Porto Murtinho, na fronteira de Mato Grosso do Sul, registrou a 1ª adoção de grupos de irmãos do município no último dia 29 de maio de 2024. A data histórica, foi marcada por duas conquistas raras de se ver: duas novas famílias se formaram após adoções múltiplas, ou seja, quando irmãos são adotados juntos.

As duas famílias não se conhecem, e nem são do mesmo estado. O que elas têm em comum, além de agora serem 5, é o amor incondicional que alguns quilômetros de distância já não separam mais.

Formar uma família sempre foi um sonho para o casal Amanda e Vitório (nomes fictícios), que mora no interior do Parará. No entanto, este desejo ficou de escanteio por uma década, após descobrirem que Vitório era estéril. Na época, eles tinham 1 ano de casados.

“No começo foi um baque, ficamos muito tristes porque o desejo de ter uma família já existia. Quando soubemos da esterilidade do meu marido, nos bateu um sentimento de revolta, não entendíamos o motivo de aquilo estar acontecendo com a gente”, conta Amanda.

Segundo ela, lidar com a realidade foi difícil, principalmente para Vitório, e por isso foram 10 anos tentando amadurecer a ideia de adoção. Em 2020, após muita conversa, eles viram que o desejo de formar uma família era bem maior do que a tristeza do diagnóstico, e decidiram entrar na fila de adoção.

‘A gente não entende, mas tudo tem um motivo’

Paralelo a isso, também em 2020, três irmãos (duas meninas e um menino) eram acolhidos em Porto Murtinho a pedido do Ministério Público Estadual por estarem em situação de risco e vulnerabilidade social. Os pais biológicos eram alcoólatras e, por isso, foram destituídos do poder familiar.

Foram quatro anos de espera até que os caminhos dos cinco se cruzassem, em 2023. Amanda conta que a emoção da ligação informando que eles eram os próximos na fila de adoção jamais será esquecida.

Eles, que já tinham manifestado interesse em adoção múltipla, não pensaram duas vezes quando disseram que os três irmãos aguardavam um lar. Amanda e Vitório sabiam que seria só questão de tempo até os filhos estarem com eles.

“Para gente esses quatro anos de espera foram demorados, a gente ficava na ansiedade. Recebi a ligação do Fórum em outubro do ano passado dizendo que os irmãos se encaixavam no nosso perfil. Foi um misto de sentimento! Ficamos muito felizes. Foram quatro anos deles no abrigo e quatro anos da gente na fila. A gente não entende os planos de Deus, mas tudo tem um motivo, tudo tem a hora certa”, afirma.

Processo de adoção

Amanda conta que o primeiro contato com os filhos foi por meio de videochamada. Dois meses depois, eles, enfim, puderam viajar até Mato Grosso do Sul e conhecer as crianças pessoalmente.

“Ficamos uma semana na cidade. No começo, nós cinco ficamos com receio. Meu marido e eu tínhamos medo de não dar conta. Era tudo novo para gente. Mas, a partir do terceiro dia, tudo ficou mais tranquilo”, lembra.

O processo de adoção foi sentenciado em 29 de maio. Contudo, desde 11 de dezembro, eles já estavam juntos. Agora, as crianças de 4, 5 e 7 anos vivem felizes com seus pais, em um sítio no Paraná, “brincando com os animais da propriedade o dia todo”.

“Muitas pessoas têm o receio e medo de adotar por não saber da origem da criança, como era a família biológica, se tinham algum vício, como viviam… Mas, no fundo, são preocupações e tabus que acabam passando ao ter acesso à criança, que é quando você já cria um vínculo com ela. Você vai educando e encaminhando essa criança com tanto amor, carinho e afeto, que esse medo que impedia de adotar não passa de uma mera bobagem da nossa cabeça. A adoção é um projeto de Deus, pois através dela, hoje tenho a minha família e sou muito feliz e realizada”, finaliza.

Nasce uma família

Pedro e João (nomes fictícios) estão juntos há 9 anos. Mas, foi quando estavam com 6 anos de união que aquele sentimento de aumentar a família ficou mais latente no coração dos dois.

Por diversos motivos, principalmente por falta de condição financeira estável que suportasse a responsabilidade iminente, eles precisaram dedicar tempo para preparação. Buscaram grupos de apoio à adoção, online e presencial, conversaram com outras famílias que já adotaram e assistiram diversos vídeos para compreender um pouco do que é ter uma família por via da adoção.

Em outubro de 2022, o casal decidiu iniciar os processos e foram até o Fórum da cidade em que moram, em São Paulo, para entender tudo o que implicaria e precisaria ser feito ao longo de todo o processo de adoção.

“Fizemos o curso preparatório para pretendentes à adoção de nossa comarca em maio de 2023 e no mês seguinte fomos habilitados. Com a habilitação finalizada já podíamos ter acesso ao Sistema Nacional de Adoção, para ver a questão da fila, compreendendo o próprio sistema e matar nossa curiosidade”, conta Pedro.

As crianças

Voltando um pouco no tempo, em maio de 2016, quando o casal nem avaliava a possibilidade adoção, outro casal, pais de sete filhos, tinha seu poder destituído por negligência e abandono das crianças, que foram acolhidas na Casa Lar, em Porto Murtinho.

Em setembro daquele mesmo ano, até foi determinada a reintegração familiar para que os genitores tivessem uma nova oportunidade de retomar o contato com as crianças. Mas, com o falecimento de dois filhos, os cinco irmãos retornaram para a instituição de acolhimento em março de 2020.

Em 2022, foi determinada a busca do pretendente pelo SNA (Sistema Nacional de Adoção). Sem interessados, os irmãos foram divididos em dois grupos: de um lado as duas irmãs mais velhas, de 17 e 15 anos, e do outro, os três meninos de 7, 9 e 12 anos.

Encontro

O educador explica que durante o curso preparatório eles se depararam com a Busca Ativa, o que corroborava para eles pensarem bem sobre a configuração familiar que buscavam. Ele conta que após o curso, perceberam que poderiam tranquilamente ter uma família maior, aceitando grupos de irmãos.

“Vendo a aba da Busca Ativa, nos deparamos com 3 meninos lindos, sorridentes, e imediatamente ligamos para a equipe técnica que estava nos acompanhando para contar que talvez tínhamos encontrado nossos filhos e pedir auxílio na manifestação de interesse que é necessário fazer. Então, após aconselhamento, fizemos a manifestação no sistema e aguardamos o prazo que o sistema pede, que é de 20 dias. Não sabíamos se ia dar certo ou como eles estariam atualmente, se as fotos fossem antigas. Sabíamos apenas que eles eram de Mato Grosso do Sul”, relata.

O tempo final no prazo ia se aproximando e nada de o casal receber uma devolutiva. Isso só fazia a ansiedade aumentar cada vez mais. Então, no último dia de prazo, a resposta aguardada veio, mas em forma de pergunta: “gostariam de iniciar o processo de aproximação com as crianças?”

“É claro que falamos que sim. A analista judiciária que fez contato conosco nos apresentou a equipe técnica da casa de acolhimento que as crianças estavam alocadas, para que pudéssemos nos conhecer e conhecer os meninos. Esse início de contato foi complexo e delicado e depois entendemos que assim o foi por ter sido o primeiro caso de adoção do município pelo cadastro da Busca Ativa. As dificuldades iniciais foram vencidas, nós fomos apresentados aos meninos e para nossa alegria, eles gostaram da gente e mantivemos o contato por videochamada, fotos e áudios por um mês aproximadamente”, conta Pedro.

Primeira visita

Um mês após o início da convivência virtual, Pedro e João puderam viajar para Porto Murtinho para conhecer os meninos pessoalmente.

“Foi uma semana muito intensa onde não sabíamos muito como agir e dependíamos muito da interpretação da reação deles em relação à gente, e que foi a melhor possível. Percebemos que não poderíamos ficar longe deles por muito tempo porque, sim, eles já eram nossos filhos, e nossos corações implodiram de angústia no retorno”, lembra.

Para a alegria dos cinco, um mês após a primeira visita presencial, as três crianças puderam ir morar com eles.

“Encontrar nossos filhos foi algo que não conseguimos colocar em palavras, por termos percebido que a vida antes deles, apesar de muito boa e importante, podia ter sido mais repleta de alegrias, de sorrisos, de amor, e foi tudo isso e muito mais que eles nos trouxeram. É claro que o início foi conturbado na medida que estamos aprendendo a ser pais, assim como eles estão aprendendo a ser filhos, mas as coisas foram se encaixando de um modo tão bacana, apesar de nem sempre sereno, que nós temos a convicção que não poderia ter sido de outro jeito”, pontua Pedro.

Final feliz

Hoje as crianças estão há 8 meses com Pedro e João, mas para os pais, parecem 8 anos. Agora eles aguardam o cartório de Porto Murtinho concluir as novas certidões de nascimento.

“Somos muito gratos a Deus, à Nossa Senhora Aparecida e a tudo que há de bom no universo. Os desafios foram, são e serão grandes, mas entendemos que o amor que sentimos um pelo outro em nossa família foi, é e sempre será maior e nos ajudará a viver e continuar vivendo”.

Adoção

Como dito na matéria, os três meninos têm duas irmãs, que ainda não tiverem pretendentes à adoção. É possível adotá-las pelo Programa “Nasce uma Família” que pode ser acessado por qualquer interessado pelo link http://aproximandovidas.tjms.jus.br/.

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