Biólogo relata 12 horas de dor após ser atacado por formiga cuja ferroada se assemelha a um tiro em MS

Formiga-bala ferroou acidentalmente professor da UFMS. Dor da ferroada é comparada a uma bala perfurando o corpo e é considerada a picada de inseto mais dolorosa do mundo

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Nome do idioma tupi-guarani, tocandira quer dizer "aquela que fere profundamente" – (Fotos: Paulo Robson de Souza)

Tocandira, formiga-bala, formiga-cabo-verde, tucandeira… ela tem diversos nomes, que mudam de região para região, mas é uma só. Conhecida por ser o inseto com a picada mais dolorosa do mundo, a Paraponera clavata (nome científico) vive em regiões úmidas das Américas Central e do Sul. O Brasil, é claro, está na lista de países onde há ocorrência dessa espécie e um de seus biomas preferidos é o Cerrado, que abrange Mato Grosso do Sul.

“Uma dor terrível, como se uma bala estivesse dentro do corpo”. Esta é a sensação que o veneno da tocandira (Paraponera clavata) provoca em quem leva uma ferroada. Em Campo Grande, um professor da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) sentiu na pele o sofrimento ao ser atacado por três exemplares da espécie ao mesmo tempo.

Ao Jornal Midiamax, ele relata os detalhes do acidente e descreve as horas de dor. “Levei três ferroadas aqui no Cerradinho da UFMS, enquanto pesquisava a formiga. Eu precisei me ajoelhar para fotografar o ninho delas e havia uma entrada [do ninho] na proximidade da minha perna. Fui ferroado na ponta de um dedo da mão, no antebraço direito e em uma das coxas”, recorda o biólogo Paulo Robson de Souza, de 62 anos.

Tocandira é uma formiga que pode medir entre 18 a 25 mm - (Foto: Paulo Robson de Souza) biólogo professor
Tocandira é uma formiga que pode medir entre 18 a 25 mm – (Foto: Paulo Robson de Souza)

Antes do fatídico ataque, o professor de biologia já havia fotografado a tocandira outras vezes, mas, na data em que foi ferroado, afirma ter cometido o erro de sair a campo sozinho. O tempo passou e as ferroadas não deixaram marcas na pele, mas a dor, essa o biólogo jamais vai esquecer.

“Eu já havia lido artigos científicos na internet que falam que a ferroada da Paraponera clavata dura 24 horas. Pode ser verdade, mas vai depender do caso e da pessoa. No meu caso, durou 12 horas. Foi uma dor terrível. É uma dor que fica pulsando, eu acho que tem a ver com batimento cardíaco. Tem hora que eu sinto muito e daqui a pouco começo a sentir fortemente”, relembra.

Por tentativa e erro, o biólogo diz que a dor só aliviou (quase nada) após aplicar gelo nas regiões ferroadas. “No dedo eu tive uma dor muito mais intensa, três vezes maior. E isso tem uma explicação anatômica já que na ponta dos dedos temos várias terminações nervosas. Acredito que, principalmente por isso, eu tive uma dor bem mais forte ali”, comenta.

Segundo Paulo, o ferimento é praticamente invisível. “Você vê uma pintinha vermelha por onde a formiga introduziu o ferrão e esguichou o veneno dentro”, descreve.

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Dor sentida é descrita como “estar andando sobre carvão em chamas com um prego fincado no calcanhar” – (Foto: Paulo Robson de Souza)

Formiga tem a ferroada mais dolorosa do mundo

O nome tocandira tem origem no idioma tupi-guarani e possui variações como tucandeira, tocanguira e outros, que significam “aquela que fere profundamente”. Na Venezuela, inclusive, o inseto é conhecido como “la hormiga de las 24” devido ao tempo que a dor pode durar no corpo da pessoa ferroada.

De acordo com a EOL (Enciclopédia da Vida em português), a tocandira ocupa o primeiro lugar no pódio como a ferroada de inseto mais dolorosa do mundo no “índice de dor Schmidt”, classificado por Justin Schmidt, um renomado entomologista americano.

Em sua tabela de dores provocadas por insetos, que vai de 1.0 a 4.0, a tocandira (ou formiga-bala) foi avaliada com a nota 4.0+, acima da máxima. A dor sentida é descrita como “estar andando sobre carvão em chamas com um prego fincado no calcanhar”.

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A temível Paraponera clavata – (Foto: Paulo Robson de Souza)

Conforme a enciclopédia, além da dor devastadora que pode ser alucinante, o veneno causa retenção de líquidos (edema), aumento da frequência cardíaca (taquicardia) e a evacuação de sangue por meio das fezes.

“Na língua inglesa, ela tem o nome de formiga-bala, porque dizem que a dor dela é como se fosse uma bala de revólver presa dentro do corpo. Ou seja, um objeto de chumbo quente torrando o tecido da gente”, acrescenta o professor da UFMS, Paulo Robson de Souza.

Formiga é usada em ritual

O biólogo afirma que a formiga-bala pode ser encontrada em Campo Grande e em qualquer área do Cerrado bem conservado, inclusive no Cerradinho da UFMS. Ele ainda destaca que a tocandira é a mesma formiga que uma tribo indígena do Xingu, na Amazônia, usa para um ritual de passagem dos garotos adolescentes para a fase adulta: a maturidade é comprovada com a resistência à intensa dor das ferroadas.

“Eles [os indígenas] coletam dezenas de formigas, colocam dentro de uma bolsa feita de palha e o adolescente enfia a mão. Nesse caso, eu acredito que a dor deva durar 24 horas porque são muitas formigas”, ressalta. “Considero essa formiga um ser-vivo maravilhoso, uma joia do cerrado”, diz o professor, que é natural de Vitória da Conquista, na Bahia.

Recomendação aos leitores

Paulo está na UFMS desde setembro de 1987, quando passou para o concurso para disciplinas da biologia em geral. Em 1993, ele mudou de setor e passou a se dedicar à formação de professores no curso de Ciências Biológicas, atual Instituto de Biociências, o Inbio.

Há mais de 20 anos, o biólogo se dedica à divulgação científica e à produção de material didático para adolescentes e crianças. E diante de sua vasta experiência, faz um alerta para aqueles que gostam ou queiram observar formigas como a tocandira na natureza.

“Temos uma máxima na biologia que ninguém sai sozinho para o campo para pesquisar. Eu errei aquele dia quando saí sozinho aquele dia na Universidade. Se eu tivesse com uma pessoa ao meu lado, essa pessoa teria visto as formigas se aproximando do meu corpo enquanto eu fotografava. Eu não cumpri o protocolo de segurança”, finaliza o professor.

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Paulo Robson de Souza – (Foto: Arquivo Pessoal)

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