A prisão preventiva do governador José Roberto Arruda – aprovada pela maioria arrasadora da Corte Especial do Superior Tribunal Superior de Justiça e confirmada pela decisão do ministro Marco Aurélio de sexta-feira – e o pedido de intervenção federal no Distrito Federal, feito pelo procurador-geral da República, surpreenderam os ministros do Supremo Tribunal Federal, que estão para julgar ação de inconstitucionalidade do chefe do Ministério Público destinada a provocar a revisão, pelo STF, da jurisprudência dominante de que os governadores só podem ser processados por crimes comuns, pelo STJ, depois de autorização das assembléias legislativas.

Tal revisão é admitida por integrantes do Supremo, preocupados com as dimensões que tomou o escândalo do “Mensalão do GDF”. Mas, até agora, o único a tornar pública sua posição favorável a essa revisão foi o ministro Marco Aurélio, para quem a previsão de tal licença nas constituições estaduais e na Lei Orgânica do Distrito Federal “resulta em interferência indevida de um poder em outro”, já que as assembléias e a Câmara Legislativa da capital federal passam a “limitar a atuação judicante de órgãos federais – o Ministério Público e o STJ”. Este parece ser também o entendimento de pelo menos dois outros integrantes do Supremo, Cármen Lúcia e Celso de Mello, com base em votos proferidos em julgamentos de causas similares.

O entendimento majoritário em sentido contrário do STF – consolidado antes da Emenda Constitucional nº 35/01, que aboliu a necessária licença prévia do Legislativo para que fossem processados deputados federais e senadores – funda-se, igualmente, no respeito à independência dos poderes e na prevalência do princípio federativo, fortalecido pelo artigo 18 da Carta, que consagrou a autonomia do Distrito Federal, no mesmo nível da dos estados.

A controvérsia vai ser resolvida pelo pleno do STF, no julgamento da ação de inconstitucionalidade ajuizada, em dezembro, pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, para derrubar o artigo 60 da Lei Orgânica do DF, que prevê, por “simetria” com as constituições estaduais, a necessidade de autorização de dois terços da Câmara Legislativa para a instauração de processo penal contra o governador, o vice-governador e secretários de governo.