As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) afirmaram que não irão se desmobilizar, mesmo após a morte de seu líder, Alfonso Cano, anunciada neste sábado. No comunicado publicado no site de sua agência de notícias Anncol, as Farc afirmaram que “a queda do camarada Cano simboliza a resistência do povo colombiano”. E enfatizaram: “A paz na Colômbia não nascerá de nenhuma desmobilização guerrilheira, mas sim da abolição definitiva das causas que fizeram surgir a revolta.”

Analistas ouvidos pela BBC Brasil avaliam que a declaração das Farc deixa claro que a guerra ainda é viável para o grupo e que, para a guerrilha, a desmobilização vai além da “mera” entrega de armas. “Tanto o governo quanto as Farc têm condições de continuar em guerra. Do contrário já teriam buscado negociar sem combate, com diálogo. A guerrilha sofreu baixas importantes, mas tem estrutura militar, recursos e estratégias para seguir com mudanças no comando”, destaca o professor de ciência política da Universidade Pontifícia Javeriana, Pedro Valenzuela.

Polarização
O analista em conflitos e paz Victor de Currea Lugo disse à BBC Brasil que do ponto de vista da negociação pela paz, o problema central é a intolerância presente nas duas partes do conflito.

“A Colômbia é um país muito polarizado. O governo fala em entrega de armas e diz que as Farc chegaram ao seu ponto de inflexão. A guerrilha, por sua vez, não parece se ver assim. Ao contrário, eles mantêm o mesmo discurso combativo de antes e não apresentam pontos de diálogo.”

Lugo ressalta que uma questão-chave é a reforma agrária. “As Farc são um movimento agrário. Eles querem a redistribuição de terras e vão querer sempre. Se o estado não considerar esse ponto, não haverá abertura por parte do grupo.”

Garantias
Outro fator apontado por Valenzuela é a falta de segurança que as Farc podem enfrentar caso se desmobilize, porque não há garantias jurídicas nem políticas que o grupo não possa sofrer ações de extermínio caso se reintegrem à sociedade. “Nos anos 80 e 90, vimos na Colômbia o extermínio por paramilitares dos integrantes da União Patriótica (partido ligado às Farc), logo após um processo de negociação de paz. Por isso uma coisa é o estado convidar à reintegração, outra coisa é oferecer garantias”, alerta.

Valenzuela reforça que a presença forte de grupos paramilitares no país é um entrave a reintegração das Farc. “O paramilitarismo de extrema-direita é a outra face do radicalismo colombiano. O país tem que equilibrar essas forças antagônicas se quiser estabelecer a paz.”

Novo líder
Com a morte de Cano, o secretariado das Farc – que é composto por sete membros permanentes e dois suplentes – terá que decidir internamente por um nome que tenha o peso dos líderes anteriores.

Segundo especulações de analistas locais, há dois nomes mais credenciados para assumir o lugar de Cano, Timochenko (Rodrigo Londoño) ou Iván Marquez (Luciano Marín Arango). Muitos acreditam que Iván Marquez seja um forte candidato. Refugiado na Serrania del Perijá, na divisa entre Colômbia e Venezuela, Marquez era amigo de Cano e tem a experiência de 34 anos de guerrilha. Ele tem muita afinidade ideológica com os antigos líderes do movimento e já participou de processos de diálogo pela paz anteriormente.

O outro nome entre os mais cotados, Timochenko é o mais antigo membro do secretariado das Farc. Ele é considerado por autoridades colombianas como o grande estrategista militar do grupo. Segundo dados encontrados no computador do comandante Raúl Reyes (morto pelo exército colombiano em 2008), ele teria atuado como uma espécie de embaixador das Farc e tem uma rede de contatos no Brasil e Venezuela.