Jovem de 19 anos vive com o marido na aldeia Arroyo Corá, palco de recentes ataques aos índios que ocuparam fazendas instaladas em terras de Paranhos declaradas indígenas pela União.

No meio do conflito fundiário que coloca em lados opostos brancos e índios de Mato Grosso do Sul, um romance une as duas raças em Paranhos, a 477 quilômetros de Campo Grande. Claudineia Luciane Denadai, de 19 anos de idade, branca, vive com o marido Inácio Gonçalves, de 31 anos, índio, na aldeia Arroyo Corá.

Declarada terra indígena desde 2009, a área foi palco de recentes ataques contra os guarani-kaiowá que decidiram ocupar as fazendas instaladas no local.

Caminhando junto com as índias de Arroyo Corá, apenas a cor da pele diferencia Claudineia das outras mulheres. Ela carrega o filho mameluco com a mesma técnica das guarani e conversa animadamente com as amigas enquanto anda longas distâncias dentro da tekohá, ou ‘lugar onde se vive’, no idioma nativo.

A jovem mora há um ano dentro da aldeia. Ela conta que precisou lutar na justiça e falar com psicólogos para ser autorizada a viver ao lado do homem por quem se diz apaixonada.

“Eu conheci meu marido faz tempo, mas tive que esperar ficar maior de idade, e esperar uma autorização da juíza para morar aqui com ele. É uma vida difícil, mas estou feliz aqui”, diz.

O pai de Claudineia é de São Paulo, e a família da mãe dela é de Paranhos mesmo. Segundo ela, no começo o envolvimento com um índio não foi bem aceito em casa, mas não por questões raciais. “Sempre falavam que eu estava louca de querer viver assim como a gente vive aqui na aldeia, mas a diferença de idade era a maior preocupação”, analisa.

“Aqui na aldeia não tem água encanada, não tem energia elétrica, e a gente faz mais coisas do que na cidade. Mesmo assim, eu acho muito gostoso. É bom porque aqui ficamos todos assim, juntos”, diz apontando para o grupo de guarani que conversava sobre os rumos da ‘retomada’ que haviam realizado.

‘Retomada’ é como os índios de Mato Grosso do Sul estão chamando as ocupações de fazendas que estão instaladas sobre as terras declaradas indígenas pelo Governo Federal. Para os fazendeiros, que conseguiram manter a posse das áreas com liminar judicial, os movimentos são invasões criminosas.

Apesar de bem informada com relação à situação fundiária como todos os índios da aldeia, a branca prefere não entrar em detalhes sobre a questão. Para ela, o conflito só tornou-se motivo de preocupação quando o marido ficou na linha de tiros disparados por pistoleiros contra os guarani na última retomada de Arroyo Corá, em 10 de agosto.

“Foi horrível. Deu muito medo, porque a gente ficou escondida lá do outro lado e nossos maridos estavam aqui. A gente escutava os barulhos dos tiros e dava um aperto no coração, sem saber se tinham matado alguém”, relata apertando o bebê no colo.

Questionada sobre os estereótipos comuns na região com relação aos índios, Claudineia sorri, com trejeito comum às mulheres guarani.

“Quando ficam com raiva os fazendeiros falam umas coisas feias mesmo, mas não tem nada disso. Aqui eu vivo igual em qualquer lugar onde tem pessoas. Tem gente de tudo jeito em qualquer lugar. Mas uma coisa que eu percebo é que aqui todo mundo é mais unido. Nunca tive problema com ninguém. Me tratam muito bem. Não tem problemas como fofocas, por exemplo”, explica.

Segundo a jovem esposa branca, o marido Inácio é carinhoso e cuidadoso. “Eu gosto dele porque vejo coisas boas nele e isso não tem nada a ver com ser índio ou não”, resume.

Claudineia conta que, mesmo sem entender o idioma guarani, nunca se sente excluída. “Sempre tem alguém que me explica o que estão falando, e eu já estou entendendo alguma coisa”, diz.

O marido, após pintar as bochechas do bebê e preparar a família para uma fotografia, explica que, ao se casar com um índio, a mulher se torna parte da aldeia com os mesmos direitos e deveres das demais mulheres. “Não tem diferença. Se uma mulher branca casa com um índio, pode vir morar aqui dentro”, conta.

Porém, no caso contrário, quando um branco se casa com uma índia, a regra é diferente. A mulher precisa deixar a aldeia. “É porque os costumes são outros, dai não dá certo e fica melhor a mulher acompanhar o marido branco fora da aldeia”, argumenta o esposo de Claudineia.