A ameaçou nesta segunda-feira, 11, retaliar os EUA, a menos que Donald Trump reverta sua decisão de limitar vistos para jornalistas chineses. O atrito é mais um capítulo da disputa diplomática entre e Pequim, uma rivalidade que Jean-Pierre Cabestan, cientista político da Batista de Hong Kong, chama de “nova guerra fria” – termo que vem sendo cada vez mais usado por outros analistas.

A última fricção é resultado de uma queda de braço que começou em fevereiro, quando os EUA impuseram restrições às ações da imprensa estatal da China no país, descrevendo o trabalho dos jornalistas chineses como “propaganda”. Em março, Pequim expulsou 13 jornalistas americanos, todos correspondentes do New York Times, do Washington Post e do Wall Street Journal.

“Lamentamos a decisão errada dos EUA, que é uma escalada da supressão política da mídia chinesa”, disse na segunda-feira o porta-voz da chancelaria da China, Zhao Lijian. “Os EUA estão entrincheirados em uma mentalidade da guerra fria e em preconceitos ideológicos.” Mas a disputa entre as duas maiores economias do mundo não está restrita ao jornalismo.

EUA e China vinham em rota de colisão antes do novo aparecer. Desde que Trump assumiu, em 2017, a Casa Branca declarou uma guerra comercial ao governo chinês, acusado de manipular a moeda e de jogar baixo, impondo aos americanos um déficit comercial de US$ 419 bilhões com a China.

Trump colocou tarifas sobre produtos chineses. A China respondeu, taxando importações dos Estados Unidos. E a relação se deteriorou. “O nível de confiança entre os dois países chegou ao ponto mais baixo desde que as relações diplomáticas foram estabelecidas, em 1979”, disse Wang Huiyao, diretor do Center for China and Globalization, de Pequim.

A pandemia, em vez de criar um clima de cooperação, deixou o afastamento mais evidente. A briga sobre a origem do vírus é um reflexo dessa disputa. Em janeiro, Trump elogiava o esforço do presidente Xi Jinping contra o surto. “A China vem trabalhando duro para conter o coronavírus. Os EUA agradecem o esforço e a transparência (dos chineses)”, disse Trump.

A boa vontade da Casa Branca durou até que a pandemia chegasse aos EUA. Criticado por ter minimizado a força do coronavírus, a popularidade de Trump caiu e seu rival democrata consolidou sua liderança nas pesquisas, dificultando o caminho para a reeleição na disputa de novembro.

Nas últimas semanas, a campanha de Trump elegeu a China como bode expiatório. Agora, o presidente e os seus aliados sustentam que o vírus foi criado em um laboratório chinês – e o governo comunista da China seria responsável pela catástrofe econômica mundial.

Na segunda-feira, 18 secretários de Justiça de Estados governados por republicanos enviaram uma carta ao Congresso dos EUA pedindo uma investigação sobre o papel da China na origem da pandemia. “Os erros deliberados do governo chinês são responsáveis pela morte de 80 mil americanos”, escreveram.

O governo chinês afirmou que as acusações de Trump são uma tentativa de desviar a atenção da incompetência do presidente e melhorar suas chances de reeleição. A divulgação da teoria de que o vírus foi criado em um laboratório evocou comparações com as informações de que o Iraque tinha armas de destruição em massa, que o governo George W. Bush usou para justificar a guerra, em 2003. “A China não será o Iraque”, tuitou, no sábado, o porta-voz da chancelaria, Hua Chunying.

Os últimos 40 anos haviam sido de relativa cooperação entre os dois países. As diferenças ideológicas foram deixadas de lado em favor de uma relação simbiótica que rendeu bons resultados econômicos. Milhares de empresas americanas se estabeleceram em território chinês – a GM, por exemplo, vende mais carros na China do que nos EUA. Quase 400 mil jovens chineses estudam em escolas e universidades americanas.

Analistas, no entanto, dizem que o desenvolvimento econômico – uma média de 9% ao ano desde 1989 – tornou a China mais ambiciosa e Pequim começou a reivindicar seu espaço no tabuleiro geopolítico global, com investimentos na África, Oriente Médio e na América Latina. Para Chen Zhiwu, professor da Universidade de Hong Kong, o ponto de inflexão foi a volta da ortodoxia comunista, desde que Xi assumiu a presidência, em 2013.

“Entre 1978 e 2012, o Partido Comunista da China (PCCh) deixou de lado suas raízes e se concentrou no desenvolvimento econômico Depois que o país se consolidou, o PCCh voltou a priorizar o projeto inicial de construção do socialismo”, afirmou Zhiwu esta semana ao jornal Financial Times.

Um sinal da mudança de ventos foi dado por Xi, em 2016. Depois de ter garantido aos EUA que não estava interessado em montar bases militares em ilhas artificiais no Mar do Sul da China, ele enviou baterias antiaéreas e outros sistemas de defesa para a região, pegando de surpresa o governo do então presidente Barack Obama.

Outro indício de que as relações entre os dois países esfriaram é o nível de investimentos chinês nos EUA, que caiu de US$ 45 bilhões, em 2016, para US$ 5 bilhões, no ano passado. De acordo com analistas, a China é hoje um dos poucos temas capazes de unir democratas e republicanos no Congresso. Por isso, a previsão é de que Trump e Biden travem uma guerra durante a campanha, no segundo semestre, para determinar quem pode jogar mais duro com a China.

Observadores mais cautelosos, no entanto, dizem que é preciso ter calma ao analisar as disputas diplomáticas entre chineses e americanos. Na semana passada, Robert Lighthizer, representante comercial dos EUA, e Steven Mnuchin, secretário do Tesouro, participaram de uma teleconferência com Liu He, vice-premiê da China. Depois da conversa, os dois lados disseram que as negociações comerciais progrediram – o que seria, segundo alguns analistas, um sinal de que a retórica agressiva pode não representar a essência da relação entre Washington e Pequim. (Com agências internacionais).