Covid-19 na Capital. Sem conseguir dizer adeus ao pai, Regina não acredita até hoje que essa foi a causa do falecimento.

“Ele estava com complicações no rim, no coração, mas depois que ele morreu falaram que estava com suspeita de Covid, aí ficou registrado como Covid, não teve velório, nada. Na hora falaram que não tinham feito o exame, depois apareceu um exame. E aí meu pai foi enterrado sem nada”, lamenta a mulher.

Edison e a filha Regina (Fotos: Arquivo Pessoal)
Edison e a filha Regina (Fotos: Arquivo Pessoal)

Desconfiada e ainda sem conseguir digerir o desfecho, Regina conta ao Jornal Midiamax os detalhes que a fazem duvidar do diagnóstico. “Eu ficava o tempo todo com meu pai, eu que cuidava dele e perguntava sempre: ‘É Covid?’, até na hora que meu pai morreu eu perguntei ‘Foi Covid?’. O médico falou: ‘Não, seu pai não tem Covid, o rim dele tava parando já, bem fraquinho'”.

Na época, os familiares não conseguiram UTI para Edison justamente porque ele não estava infectado pelo coronavírus. “O médico me deu um papel e disse: ‘Faz o seguinte, tenta conseguir uma UTI‘. No documento estava escrito tudo que meu pai tinha: problema de coração, de rim… em nenhum lugar estava escrito que era Covid”, afirma.

“Aí peguei aquele papel e falaram pra mim: ‘Nossa, se fosse Covid a gente ainda tentava conseguir levar ele para o Regional, mas como não é, tá difícil'”, ouviu do especialista. No dia seguinte, veio a notícia. “Infelizmente, nós fizemos de tudo, seu pai passou muito mal de madrugada e veio a falecer”, disse o doutor, segundo Regina. “Eu falei ‘O quê?’, sentei e perguntei de novo pra ele ‘Doutor, foi Covid?’, ‘Não, seu pai não tava com Covid, se você quiser ver ele, pode ir lá'”, conta ela sobre a orientação que recebeu.

Regina então foi e constatou o falecimento de Edison e, cerca de 20 minutos depois, foi chamada novamente pela equipe. “O médico me disse: ‘Olha, tem um protocolo e a gente tem que colocar que é Covid’, ‘Mas como? Se o teste não foi feito nele, não tinha teste e agora apareceu um teste?'”, questionou ela na hora.

Edison faleceu aos 77 anos (Foto: Arquivo Pessoal)
Edison faleceu aos 77 anos (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Bar era a vida de Edison

De acordo com a filha, a lanchonete sempre foi a vida de Edison. Dois anos antes do falecimento, o comerciante sofreu um AVC e, depois disso, precisou ficar em uma cadeira de rodas para se locomover. Mesmo assim, passava o dia inteiro no estabelecimento que tocou por uma vida.

Regina e o esposo cuidam do negócio há seis anos e quando assumiram o comando o pai dela já não trabalhava mais. “Não queria deixar minha mãe alugar para outra pessoa porque como meu pai ia ficar sem lá?”, conta ao MidiaMAIS.

“Eu sinto a presença do meu pai ali. No cemitério, eu fui agora, só depois de quase cinco meses consegui ir lá, mas eu não sinto que meu pai está lá. Porque a gente não viu ele ser enterrado, só vi um caixão, que deixaram bem distante. Então, eu não sinto ele lá”, afirma a mulher.

Lápide de Edison (Foto: Arquivo Pessoal)
Lápide de Edison (Foto: Arquivo Pessoal)

Edison partiu em 26 de março de 2021 e em abril ela decidiu fazer a homenagem para eternizá-lo em seu local preferido. “Ele tá pra sempre em nossos corações. Meu pai era uma pessoa muito querida. Um dos primeiros moradores da , aqui, todo mundo lembra e conhece ele, até quem já saiu e não mora mais”, comenta.

Pai de seis filhos, todos com a mãe de Regina, Edison deixou um legado registrado no muro do estabelecimento onde passou boa parte da vida e permaneceu até quando não podia mais. “O senhor foi o melhor, meu pai, e jamais vou esquecer tudo que nos ensinou e o exemplo de homem e honesto que foi”, diz a frase gravada na parede. 

A pintura foi feita por Carlitos, pintor muito conhecido das Moreninhas; foi ideia dele pintar o rosto de Edison no local. A obra ainda acompanha outros elementos importantes da devoção do comerciante: Nossa Senhora Aparecida e o Palmeiras. 

Homenagem exposta para todos verem e lembrarem (Foto: Arquivo Pessoal)
Homenagem exposta para todos verem e lembrarem (Foto: Arquivo Pessoal)

Seis meses se passaram e Regina conta que a ficha ainda não caiu. “Cuidei dele, tava junto todo o tempo. Meu pai não morreu de Covid, ele já estava bem debilitado, eu não acredito que ele morreu disso”, diz ela ao questionar o fato de poder ter sido acompanhante, entrar e sair do , se o pai estava supostamente infectado.

A lápide no cemitério ainda não representa nada. A forma trágica como perdeu e precisou abortar o contato com uma das pessoas mais importantes de sua vida foi fator culminante para a simbólica gravura no local preferido do pai. “Eu sinto ele vivo ali, parece que nesse lugar ele está mais perto de mim, cuidando de nós. Já fazia muito tempo que ele não trabalhava mais na lanchonete, mas ele chegava cedo e só ia embora de noite, ficava sempre ali”, finaliza a filha.