Em Campo Grande (MS), cobra é o que não falta. Jiboias espalhadas pela cidade, sucuris nos córregos, urutus nas áreas próximas às matas periféricas, sem contar as estrelas rastejantes do Bioparque Pantanal.
No entanto, para a sociedade campo-grandense, essas diversas espécies com as quais os moradores convivem diariamente não representam ameaça, até porque a maioria sequer é peçonhenta. Perigosas mesmo são as víboras “humanas”, aquelas que dão o bote e soltam um veneno malicioso capaz de destruir vidas.
Em alusão ao dia da serpente, a reportagem do Jornal Midiamax convocou a população para comentar sobre o tema. De forma unânime, os leitores que participaram da conversa concordaram: a capital de Mato Grosso do Sul é uma “cidade de cobras” e não estamos falando dos animais.
Tanto é que foi difícil encontrar quem não tenha sido vítima da peçonha de alguém pelo menos uma vez na vida, especialmente em ambientes corporativos, onde, conforme os relatos, os coleguinhas estão sempre a postos para destilar veneno e não se importam em manchar reputações pelos mais variados motivos — a ponto de inventarem mentiras só para contaminarem os demais contra um ou mais alvos.
Portanto, chame o Instituto Butantã e prepare o soro antiofídico para ler os relatos a seguir, pois, perto de alguns campo-grandenses, as cobras mais venenosas são completamente inofensivas.

Cobras no trabalho
Publicitária de 27 anos está na lista de pessoas já prejudicadas pelo veneno alheio, muitas vezes, gratuito. Ela conta que, após anos de formada, não consegue emprego na área depois que um grupo espalhou mentiras a seu respeito.
“As coisas começaram na faculdade e quando você não segue um grupinho influente ou não dá bola pra eles, passa a ser alvo. Uma vez me candidatei para trabalhar em uma empresa e soube que lá dentro uma galera que tinha estudado comigo quis me queimar para eu não entrar. Mas fiquei chocada porque descobri que eles inventaram coisas que eu nunca fiz pra fecharem as portas pra mim. E deu certo, porque elas nunca se abriram mesmo. Quis até registrar boletim de ocorrência, mas fiquei tão abalada que preferi não seguir no meio. Me deu nojo”, lamenta, afirmando ter adquirido depressão e síndrome do pânico após o episódio. “Hoje vivo medicada”.
Em caso semelhante, um bacharel em Direito de 31 anos conta ter sido difamado dentro de um escritório para onde enviou currículo no início da carreira. “Tenho um amigo que trabalha nesse lugar e quando falaram meu nome lá dentro, uma abençoada disse que já tinha estagiado comigo e que eu só ficava ‘assistindo Netflix’ e jogando jogo durante o estágio. Primeiro que nunca estagiei com essa pessoa e mal troquei palavras quando cruzei com ela, e nunca, em hipótese alguma, abri streaming em serviço”, afirma.
“Fiquei sem acreditar quando me contaram que ela falou isso. Não sei de onde tirou, nem porque inventou. Queria saber e pensei em perguntar pra ela porque isso dá processo por difamação”, dispara.
Atendente de telemarketing de 37 anos, moradora do Coophavila II, é outra que já foi difamada no trabalho. “Não gosto de lembrar. Inventaram para a chefe do nosso setor que eu tinha dito que o marido dela era Bonito, sendo que quem falou isso foi a própria pessoa que contou pra ela. Não gostavam de mim porque eu não fazia questão de ficar na rodinha e aí essa pessoa, que era tipo uma líder de um grupo, pegou e falou isso. Fui demitida sem mais nem menos 15 dias depois”, recorda.

Cuidado em quem confia: tem cobra que mata com abraço
Para além dos ambientes empresariais, as víboras de duas pernas também estão presentes dentro de círculos familiares e de amizade. Nesses casos, a dor do veneno pode ser ainda maior pela quebra de confiança.
“Eu tinha uma amiga de infância que passou a implicar com um namorado meu. No começo, não dei bola, mas com o tempo fui caindo na pilha e começando a levar em conta o que ela falava. Perdi a confiança nele, fiquei paranoica e comecei a controlar tudo, monitorar tudo. Não demorou muito e brigamos feio. Quando fui na casa dele conversar, cheguei e vi os dois juntos na calçada abraçados. E eu não sou besta, né?”, expõe uma estudante de psicologia, de 23 anos.
“Não aguentei ver aquilo e fui pra cima dos dois. Ela tava me envenenando contra meu namorado pra ficar com ele. Doeu mais em mim o fim da nossa amizade pelo laço de anos que nós duas tínhamos do que pelo meu ex”, desabafa a acadêmica.
Quando a intenção é destruir relacionamentos, as serpentes não perdem tempo. Empresário de 44 anos conta que seu casamento de 12 anos terminou porque sua sogra envenenava constantemente a esposa contra ele. “Na época eu não tinha aberto a loja ainda e ela dizia que eu era um fracassado, que a filha não ia ter futuro comigo. Sempre distorcia situações pra dizer pra minha esposa que eu tinha sido ruim com ela”, explica.
Mas o estopim se deu em um almoço de família, quando ela não gostou da peça de carne que ele levou para assar. “Minha esposa ia chegar depois porque tinha ido fazer a unha, então ela não viu a mãe dela criticando a carne, falando que o corte tava feio, que tinha muita gordura e que ela não ia comer aquilo, jogou até pros cachorros comerem. Aí eu acabei discutindo com ela. Quando minha mulher chegou, encontrou a mãe chorando. Só que ela teve a cara de pau de mentir que eu empurrei ela, sendo que nem a voz eu levantei”, detalha.
Entretanto, ele revela que a sogra foi desmentida pelos outros presentes. “Imagina se não tivesse ninguém?”, questiona. Apesar disso, a relação não resistiu por muito tempo diante desse recorrência de episódios semelhantes.

Alto lá: se o peixe morre pela boca, a cobra também pode morrer se morder a própria língua
Os casos relatados acima expõem a realidade peçonhenta das relações emocionais e corporativas na capital sul-mato-grossense e os impactos causados pelo comportamento danoso e rasteiro, típico das serpentes, capazes de matar com um abraço.
Mas, as línguas ferinas de Campo Grande precisam ficar atentas porque fazer acusações falsas sobre alguém pode custar muito caro e gerar processo, como aponta o bacharel em Direito que foi vítima de uma dessas situações.
“Se a pessoa que foi difamada conseguir juntar provas, como gravações, conversas, prints e contar com testemunhas, cabe processo por danos morais com direito a indenização”, afirma o profissional.
Assim, seguindo a premissa de uma antiga sabedoria popular que diz que o peixe morre pela boca, as cobras também devem tomar cuidado para não morderem a língua e acabarem se tornando vítimas do próprio veneno. Ou será que isso não é problema?

Mas e você? Já foi vítima da perversidade do veneno de alguma cobra “humana” em Campo Grande? Envie seu relato para a reportagem.
Fale com os jornalistas do MidiaMAIS!
Tem algo legal para compartilhar com a gente? Fale direto com os jornalistas do MidiaMAIS através do WhatsApp.
Mergulhe no universo do entretenimento e da cultura participando do nosso grupo no Facebook: um lugar aberto ao bate-papo, troca de informação, sugestões, enquetes e muito mais. Você também pode acompanhar nossas atualizações no Instagram e no Tiktok.
***