Novela é apoiada por sul-mato-grossenses após modificar cultura de Mato Grosso do Sul

Novela “Terra e Paixão” rachou Mato Grosso do Sul ao meio ao instaurar, sem querer, um questionamento sobre a cultura local

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Cena aleatória de Terra e Paixão do capítulo desta sexta, com Ramiro sonhando com Kevin vestido de noiva, e a imagem de um tereré tradicional de Mato Grosso do Sul – (Marcos Ermínio, Midiamax e TV Globo, Reprodução)

Reviravolta? Após constranger e causar vergonha alheia em alguns sul-mato-grossenses por mostrar personagens tomando tereré em guampas individuais, a novela “Terra e Paixão”, ambientada em Mato Grosso do Sul, recebeu o apoio de outra parcela de moradores do Estado que revelaram ser condescendentes com o que seria uma “modificação” da cultura local.

De início, ao verem personagens tomando tereré no mesmo ambiente, mas cada um com sua guampa, alguns sul-mato-grossenses se revoltaram e acusaram a novela de estar descaracterizando e modificando os costumes de MS.

No entanto, a forma como o tereré vem sendo mostrado no folhetim também serviu para aqueles que criticam o jeito mais tradicional ganharem voz e se pronunciarem. Encorajadas pela representação da novela, essas pessoas fizeram questão de se posicionar.

“Acho mais higiênico”, “Depois da pandemia, é o jeito certo”, “Aqui em casa a gente só toma assim, sem ficar chupando baba um do outro” e “É assim que todos devem fazer se não querem pegar doenças” foram opiniões a favor do tereré individual de “Terra e Paixão”.

Sem consenso sobre o “novo normal” do tereré?

Desse modo, sem querer, a novela levantou uma discussão que dividiu os sul-mato-grossenses e pode contribuir para a propagação da ideia de mudança em uma das principais tradições de Mato Grosso do Sul.

De um lado, estão os apoiadores da tradição, constrangidos por um discurso que fala em higiene e saúde e diz ser contra a maneira como a cultura secular vem sendo perpetuada. Do outro, adeptos a novos costumes e sem neuras com regras, estão aqueles que apoiam o tereré individual mostrado no folhetim como sendo o ideal.

Sem um consenso a respeito, parece que Mato Grosso do Sul se dividiu ao meio sobre qual seria a melhor forma de tomar tereré nos dias de hoje.

Existe jeito certo de tomar tereré?

A cultura paraguaia difundida em Mato Grosso do Sul ensina o compartilhamento e segue o teor da socialização, fato que é destacado pelo morador Rommel Yatros, crescido e criado na fronteira.

“O tereré nada mais é que água filtrada na erva-mate. Tomar tereré é um evento, uma roda. Tem o que serve e coordena a roda, que gira no sentido horário, e quem acaba de tomar volta a guampa para o servidor e agradece, pois quando faz isso demonstra que está satisfeito e não quer mais. A roda de tereré é onde se discute sobre tudo, inclusive nada, onde se resolve grandes demandas, chora as mágoas, se conquista a pessoa amada. E nesse universo, compartilhar a guampa é selar o compromisso, apertar os laços de amizades. Por isso, quando se insiste em quebrar o espírito, nos manifestamos”, explica.

Cada indivíduo, obviamente, tem o direito de escolha e pode tomar o tereré da forma como bem entender. Contudo, o sul-mato-grossense se mostra um povo defensor da cultura que propaga. O mesmo acontece quando a população vê alguém tomando tereré com guaraná, suco e outros líquidos que não sejam água. Imediatamente, o povo de MS chia, mesmo que esse seja o hábito de outras regiões.

Por isso, o leitor acima resume o sentimento de pertencimento e o que implica em tantas reclamações: “quando quebram o espírito, nos manifestamos”, frisa ele.

Mudança na tradição do tereré?

Em 2020, durante um dos auges da pandemia, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul publicou um texto falando da mudança de hábitos em decorrência da Covid-19.

“Tomar tereré e chimarrão de forma solitária? Mudanças de hábitos? Talvez esse seja o caminho para que o povo não perca o prazer de degustar a bebida, seja ela o tereré ou o chimarrão. O caminho sugerido é que se faça uso dessa tradição com a consciência de novos tempos, não compartilhe o uso das ‘bombas’ (para quem não conhece, é uma espécie de canudo feito de aço). E o apreciador vai ter de optar entre: o social; se deliciar sozinho; e na terceira hipótese, distância de 1,5m, e cada um com a sua cuia e bomba na mão, estranho, né?”, disse o MPMS na época.

No mesmo texto, o Ministério Público Estadual pontuou sobre a mudança na tradição.

“Tradição muda? Muitos hábitos e possivelmente tradições devem mudar a partir da descoberta do novo coronavírus. O narguilé, uma tradição entre os Turcos e Libaneses, e no Brasil mais uma moda, por conta de uma novela das nove. Uma tradição importada e que tem como adeptos em sua maioria os adolescentes, é preocupante. O uso desse ritual também coletivo deve ser levado em conta”.

“O tabaco ou o narguilé é uma escolha, porém, os especialistas não recomendam o uso de nenhum dos dois. Para fumar o narguilé é necessário compartilhar o bocal entre os usuários, esse ritual pode transmitir doenças como herpes, hepatite C, tuberculose e a COVID-19″, problematizou.

Entretanto, três anos depois, a pandemia chegou ao fim. Ao que parece, a Covid-19 deixou lições e mudou os hábitos de muitos, mas, vale lembrar que a situação pandêmica não está mais presente.

O futuro do tereré “higiênico”

Voltando ao tema tereré “higiênico” de “Terra e Paixão”… Como não há mais uma pandemia e a novela não se passa no período em que ela ocorreu, a representação do tereré individual parece equivocada para parte dos sul-mato-grossenses preocupados em como a TV Globo está mostrando a cultura.

O individualismo, no entanto, também destaca a tendência e a mudança de comportamento entre os moradores, que se manifestaram e disseram ser, em boa parte, adeptos. Desse modo, enquanto envergonha alguns, a novela das nove ambientada no Estado pode estar antecipando um comportamento do futuro, ou ainda representando um sul-mato-grossense traumatizado com vírus, mesmo sem saber.

Ao mostrar personagens tomando o tereré higiênico, a direção de “Terra e Paixão” tem uma intenção. Eles foram colocados em cena de tal maneira após alguma decisão ou algum contexto, ainda desconhecido do público.

Na sua opinião, os atores e a equipe global sentem nojo de dividir a mesma bomba, optam por uma suposta higiene enquanto beijam bocas de outros colegas e fumam narguilé compartilhado, ou simplesmente surgem dessa maneira por não saberem que a tradição secular é mais compartilhada do que individualizada?

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