Madalena foi roubada para cuidar de criança em fazenda, mas superou e criou própria família terena
Aos 86 anos, indígena necessita de cuidados, mas, sempre batalhou por direitos e repassou conhecimento aos filhos.
Graziela Rezende –
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Madalena na língua portuguesa e Allunoe na tradição terena. A mulher, que não sabe ao certo quando nasceu, criou seis filhos e é avó e tia. Aos 86 anos, necessita de cuidados a todo instante, por conta do diagnóstico de Alzeihmer e Parkinson, porém, não é esta indígena que muitos conhecem e sim a representante do seu povo. A pessoa que, na década de 80, batalhou pelo primeiro movimento de mulheres indígenas no Brasil e coleciona histórias, como quando foi “roubada” por fazendeiros em Mato Grosso do Sul.
“Minha mãe, Madalena Gomes, sempre nos falou que nasceu nessa época, no tempo das cerimônias do Kipae, a anta que sai para dançar entre as estrelas do céu. Ela sempre nos contou muitas histórias. Ficou orfã quando tinha cerca de dez anos e aí foi levada por fazendeiros, invasores das terras do Warakuake, perto de Aquidauana, para cuidar de uma criança de nome Saulo”, contou o filho, Marcos Terena, de 67 anos.
Conforme Marcos, Madalena é uma sobrevivente. “Na época, ela não sabia falar o português, não conhecia as comidas e passou muita fome. Não conseguia dizer que queria comer e nem o que queria comer. É uma pessoa que coleciona muitas histórias. Hoje ela está no leito de nossa casa e estaria cantando parabéns, não fosse a crueldade da doença”, lamentou.
Mesmo assim, Marcos, que seguiu os mesmos passos e é articulador dos direitos indígenas e produtor do documentário “Indio Velho – Saberes Ancestrais”, disse que a família comemora a data.
“São testemunhos que elas nos contava quando ainda estava consciente e agora não mais. Ela criou ao todo seis filhos, sendo cinco homens e uma mulher. Atualmente eu moro em Brasília. Tive que retornar, inclusive para cuidar da minha mulher, que acabou falecendo de câncer. Mas, minha mãe tá muito bem assistida pela minha irmã, em Campo Grande”, ressaltou.
Segundo o indígena, a família não espera por isso. “Ela está saudável, porém, é uma doença progressiva. Ela só abre o olho, não consegue mais falar, não consegue mais conviver com a gente e talvez até não nos reconheça. É uma doença muito cruel e a gente não esperava por isso. Mas, minha mãe sempre nos ensinou muito e nunca nos deixou perder aquilo que chamamos de ancestralidade”, argumentou.
Madalena tinha outro modelo de vida: descalça, sem roupas e tomava banhos na lagoa
Conforme Terena, o termo inclusive é muito difundido na capital sul-mato-grossense e também em Dourados, na região sul do Estado. “Minha mãe sempre nos ensinou a repassar o reconhecimento e isso é uma garantia de que eles vão perdurar para sempre. Ela morava, quando mais nova, dentro de uma aldeia na região de Taunay, em Aquidauana, que pertencia aos Queiroz e foi retomada recentemente”, comentou.
Nas lembranças, Madalena contava que tinha outro modelo de vida. “Ela andava descalço, não tinha roupa e andava pelo mato para procurar ervas medicinais. Tomava banho na lagoa e tudo isto são coisas que eu não vivi, porque estava construindo minha carreira profissional, como piloto de aeronaves. Fiquei fora de Mato Grosso do Sul e vim para Brasília, com a intenção de construir o movimento indígena para defesa dos meus próprios direitos, mas, sempre tendo como referência a tradução que chamamos de Xumono”, finalizou.
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