Candidatos no Chile têm passado marcado por ditadura

Há exatos quarenta anos após o golpe militar que marcou a história do Chile, três dos nove candidatos à Presidência do país são filhos de personagens ligados diretamente ao período sombrio e violento da ditadura. Adversários na eleição, cujo primeiro turno será no dia 17 de novembro, a ex-presidente e candidata da oposição Michelle Bachelet, […]

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Há exatos quarenta anos após o golpe militar que marcou a história do Chile, três dos nove candidatos à Presidência do país são filhos de personagens ligados diretamente ao período sombrio e violento da ditadura.

Adversários na eleição, cujo primeiro turno será no dia 17 de novembro, a ex-presidente e candidata da oposição Michelle Bachelet, a candidata do governo, Evelyn Matthei, e o também opositor Marco Enríquez-Ominami, também representam, de certa forma, a realidade política e ideológica de um país que continua dividido.

Os pais de Bachelet e de Matthei eram amigos e generais na Força Aérea chilena até pouco antes do golpe de 1973, mas estiveram em lados opostos durante a ditadura militar.

O pai de Bachelet, Alberto Bachelet, foi preso, torturado e morreu na prisão. Ele era ligado ao ex-presidente Salvador Allende, derrubado pelos militares que tomaram o Palácio presidencial de La Moneda. O pai de Matthei, Fernando Jorge Matthei, foi chefe da Força Aérea na era Pinochet — que comandou o país de 1973 e 1990.

As duas presidenciáveis se conhecem desde a infância, quando os pais ainda não eram adversários no regime.

Por sua vez, o pai de Ominami, Miguel Enríquez, que era médico e integrante do grupo guerrilheiro Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR), foi morto em um tiroteio com a polícia de Pinochet, a DINA.

Ominani era bebê quando foi levado pela mãe para o exílio em Paris e acabou adotando esse último sobrenome em homenagem ao padrasto que o educou. Ominami chegou a ser aliado político de Bachelet, mas agora são adversários.

DivergênciasOminami, que aparece em quarto nas pesquisas de opinião, tentou tirar proveito da ligação com o passado das principais candidatas, Bachelet e Matthei, para tentar se apresentar como um candidato que “olha para a frente”.

Durante o último debate presidencial antes do primeiro turno, Ominami, de 40 anos, disse aos eleitores: “Se vocês votarem em Bachelet e em Matthei, a discussão será voltada para o que ocorreu na ditadura. Ou seja, olhando para o retrovisor. Apoio a questão dos direitos humanos, mas o Chile precisa olhar pra frente”.

Mas para o analista político chileno Guillermo Holzmann, professor de ciências políticas na Universidade de Valparaiso, o fato de serem filhas de personagens de peso naquele período do Chile, não deverá influenciar o voto dos chilenos.

“A cidadania chilena reconhece a trajetória das duas, mas não se sente motivada a votar por elas por causa do passado. Os chilenos entendem que elas hoje possuem trabalho e identidade próprias nas quais a cidadania percebe virtudes e debilidades.”

“Além disso”, diz o analista, “nenhuma delas usa a história como motivo central de seus discursos e propostas”. “O que influencia é a personalidade e o estilo de liderança de cada uma”.

Visões opostasMatthei é a candidata da frente chamada Alianza, que reúne a UDI (União Democrata Independente) e Renovação Nacional (RN). Bachelet, socialista, é candidata da frente Nueva Mayoria, que reúne integrantes da Concertación – agremiação politica de centro-esquerda que governou o país durante vinte anos após o fim do regime de Pinochet e do retorno da democracia, em 1990.

O último debate pela TV serviu para expor as visões opostas das candidatas, refletindo, de certa forma, as diferenças ideológicas que colocaram seus pais em lados opostos durante o regime militar.

Bachelet, que lidera as pesquisas de opinião, defendeu “educação gratuita para todos pela desigualdade social”. Ao que Matthei retrucou: “Educação gratuita significará uma conta bilionária para o Estado”.

Outra diferença está nas propostas sobre como lidar com os protestos de rua no país, em particular com os chamados “mascarados”, de atuação semelhante a dos black blocs nas manifestações recentes no Brasil.

Matthei quer uma nova lei específica para tratar do assunto e punir atos de violência cometidos por manifestantes. Bachelet acha que a questão “não pode ser resolvida com leis mais duras”.

Caminhos diferentes

Apesar de terem se conhecido na infância, Bachelet, uma médica de 62 anos, e Matthei, economista e ex-ministra do Trabalho de 59 anos, se distanciaram a partir da ditadura.

“Apesar de as duas compartilharem uma história comum em termos de suas famílias e de terem se conhecido ainda pequenas, os caminhos ideológicos e político que escolheram foram diferentes. E elas se afastaram já na etapa da pré-adolescência”, disse Holzmann.

Bachelet foi exilada durante a ditadura e, quando retornou ao país, destacou-se como líder política, ministra da Saúde e da Defesa e se tornou a primeira mulher presidente do Chile.

Matthei estudou economia em Londres, é integrante do partido de direita UDI, e foi ministra do Trabalho no atual governo do presidente Sebastián Piñera.

O terceiro candidato na disputa eleitoral, segundo as pesquisas de opinião, Franco Parisi, que foi a surpresa na campanha, também é filho de militar e estudou em colégio militar durante a ditadura.

O fato não escapou aos jornalistas que participaram do debate da semana passada. “No colégio militar não nos ensinavam nada sobre o que ocorreu”, disse.

No mesmo encontro quando perguntada sobre o que achava de Pinochet, Matthei respondeu: “Ele fez coisas boas e ruins. Direitos humanos ruim, claro, mas fez muito bem para a economia do país”.

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