Um trabalho de investigação de cientistas dos Centros de Controlo e de Doenças (CDC) dos EUA e do Centro Nacional de Doenças Tropicais e Ministério da Saúde da traz novos dados sobre os riscos do de Chapare, um agente patogénico que terá sido transmitido aos humanos por roedores e que já infectou um pequeno grupo de pessoas no país que faz fronteira com Mato Grosso do Sul.

Apesar de contar com poucas vítimas identificadas, este vírus que só foi detectado na Bolívia será fatal causando uma febre hemorrágica e outros sintomas que podem ser confundidos com outras doenças como Ébola ou a dengue. Os dados agora revelados alertam para o risco deste vírus confirmando que pode propagar-se de pessoa para pessoa.

Os resultados das mais recentes investigações sobre o misterioso vírus de Chapare foram divulgados esta segunda-feira (16) durante a reunião anual (e virtual) da Sociedade Americana de Medicina e Higiene Tropical (ASTMH, na sigla em inglês). Dois estudos diferentes, mas com os mesmos autores, revelam importantes pistas sobre este vírus que foi identificado pela primeira vez numa pessoa na província de Chapare em 2004 e que em 2019 terá causado cinco infecções perto da capital da Bolívia, La Paz, três das quais fatais.

O alerta para a estranha doença que causa uma febre hemorrágica e outros sintomas graves surgiu em 2019 com o registo de cinco doentes, mas apenas dois sobreviventes. Os trabalhos divulgados na reunião da ASTMH descrevem que os doentes do surto do ano passado tiveram, além da febre, também dores abdominais, vómitos, sangramento das gengivas, erupções cutâneas e dor atrás dos olhos.

Sem tratamento específico, os doentes foram tratados sobretudo com fluidos intravenosos e outros cuidados para tentar atenuar os sintomas. Porém, a gravidade da doença atraiu as atenções dos especialistas em doenças infecciosas quando se tornou claro que não se tratava de dengue ou de qualquer outra patologia conhecida.

Com esta incógnita e mortes sem explicação aparente, as autoridades de saúde da Bolívia recorrem aos CDC para onde foram enviadas as amostras recolhidas dos doentes para análise. “O nosso trabalho confirmou que um jovem médico interno, um médico de ambulância e um gastroenterologista contraíram todos os vírus após encontros com doentes infectados – e dois destes profissionais de saúde morreram mais tarde”, refere Caitlin Cossaboom, uma epidemiologista da Divisão de Patogénicos dos CDC, num comunicado de imprensa da ASTMH. “Acreditamos agora que os fluidos corporais podem transportar o vírus”, conclui, confirmando-se desta forma a possibilidade de transmissão de humano para humano. O resultado deve servir para alertar os profissionais de saúde para este risco e para a importância de evitar contacto com artigos que possam estar contaminados com sangue, saliva, urina ou sémen.

As pistas deixadas pelo surto de 2019 revelam que houve alguns contactos entre os diferentes profissionais de saúde e doentes, nomeadamente através de manobras de reanimação necessárias. Os cientistas também detectaram a presença do vírus no sémen de um dos doentes que sobreviveram a esta infecção quando já tinham passado mais de 170 dias, o que sugere uma provável transmissão sexual. Ou seja, com este trabalho são descritas novas características da doença, incluindo a transmissão de humano para humano, e também a persistência viral em fluidos corporais após a recuperação.

O Chapare pertence a um grupo de vírus chamado arenavírus que são transmitidos por alimentos e água contaminados pela urina e fezes de ratos infectados e provocam doenças graves nos humanos, a maioria envolvendo febres hemorrágicas geralmente fatais. É neste grupo de perigosos agentes patogénicos que se encontra, por exemplo, o vírus de Lassa, que causa milhares de mortes anualmente na África Ocidental, e o vírus Machupo, que foi isolado e caracterizados em 1963 e tem causado surtos mortais também na Bolívia.