitas vezes, sofrem a violência calada”, pontuou o advogado. Neste cenário, a vítima procurou a polícia anteriormente e depois divulgou vídeos das câmeras da própria casa, que mostram as cenas de agressões.

“A vítima tem que buscar ajuda das autoridades, infelizmente não há outra solução”, pontuou. Luiz Carlos Saldanha também lembra que as pessoas do convívio das vítimas devem sim “meter a colher”. No caso do DJ, as imagens filmadas mostravam pessoas que trabalhavam na casa do artista presenciando as agressões e, mesmo assim, não ajudavam ou denunciavam.

“Temos que nos meter, temos que dar o auxílio, o conselho para as vítimas saírem dessa situação”, pontuou o professor. Segundo Saldanha, é comum a situação de funcionários que, mesmo sabendo dos casos de violência doméstica, acabam não se envolvendo, pela condição de empregados e de não terem participação direta na vida íntima do casal.

“Na primeira vez que sofre uma violência, um grito, um tapa, uma ameaça do companheiro, a vítima deve sim comunicar as autoridades. Não permita que a situação se perpetue”, disse. Para Saldanha, como forma de proteção, as mulheres devem também estar atentas aos primeiros sinais de violência, antes de entrarem em um relacionamento.

A quem recorrer?

Além do 180, Central de Atendimento à Mulher que é o canal para denúncia de violência doméstica, ou mesmo 190 para acionar a Polícia Militar, a vítima pode procurar a Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher). Em Campo Grande, fica localizada na Casa da Mulher Brasileira, no Jardim Imá. Nas cidades do interior também há delegacias especializadas, mas toda delegacia deve, ao menos, orientar a vítima.

Caso a mulher prefira, pode registrar o caso pela internet. É possível pelo site da Delegacia Virtual fazer o registro do boletim de ocorrência. Em Mato Grosso do Sul, o programa Não se Cale traz dados e divulgação sobre o enfrentamento da violência contra a mulher.

No site do Instituto Maria da Penha, que traz a explicação sobre o ciclo da violência doméstica, texto ressalta que é necessário quebrar esse ciclo. “As mulheres que sofrem violência não falam sobre o problema por um misto de sentimentos: vergonha, medo, constrangimento. Os agressores, por sua vez, não raro, constroem uma autoimagem de parceiros perfeitos e bons pais, dificultando a revelação da violência pela mulher. Por isso, é inaceitável a ideia de que a mulher permanece na relação violenta por gostar de apanhar”.

*Matéria alterada às 19h58 para correção de informação.

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