O debate em torno da influência da Guarda Revolucionária do Irã sobre o governo do país voltou a esquentar ontem, quando a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, subiu o tom afirmando que o regime iraniano caminha para uma “ditadura militar” e merece ser alvo de novas sanções da ONU. Enquanto isso, em Madri, o chanceler brasileiro, Celso Amorim, voltou a expressar a disposição do Itamaraty de “favorecer” o diálogo entre Teerã e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), rejeitando a aplicação de novas sanções.

Hillary negou que os EUA planejam atacar o Irã e reforçou o desejo de Washington de manter o diálogo. No entanto, ela afirmou que os EUA não podem “ficar esperando sem fazer nada” enquanto o Irã dá continuidade a seu suspeito programa de armas nucleares.

GUARDA NA MIRA

“Estamos planejando unir a comunidade internacional para pressionar o Irã por meio de sanções adotadas pelas ONU que serão direcionadas às empresas controladas pela Guarda Revolucionária, a qual, segundo acreditamos, está tomando o lugar do governo do Irã”, disse Hillary, que chegou ontem a Riad, na Arábia Saudita. “Nós vemos o governo, o líder supremo, o presidente e o Parlamento sendo substituídos, e vemos o Irã caminhando rumo a uma ditadura militar.”

As declarações da secretária de Estado foram as avaliações mais abertas feitas pelos EUA sobre a crescente influência da Guarda Revolucionária – braço armado do regime que, segundo analistas, controla os programas nuclear e balístico de Teerã, além de boa parte da economia.

Fundada após a Revolução Islâmica de 1979, a Guarda Revolucionária tem como principal objetivo proteger o governo e conta com o apoio de 125 mil combatentes. A unidade tem suas operações separadas das do Exército e responde diretamente ao líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei.

Uma quarta rodada de sanções do Conselho de Segurança da ONU colocaria pressão sobre a Guarda Revolucionária e o programa nuclear iraniano, o qual o governo afirma ter fins apenas energéticos.

Em Madri, o chanceler Celso Amorim voltou a afirmar que a aplicação de novas sanções contra o Irã “não terá resultados”. “É importante que haja diálogo: o Brasil segue disposto a favorecer esse diálogo entre a agência atômica e o Irã para garantir a Teerã a possibilidade de ter um programa nuclear pacífico e, à comunidade internacional, a certeza de que esse programa não será desviado para fins militares”, disse Amorim.

PAPEL-CHAVE

A Alta Representante para a Política Externa e de Segurança Comum da União Europeia (UE), Katherine Ashton, disse que o Brasil pode ajudar a solucionar a polêmica nuclear do Irã. “Reconhecemos que o Brasil, como potência global, tem um papel-chave a exercer na questão”, disse Ashton, em entrevista em Madri, após participar de uma reunião ministerial entre a UE e o Brasil (mais informações no Caderno de Economia).

Ontem, o chefe da agência nuclear iraniana, Ali Akbar Salehi, afirmou que os EUA, a França e a Rússia formularam uma nova proposta sobre o intercâmbio de urânio com o Irã. No entanto, a informação foi desmentida por Moscou, Paris e Washington. “Salehi deve saber que a única proposta válida é a apresentada pela AIEA em outubro”, disse Bernard Valero, porta-voz da chancelaria francesa.

Em outubro, a AIEA apresentou ao Irã uma proposta para enriquecer no exterior 1.200 kg de seu urânio fracamente enriquecido, que seriam depois utilizados em seu reator de Teerã. O Irã não aceitou a oferta, propondo alternativas diferentes. No dia 9, Teerã anunciou que começou a enriquecer urânio a 20% em sua usina de Natanz, apesar dos protestos do Ocidente.