Registros da cantora Maiara aparentemente bêbada, que faz dupla sertaneja com a irmã Maraísa, ganharam repercussão na internet nos últimos dias. Em vídeo, ela aparece “virando” uma garrafa de bebida alcoólica durante o show realizado em Campo Grande no último sábado (18), no evento “No Pelo 360 Festival”, que reuniu cantores sertanejos na capital. Para socióloga ouvida pelo Jornal Midiamax, cenário expõe diferentes padrões sociais.

Nas redes sociais, imagens do show viralizaram e vários internautas classificaram a atitude da cantora como um “horror”, “patética”, “alcoólatra”, e também como sintoma de que ela estaria doente emocionalmente. As críticas à situação registrada em Campo Grande, entretanto, não são fatos isolados.

Cantora sempre no alvo das críticas 

Com uma rápida pesquisa na internet é possível encontrar diversas publicações que criticam o comportamento da cantora em outros shows Brasil afora. “Fãs de Maiara e Maraísa estão decepcionados com a dupla após show em Florianópolis. Público mostrou que Maiara estava aparentemente bêbada e não conseguia cantar direito”, diz uma das publicações.

Em outra matéria, de janeiro deste ano, outro site diz: “Maiara, da dupla com Maraisa, é acusada de fazer show bêbada: ‘Cenas lamentáveis’”. Em fevereiro, outra manchete diz: “Maiara rebate críticas por beber em shows e afronta haters”.

Comportamento exclusivo? 

No entanto, beber no palco durante shows é comportamento extremamente comum entre cantores, principalmente os do segmento sertanejo. O fato foi lembrado por um internauta em uma das publicações na rede X, o antigo Twitter, sobre o show de Campo Grande.E o povo paga pra assistir isso. Não é só ela, Gusttavo Lima, Bruno, Leonardo, e assim por diante”, diz o tweet.

Críticas ao comportamento e à relação desses cantores com a bebida, por outro lado, não são tão comuns. 

Para a socióloga Nathalia Eberhardt Ziê, mestre em História Social e integrante da Articulação de Mulheres Brasileiras no Mato Grosso do Sul, esse cenário evidencia duas importantes questões: a de gênero e a de saúde pública. 

O consumo de álcool é moralmente encarado de maneiras variáveis pelas pessoas, destaca. Além disso, “os critérios demonstram os incômodos da sociedade com o papel que as mulheres estão assumindo, suas independências e inserções em universos e comportamentos antes dominados pelos homens”, analisa a especialista.

“Por exemplo, uma mulher se embebedando se tornar um fato de destaque para a opinião pública demonstra como ser homem e ser mulher em nossa sociedade é regulado por um padrão de convívio excludente e discriminatório”, contextualiza Nathalia. 

Isso porque o mesmo fato “é tratado com naturalidade quando praticado por um homem e com estigmas e preconceitos quando praticado por uma mulher, isso sem analisar intersecções de raça, classe social e identidade de gênero”, completa a socióloga.

Droga legalizada

A especialista ainda destaca que essa diferenciação é tão séria – e comum – que há homens que justificam violências praticadas contra mulheres a partir do fato de que “ela estava bêbada”. 

“Esse discurso é recorrente para julgamentos morais ou, muito mais grave, quando são cometidos crimes de abusos sexuais contra mulheres, por exemplo. Isso é parte de uma cultura que não aceita o movimento de liberdade das mulheres ao mesmo tempo em que legitima violências a partir do próprio uso excessivo do álcool, que leva a outro problema”, amplia Nathalia.

Na análise da especialista, o primeiro debate a se fazer sobre esse assunto é se o problema é o uso do álcool. “Já se tem comprovado que outros psicoativos criminalizados no mundo não causam os dados que o álcool, uma substância totalmente legalizada, causa para a vida humana”, pontua.

“O álcool é a substância psicoativa mais antiga e é usado em várias culturas durante séculos. O debate que se faz hoje em relação a este consumo, do ponto de vista da saúde pública, é sobre seu uso abusivo, responsável por gerar danos à saúde, além de danos sociais e econômicos. Este deveria ser o primeiro debate a se fazer, se o problema é o uso do álcool e não os machismos”, finaliza a especialista.