Grupos tradicionalmente envolvidos em tráfico de drogas, armas e humano estão passando a cometer crimes ambientais, disse nesta quinta-feira a Interpol (agência de polícia internacional).

“Vemos mais e mais redes de crime organizado agindo no comércio (ilegal) de vida selvagem”, afirmou Davyth Stewart, oficial da Interpol.

Com isso, especialistas de meio ambiente dizem acreditar que conservacionistas terão de voltar seus esforços ao combate do crime organizado.

O debate acontece em evento da Sociedade Zoológica de Londres, em um encontro com representantes de 40 países sobre como combater o comércio ilegal de animais selvagens. O objetivo é criar uma declaração internacional com medidas para lidar com o problema.

Para conservacionistas, a caça irregular chegou a um ponto crítico: dezenas de milhares de rinocerontes, elefantes, tigres e outros animais têm sido mortos para alimentar um mercado que movimenta estimados US$ 19 bilhões por ano, segundo a ONG WWF.

Baixo risco, altos lucros

Segundo Stewart, muitos criminosos veem esse setor como sendo de poucos riscos e altos lucros.

“O risco de apreensão é baixo – é uma pena, mas as forças de segurança não investem em combate a crimes ambientais os mesmos recursos que investem (no combate a) outros crimes”, afirmou.

“Mesmo na Justiça, as penas são muito menores. No ano passado, na Irlanda, vimos duas pessoas sendo presas por contrabandear chifres de rinocerontes que valiam meio milhão de euros. E elas foram multadas em apenas 500 euros.”

Para John Cellar, ex-chefe de segurança da Convenção de Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas (Cites, em inglês), o esforço de ambientalistas deve mudar seu foco: do atual, mais voltado à conservação, para a questão da criminalidade.

Ele afirmou, também, que as mesmas táticas usadas para combater o tráfico de drogas e armas podem ser aplicadas no controle do tráfico de animais.

“Mas as pessoas (responsáveis por isso) não estão na sala (debatendo o tema) – os juízes, os agentes de alfândega, a polícia.”

Cadeias

O comércio ilegal de animais também tem, segundo especialistas, uma elaborada cadeia de suprimento: caçadores ilegais encontram e matam os animais, intermediadores movem o produto pelo país, exportadores o transportam através de fronteiras internacionais e vendedores o entregam ao consumidor final.

E o motor dessa cadeia é a corrupção, afirmou Naftali Honig, de um projeto congolês de proteção à fauna.

“Estamos diante de autoridades e negociadores cada vez mais corruptos”, disse.

Entre as muitas derrotas, porém, há algumas vitórias.

No Quênia, foi aprovada uma nova Lei de Gerenciamento e Conservação da Natureza Selvagem, o que significa que traficantes condenados podem pegar penas mais duras.

E avanços forenses têm ajudado cientistas a identificar os autores de caças ilegais interceptadas pela polícia.

No entanto, muitos conservacionistas dizem que o principal avanço teria que vir do lado da demanda – ou seja, as pessoas deixarem de comprar produtos da caça ilegal.

“O principal desafio atual é que disparou a demanda por produtos de vida selvagem”, afirmou John Robinson, diretor da Wildlife Conservation Society. “(O crescimento) decorre da maior prosperidade no extremo leste (asiático), sobretudo na China.”

Chifres de rinoceronte são vendidos como medicamento – anunciados como um remédio que cura qualquer coisa, apesar de serem feitos de queratina, a mesma substância que forma nossos cabelos e unhas.

Outras partes de animais, como couro de tigre ou presa de elefante, são compradas como símbolo de status.

“É preciso fazer com que as pessoas saibam que o marfim, por exemplo, vem de animais vivos que têm de morrer para que o material seja extraído. E isso não é plenamente entendido em partes do mundo”, agregou Robinson. “Acredito que, se as pessoas entenderem as questões (envolvidas), haverá mudanças significativas.”