Os olhos, quem vê de perto, enxerga um tom único ora verde, ora azul e o nariz característico da italiana Sophia Loren, conhecida por sua beleza extraordinária. É assim que também era chamada, nos corredores da Telems (Telecomunicações de Mato Grosso do Sul S/A), Sirley Sousa Roncador, admitida na empresa na década de 50, como a primeira telefonista do Estado. A ‘sósia da atriz’ foi homenageada neste fim de semana, aos 86 anos, em Campo Grande.
“Esse era o meu apelido nos corredores da Telems. Eu trabalhei lá quando ainda era a Tele-Oeste, entrei no dia 1° de agosto de 1957. Era uma amiga, chamada Léia, que seria a primeira telefonista de Mato Grosso do Sul. Só que ela foi embora para São Paulo e me indicou para trabalhar lá. Era um trabalho muito árduo, muito difícil e fiquei um bom tempo sozinha até ser contratado o primeiro time de telefonistas. Eram seis horas sem parar, com ligação a todo momento, e eu não podia nem levantar para ir ao banheiro”, relembrou Sirley.

Nascida em 1938, ela conta que este foi o seu primeiro emprego, aos 18 anos. “Fui a primeira operadora de telemarketing e estava na festa de inauguração da empresa, no dia 26 de agosto de 1957. Foram, ao todo, 12 anos de trabalho. E tive que sair porque me casei, engravidei, e o meu marido não aceitava. Dizia que não aceitaria que o filho dela ficasse com babá e nem que eu trabalhasse fora, que ele tinha dinheiro para nos sustentar. E, no fim das contas, depois de três filhos e 16 anos juntos, ele me abandonou, foi embora”, contou.
Na época, enquanto telefonista, Sirley disse que instruiu a segunda telefonista contratada e ambas conseguiram revezar entre trabalhar e ensinar as novas.

“A gente tinha que marcar bilhete e fazer as ligações para São Paulo, tudo ‘na posição’, como chamávamos. Tinha também os circuitos, que a gente registrava os bilhetes rapidamente e ainda atendia aos servidores. Era tudo bem diferente, não tinha a ligação direta como existe hoje. Acendia uma luz, a gente falava com a pessoa na mesa de ligação, chamada de mesa de tráfego e por ali passava todo o serviço de telefonia da cidade”, argumentou.
No último ano, quando o marido já ‘pressionava muito’, Sirley precisou pedir demissão. “Eu já estava bem lá, o movimento das ligações era intenso e atendíamos Campo Grande, Corumbá, Aquidauana, várias cidades vizinhas. Mas, o meu marido não deixava mais e tive que sair, mas, a experiência na empresa foi longa. E logo depois ele me deixou. Fiquei com três crianças, de 11, 12 e 14 anos para cuidar, então, fui estudar de novo para ser professora”, disse.

Aposentada desde 1998, disse que não acompanhou as tecnologias e “parou no tempo”. “Eu não gosto de WhatsApp, só uso o tijolinho”, brincou.
Enquanto isso, a amiga, no caso Maria Dourado de Assis, de 81 anos, é totalmente o oposto: “Eu já uso celular o tempo todo, falo no WhatsApp, faço Pix. Aqui somos amigas, mas, é uma o posto da outra. É engraçado que, com tanta modernidade, tem horas que eu até me pergunto: como ainda estou viva. Quem viu o telefone magnético e está aqui até a inteligência artificial sabe que é muita história, um espaço enorme”, opinou.

Neta da ‘Sophia Loren de MS’, a estudante de psicopedagogia Juliane Sousa Roncador da Silva, de 24 anos, disse que a avó “é uma figura”. “Minha avó teve um passado brilhante, enquanto telefonista e mulher. E continuou a ser uma pessoa divertida, cheia de histórias, então, sempre foi um exemplo pra mim. E fiquei com essa missão de mexer no celular para ela, tirar fotos e filmar. E a admiro demais. Quando ela conta que foi abandonada e tomava café a noite inteira para estudar e dar conta dos filhos, sempre me emociono”, finalizou.
Neste sábado (7), na Chácara do Silvinho, em Campo Grande, antigos funcionários fizeram uma homenagem a Sirley e também a D. Maria, as duas primeiras telefonistas de Mato Grosso do Sul. No ano anterior, quando fizeram a primeira edição do encontro, o Jornal Midiamax também esteve lá. Confira a reportagem: Grupo que deu vida aos primeiros celulares de Campo Grande se reúne após 25 anos: ‘Celebrar’.
