OAB nacional criticou decisão do juiz Odilon de Oliveira, que permitiu gravação de diálogo envolvendo traficantes e seus advogados

O MPF (Ministério Público Federal), por meio de nota divulgada na sexta-feira pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão da Procuradoria Geral da República, manifestou-se favorável a medida aplicada pelo juiz federal em Mato Grosso do Sul, Odilon de Oliveira, que autorizou a gravação e filmagem de conversas mantidas entre advogados e presos no parlatório da penitenciária federal de Campo Grande.

No comunicado, assinado por seis procuradores da República, eles afirmam que “advogados suspeitos de praticar crimes não estão imunes a interceptações ambientais autorizadas por Juiz Federal, em decisão fundamentada em indícios de materialidade e de autoria, que só pode ser revogada por outra decisão judicial”.

A decisão do magistrado permitiu o registro de conversas que envolveram Fernandinho Beira-Mar, um dos mais famosos traficantes do Brasil e Juan Carlos Ramirez Abadia, megatraficante colombiano, que cumpre pena hoje nos EUA (Estados Unidos da América).

A determinação de Odilon de Oliveira foi duramente criticada pelo comando nacional do OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). O presidente da entidade, Ophir Cavalcante, declarou a imprensa nacional que “esse tipo de ilegalidade [escutas] contraria o estado de direito democrático”, criticou.

Eis o comunicado

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA

2ª CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO

NOTA SOBRE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL EM PENITENCIÁRIA FEDERAL

Recente crítica a decisão do Judiciário Federal em Mato Grosso do Sul, que autorizou gravação e filmagem de conversas entre determinados presos e determinados advogados no parlatório da penitenciária federal de Campo Grande, leva a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, incumbida de exercer a coordenação, integração e revisão dos atos do Ministério Público Federal na matéria criminal e no controle externo da atividade policial, a declarar:

1) que ninguém está, em nosso país, acima da aplicação da lei penal. Este é um princípio essencial de todo estado democrático e de direito, como o brasileiro. Advogados suspeitos de praticar crimes não estão imunes a interceptações ambientais autorizadas por Juiz Federal, em decisão fundamentada em indícios de materialidade e de autoria, que só pode ser revogada por outra decisão judicial.

2) O Ministério Público Federal no Mato Grosso do Sul tem zelado, nos exatos limites autorizados pela lei, para que ninguém seja excluído da aplicação da lei penal. Tem defendido o devido processo legal, a ordem jurídica e o regime democrático. No desempenho de suas funções, tem requerido e apoiado medidas judiciais para investigar práticas criminosas, inclusive no interior de estabelecimentos prisionais, nos exatos limites autorizados pela lei, submetendo seus atos ao escrutínio próprio da revisão judicial.

3) Não há imunidade individual garantida em lei a monitoramento ambiental autorizado pelo Poder Judiciário, por meio de gravações de áudio e vídeo, a advogados que são suspeitos de praticarem crimes em conjunto e em benefício de seus clientes que estão encarcerados em penitenciárias federais.

4) Diante de indícios de crime, a lei penal autoriza ordem judicial para gravação de conversas de suspeitos de praticá-lo. Não há proibição legal de gravação em parlatório de estabelecimento prisional, nem mesmo nos de segurança máxima, que abrigam 2a Câmara de Coordenação e Revisão integrantes de organizações criminosas de notória periculosidade, capacidade de articulação e elevada disponibilidade financeira.

5) O reexame da legalidade da ordem judicial de monitoramento ambiental, em caso concreto, deve ser feito por meio de recurso judicial próprio, a ser julgado pelo órgão competente do Poder Judiciário, à luz dos elementos contidos no processo. Não há ilegalidade ou inconstitucionalidade em abstrato deste tipo de autorização judicial.

6) O deslocamento deste debate para fora dos autos do processo não interessa à causa da justiça, nem à proteção de direitos humanos. Fora dos autos, as informações serão sempre limitadas ao que é possível divulgar em certo momento, nos termos da Súmula Vinculante n. 14 do STF. É que o devido processo legal impede a divulgação de dados sigilosos da investigação e impede a exposição da intimidade dos investigados ao público. O momento propício para divulgar todos os fatos ao público é o do início da ação penal. Porém, antes disto, a legalidade da decisão judicial pode ser revista em recurso ao Tribunal, que terá o pleno conhecimento dos indícios que a autorizaram.

7) A 2ª Câmara de Coordenação e Revisão manifesta, por isso, integral apoio à atuação dos Procuradores da República em Mato Grosso do Sul que, no exercício de suas atribuições legais e constitucionais, têm atuado, com seriedade e zelo nas investigações, requerendo e se pronunciando sobre medidas para promover a persecução penal e a proteção de direitos humanos, em estrita observância aos princípios constitucionais que regem sua atuação.

Brasília, 25 de junho de 2010.

Raquel Elias Ferreira Dodge

Subprocuradora-Geral da República

Coordenadora

Julieta E. Fajardo C. de Albuquerque

Subprocuradora-Geral da República

Elizeta Maria de Paiva Ramos

Subprocuradora-Geral da República

Mônica Nicida Garcia

Procuradora Regional da República

Douglas Fischer

Procurador Regional da República

Alexandre Espinosa Bravo Barbosa

Procurador Regional da República