Dois maçaricos foram encontrados dias após perícia 

Suposta invasão do prédio da Coordenadoria Geral de Perícias e falsificação de provas são novos ingredientes do processo da morte de Adriano Correia do Nascimento, ocorrida no dia 31 de dezembro, pelo policial rodoviário federal Ricardo Hyun Su Moon, 47 anos. O achado de dois maçaricos, parecidos com armas de fogo, dentro da caminhonete Toyota Hilux do empresário, dias depois da perícia feita no veículo, levantou as suspeitas e resultou em nova investigação.

A história começou no dia 4 de janeiro, quando pela terceira vez os peritos voltaram ao veículo periciado e estacionado na Coordenadoria Geral de Perícias. Ao abrir a porta dianteira, do passageiro, os três servidores avistaram os dois flambadores, no assoalho da Hilux, colocando todo o trabalho realizado até ali em xeque.

Foi, então, instaurado procedimento investigatório na Capoc (Coordenadoria de Apuração de Procedimentos, Orientação e Correição), e foram ouvidos todos os peritos envolvidos no caso e até o delegado plantonista da Depac (Delegacia de Pronto Atendimento Comunitário) Centro, Enilton Zalla.

Em todos os depoimentos, a mesma versão foi contada. No dia 31 de dezembro de 2016, dia do crime, a perícia foi acionada e no local realizou a primeira vistoria na Hilux, quando vários objetos foram encontrados no local, mas nenhum maçarico, segundo os peritos. No mesmo dia, durante a tarde, uma nova busca foi feita e novamente os objetos não foram vistos.

Pela terceira vez, desta vez no dia 2 de janeiro deste ano, os peritos voltaram a mexer no carro. Uma vistoria mais detalhada, em que os forros dos bancos e portas chegaram a ser retirados e o trajeto dos sete tiros que acertaram a caminhonete definidos. Foi exatamente por conta do resultado desse trabalho que no dia 4 de janeiro os servidores voltaram à Hilux.

Depois de ver as fotos da perícia feita pela responsável pelo caso, um dos peritos ficou com dúvidas sobre o trajeto dois dos tiros. Para esclarecer, os dois servidores que realizaram o trabalho voltaram ao veículo com o colega e ao abrirem a porta dianteira do passageiro, “visualizaram de forma escancarada” os flambadores.

O processo de levantamentos de fotos do dia do crime, do trabalho feito no dia 2 de janeiro e de entrevista com todos os envolvidos começou e, em nenhuma das provas, foram localizados quaisquer vestígios dos objetos dentro da caminhonete antes do dia 4.

Os maçaricos dentro do veículo poderiam comprovar uma das versões apresentada pelo PRF em depoimento à polícia, a de que o adolescente, que estava no banco de trás da Hilux, segurava um objeto que aparentava ser uma arma. Moon afirmou mais de uma vez que viu a vítima mais jovem, que levou dois tiros nas pernas, com algo parecido a um revólver.

O delegado Zalla também relatou em depoimento que, se os objetos tivessem sido encontrados no dia do crime teria sido comunicado, já que a cada achado ele era avisado pelos peritos. Outro servidor chegou a lembrar de que na data olhou de baixo do banco e viu apenas uma lata de cerveja e o extintor. A hipótese levantada durante o procedimento na Capoc foi então a de que alguém teria colocado os objetos no veículo.

Segundo os servidores ouvidos, depois da perícia, a Hilux ficou estacionada com os vidros abertos e portas destrancadas, em um local de ‘fácil acesso’. No dia em que os objetos foram encontrados, um dos peritos afirmou ter visto várias pessoas, que trabalhavam na reforma do Imol (Instituto Médico e Odontológico Legal), em volta do veículo.

Sem câmeras de segurança, ou cerca elétrica, os servidores ressaltaram a facilidade de invasão ao local e chegaram a juntar no processo ofícios enviados à Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública) durante todo o ano de 2016 com pedidos de segurança e até notícias de um furto que aconteceu no prédio na madrugada do dia 20 de dezembro.

Bebidas alcoólicas

Além dos maçaricos, o aparecimento de duas garrafas de bebidas alcoólicas, uma ‘Catuaba Duelo’ e uma ‘Jurubeba Duelo’, também foi investigadas, mas com os depoimentos ficou comprovado que elas estavam desde o princípio no veículo e não eram relevantes para a investigação policial.  

No dia 3 de março, a coordenadora-geral de perícias Glória Setsuko Suzuki decidiu por arquivar o processo, por entender que os servidores não “contribuíram para os acontecimentos descritos autos, e não se omitiram sobre o fato” e assim não cometeram transgressão disciplinar.

Ela ainda decidiu enviar cópia do procedimento para a 1ª Delegacia de Polícia Civil, que investigou o caso, e para a Delegacia-Geral da Polícia Civil, pedindo uma apuração detalhada da possível invasão e falsificação de provas.

“A respeito dos fatos narrados neste procedimento, visando apurar possível responsabilidade penal, de terceiros que tentaram macular o exame pericial, realizado no veículo supramencionado nos autos, sugiro, SMJ, que seja extraída cópia integral dos autos, para que seja encaminhada para Delegacia-Geral da Polícia Civil, para conhecimento e providência cabíveis, entendendo que assim será melhor esclarecido tais fatos, em um procedimento investigatório mais amplo”.

O crime

Ricardo Sun Moon passou de policial a réu na madrugada  do dia 31 de 2016, quando envolveu-se em uma confusão no trânsito, e atirou contra Adriano e as outras duas pessoas que estavam com ele no carro, Agnaldo Espinosa da Silva e o enteado de 17 anos. O empresário morreu na hora. Moon alegou legítima defesa, versão que não prosperou nem no inquérito da Polícia Civil nem na análise do Ministério Público Estadual.

Uma reconstituição com todos os envolvidos e também testemunhas foi realizado no dia 11 de janeiro de 2017. Na data, Moon estava preso em virtude a um mandado de prisão preventiva, mas no dia 1º de fevereiro, ele ganhou a liberdade. Em resposta, o MPE entrou com recurso pedindo que o policial fosse novamente preso e também respondesse pelo crime de fraude processual, o que foi negado pelo magistrado em despacho anterior.

Ainda assim, a denúncia feita pelo MPE pelo homicídio já foi aceita e o processo segue até que o juiz decida se o policial vai ou não a júri popular pelos crimes contra a vida dos quais é acusado.