A busca por conhecimento religioso levou Leoni de Almeida Aldebayó, de 62 anos, até a Nigéria. Antes no candomblé e morando no Japão, conheceu um africano e aprendeu sobre as raízes da religião tradicional Yorubá, o que a levou a querer participar de uma cerimônia no outro continente, no ano de 2018. Lá, por meio de um toque e olhar arrebatador de uma criança, foi chamada de mãe e tomada por uma energia espiritual tão forte que a fez construir nova família.

Entre idas e vindas, Leoni se casou com o pai desta criança, hoje uma adolescente, e trouxe todos ao Brasil, mais precisamente para Campo Grande, no bairro Portal da Lagoa. Assim, em setembro de 2021, o endereço que abrigava o terreiro de Leoni se tornou a casa religiosa Axé Oya Brasil, sendo ela sacerdotisa e o marido sacerdote, o nigeriano Sangowale Isola Aldebayó, de 43 anos.

(Nathalia Alcântara/Jornal Midiamax)

“Foi algo espiritual, uma energia espiritual do bem que nos uniu e me fez trazer esta família. A Oyá [Joyosi Adebisi Sangowale, de 15 anos] me chamou de mãe e olhei no olho dela e falei que ela era minha, minha filha. Depois eu conheci o pai dela e o irmão, o Sango Bukolá Aldebayó, que hoje está com 17 anos. E hoje somos muito felizes. Eu sou mãe deles e também mãe de tanta gente, que cuidamos, abençoamos e fazemos orações”, afirmou Leoni.

Segundo Leoni, quando a pessoa é dos orixás, candomblé ou umbanda, possui uma casa aberta, o chamado terreiro. “Eu tenho o meu desde 1998. E tenho dois filhos biológicos, um que mora no Japão e a outra em Nova York. O menino tem 40 anos e é comerciante e a menina tem 39 e é escritora. Eles não pretendem voltar e aí eu pensei: ‘Meus filhos gostam dos orixás para eles, não querem seguir e nem serem sacerdotes’. E aí, por regra, quando o pai ou a mãe morre na casa de candomblé, fica para um filho ou um herdeiro, o qual se descobre pelo jogo de búzios ou então a mãe deixa por escrito”, argumentou.

(Nathalia Alcântara/Jornal Midiamax)

Além disso, Leoni, que também é artesã, capelã e iyalorixa conceituada, disse que não pretendia escolher uma pessoa e fazê-la raspar a cabeça. “Isso faz parte do ritual e acho que a pessoa deve escolher fazer este sacerdócio por amor, então, agora eu sei que, quando eu morrer, quando eu fechar os meus olhos, esta família aqui vai seguir o meu legado. Além disso, tem muito estudo. Até hoje eu não consegui aprender todas as rezas em Yorubá e eles sabem fazer isso”, comentou.

Desta forma, dando amor aos filhos e ao sacerdote, proporcionando a eles uma vida digna aqui no Brasil, Leoni estava certa que o seu legado teria continuidade. O casamento de Leoni e Sangowale ocorreu em São Paulo, local onde ela também inaugurou um instituto que defende religiões de matrizes africanas e combate qualquer tipo de preconceito.

(Nathalia Alcântara/Jornal Midiamax)

“Aqui eles têm um bom estudo, uma vida melhor, tranquilidade e quem quiser tem acesso à raiz pura da religião. Eles estarão ensinando ao meu povo o que é um orixá de verdade, principalmente porque existe muita mentira por aí. Eu mesma já vi muita mentira, muita coisa errada, fazem coisas misturando droga, cachaça, coisas que não são reais e não quero isso para minha vida. Aqui, é um ritual tradicional e quero que esse legado continue”, ressaltou.

Agora, Sangowale, que possui outros seis filhos na Nigéria, fica no vai e vem, mas, diz que ama o Brasil e sempre se imaginou morando aqui. Apaixonado por arroz e linguiça suína, além de uma cervejinha ou refrigerante, fala que também faz comidas tradicionais, porém, ficou encantado com a culinária brasileira. Na capital sul-mato-grossense, gosta de frequentar restaurantes e comer chipa e sopa paraguaia. “Ela ama as crianças e mantém o culto do orixá na íntegra, o mais puro possível”, disse.

(Nathalia Alcântara/Jornal Midiamax)

Na rotina, a mãe conta que a família não possui hora em específico para acordar, principalmente porque os filhos estudam no período vespertino. “A gente é bem tranquilo aqui. Acordamos geralmente às 10h, mas, não tem um horário específico, é tranquilo, só que depende muito também dos atendimentos. Hoje mesmo atendemos uma pessoa, com horário marcado, às 7h. E aí sempre tomamos café juntos”, afirmou.

Ao meio-dia, quando as crianças vão para escola, Leoni diz que cuida da casa, trata dos animais e faz atendimentos pelo WhatsApp. “Sou mãe deles e de muitos. Faço eboá a distância, que é uma oferenda de limpeza e bori, uma oferenda para cabeça. Atendo pessoas do Japão. Morei lá de 2003 a 2007. Aqui o nosso culto é nativo e diário. Até quando temos as nossas festinhas de aniversários temos o canto tradicional yourubá e somos muito felizes com isso”, finalizou.