Polêmica PEC 37 limita poderes do Ministério Público e é alvo de críticas

Às vésperas de entrar na pauta de votação da Câmara dos Deputados, a polêmica Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37 parece longe de alcançar um consenso. Defensores do projeto alegam que ele é indispensável para melhorar o andamento das investigações criminais. Para os críticos, a proposta está sendo tratada de forma apressada e poderá dificultar […]

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Às vésperas de entrar na pauta de votação da Câmara dos Deputados, a polêmica Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37 parece longe de alcançar um consenso. Defensores do projeto alegam que ele é indispensável para melhorar o andamento das investigações criminais. Para os críticos, a proposta está sendo tratada de forma apressada e poderá dificultar a elucidação de certos crimes, podendo até mesmo levar à impunidade.

Apresentada pelo deputado e delegado Lourival Mendes (PTdoB-MA), a PEC 37 prevê a exclusividade das investigações criminais às Polícias Federal e Civil. O texto pede a inclusão de um parágrafo ao artigo 144 da Constituição Federal que determina a competência exclusiva sobre as investigações às instituições policiais – o que não ocorre atualmente. Exceções seriam feitas aos órgãos para os quais a Constituição já prevê poder investigatório, como as comissões parlamentares.

Aprovada, portanto, a proposta limitará a atuação investigativa do Ministério Público e poderá acarretar mudanças fundamentais nos atuais procedimentos de elucidação de crimes. Hoje, além de apenas acompanhar, o MP também pode realizar investigações, como em casos de crimes de corrupção ou que envolvam a participação de policiais.

Entre as atividades do MP estão a fiscalização da aplicação das leis e o zelo pelos direitos coletivos e sociais. Além disso, o MP é o responsável por propor ações no judiciário, após a polícia ou mesmo os promotores reunirem provas que fundamentem a ação.

Para o deputado Alessandro Molon (PT/RJ), a proposta está sendo tratada de forma “leviana” pela Câmara. “É um tema de extrema gravidade, com consequências enormes para apuração de crimes no Brasil. Por isso, a proposta merecia uma atenção maior, um debate maior, um estudo mais aprofundado”, afirma o deputado, que participou das duas comissões nas quais a PEC já foi aprovada.

Molon votou contra a proposta, mas afirma que ela tem grandes chances de passar pelas duas votações na Câmara. “Lamentavelmente eu acho que ela corre o risco de ser aprovada. Sinto que há uma grande quantidade de parlamentares da casa favorável à proposta”, diz o deputado e professor de direito na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).

PEC da Impunidade X PEC da Legalidade

Segundo o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (Anpr), Alexandre Camanho de Assis, há uma certa pressão para a aprovação da PEC por parte de deputados que estão sendo investigados. “Sempre tem aquela bancada de ressentidos que, em algum momento, teve sua vida investigada pelo Ministério Público, não necessariamente por uma questão criminal, mas também por uma questão eleitoral”, conta.

Assis ressalta que a atual Constituição não limita o poder investigatório do MP. “As operações criminais de sucesso no Brasil sempre foram apuradas em conjunto pelo MP e pela polícia”, garante o promotor.

O promotor Rodrigo Chemim Guimarães, do Ministério Público do Paraná, critica duramente a PEC 37. “Está em jogo acabar com a única instituição com real e efetiva independência para investigar os crimes da elite, da classe política e da classe que tem poder econômico no Brasil. Quando o MP não puder mais investigar, essa gente não vai ser mais alcançada.”

Segundo Guimarães, há crimes que não costumam ser investigados pela polícia, pois envolvem autoridades ou por terem sido cometidos por policiais. “Se acabarem com o poder de investigação do MP, vamos ficar à mercê de um órgão altamente corrompido e que depende da vontade política. Esse é um modelo de investigação falho e quem perde com isso é a sociedade”, diz Guimarães.

Os defensores da PEC argumentam que a regularização é necessária, pois investigações conduzidas somente pelo MP abrem margem para que elas sejam questionadas na Justiça, o que pode levar à impunidade.

Na opinião de Marcos Leôncio Sousa Ribeiro, presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (Andp), em investigações paralelas podem ser cometidos abusos. “Quando duas instituições investigam em paralelo, sem cooperação, ambas saem perdendo, pois não compartilham informações e a descoberta da verdade fica mais difícil”, afirma Ribeiro.

Retrocesso para a democracia

Para especialistas ouvidos pela DW Brasil, a aprovação da PEC pode representar um retrocesso na democracia brasileira. “A PEC 37 implica uma limitação, eu diria numa proibição do poder investigatório do MP, o que na minha maneira de ver acarreta um problema para o sucesso das investigações”, afirma o especialista em Direito Constitucional da USP Rubens Beçak.

Para Beçak, os defensores da proposta entendem que o poder de investigação é exclusivo da polícia. “O que não quer dizer que outras instituições que têm toda a possibilidade de amparo legal para fazê-lo não possam também fazê-lo. Eu entendo que aquilo que excede não atrapalha, ou seja, uma investigação poder ser feita pela Polícia Federal e pelo MP, alternadamente ou cumulativamente”, argumenta.

O professor de direito público Mamede Said Maia Filho, da Universidade de Brasília (UnB), afirma que essa questão é ambígua na Constituição, e por isso ocorre essa discussão. “Eu não vejo por que dar exclusividade à polícia para cumprir esse papel, pois isso permite que haja uma investigação mais isenta. O poder que o MP tem de iniciar o processo investigatório vem a favor da sociedade”, defende Filho.

Aprovada na CCJ

Para ser aprovada na Câmara dos Deputados, a Proposta de Emenda Constitucional deve passar por dois turnos e receber os votos de três quintos dos deputados, ou seja, 308. Se aprovada, a proposta vai para a votação no Senado.

A PEC 37 deve entrar na pauta de votação da Câmara em junho. A medida já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados – da qual fazem parte políticos envolvidos em grandes escândalos de corrupção, como Paulo Maluf (PP/SP), Eduardo Cunha (PMDB/RJ) e João Magalhães (PMDB/MG) – e também por uma Comissão Especial.

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