Um terço das confederações brasileiras busca estrangeiros para Rio-2016

Das 28 confederações olímpicas do país, quase um terço está olhando para o exterior em busca de talentos

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Das 28 confederações olímpicas do país, quase um terço está olhando para o exterior em busca de talentos

Em 2016, o Brasil vai torcer por atletas com sotaque, que provavelmente não cantam o hino nacional com perfeição e também não nasceram por aqui. Mas escolheram a sede dos Jogos Olímpicos como casa pelo sonho de conquistar uma medalha. Das 28 confederações olímpicas do país, quase um terço está olhando para o exterior em busca de talentos para aumentar sua chance de sucesso.

O maior exemplo disso é o polo aquático. Já foram naturalizados três atletas (o cubano, casado com uma médica brasileira, Ives Gonzales, o italiano, filho de uma gaúcha, Felipe Salemi e o espanhol, filho de pai carioca, Adriá Delgado) e mais dois estão na fila (o croata Josip Vrlic e o sérvio Slobodan Soro). Além disso, o carioca Felipe Perrone, que defendia a Espanha, foi repatriado – e existe o sonho de fazer o mesmo com o norte-americano Tony Azevedo e com o italiano Pietro Figlioli.

“Na Espanha, não existia um plano para meu aproveitamento na seleção principal. No Brasil, foi diferente. Me ofereceram um projeto sólido, com a presença do melhor técnico do mundo e a chance de disputar os Jogos Olímpicos, o meu maior sonho. Por isso, aceitei a naturalização. Hoje, me sinto brasileiro”, fala Adriá, com sotaque espanhol, mas falando português fluentemente para elogiar um ponto chave no projeto do polo brasileiro: o técnico croata Radko Rudic, tetracampeão olímpico.

Outras modalidades, porém, estão fazendo o mesmo. No rúgbi, a estratégia foi buscar atletas com ligação com o Brasil que disputam o esporte em alto nível. A confederação brasileira chegou a colocar anúncios em jornais esportivos de países da elite do esporte buscando atletas interessados. Muitos entraram em contato.

Hoje, a seleção feminina, que está entre as dez melhores do mundo, conta com a norte-americana Isadora Cerullo, que se mudou de Nova Jersey para São Paulo – seus pais são brasileiros. No masculino, o inglês Juliano Fiori, que joga na Inglaterra, e o australiano Dave Harvey, que joga na Austrália, também foram recrutados: os dois têm pais brasileiros.

“A evolução do rúgbi no Brasil é grande. Mas tem uma coisa que não conseguimos acelerar: a conquista de experiência. Por isso, buscamos atletas no exterior. O Juliano, por exemplo, joga semanalmente em alto nível. O Dave também. Quem sempre jogou no Brasil não tem isso, mesmo tendo tanto talento quanto. É um processo longo”, explica Augustin Lanza, argentino que comanda o projeto de expansão do rúgbi no Brasil.

A esgrima fez algo parecido. E já conseguiu resultados expressivos. Medalhista em Olimpíadas da Juventude pela França, Ghislain Perrier nasceu no Ceará, mas foi adotado por um casal francês quando tinha um ano. Foi recrutado em 2013 e já conquistou uma medalha (de bronze) em uma etapa da Copa do Mundo da modalidade, na Coreia do Sul. Além disso, a italiana Nathalie Moellhausen e a norte-americana Katherine Miller já competem pelo Brasil.

Nas lutas, o processo foi inverso: os próprios atletas foram atrás da confederação para tentar uma vaga no time brasileiro. Eduard Soghomonyan, da Armênia, e Marat Garipov, do Cazaquistão, já defendem o Brasil em competições da Federação Internacional, mas estão no meio do processo de naturalização, correndo para conseguir ter tudo pronto para o Rio-2016.

Além dessas quatro modalidades, outras também trabalham com talento estrangeiro. O hóquei sobre a grama (que só tem chance de classificação para 2016 entre os homens) montou sua seleção usando a mesma estratégia do rúgbi. O remo já teve um cubano medalhista no Pan – Alexis Mestre foi prata em Guadalajara-2011. O handebol pode usar o cubano Carlos Mirabal, que desertou em 2006 e vive no país desde 2007.

No tênis de mesa e no basquete, os naturalizados já têm uma Olimpíada no currículo. Gui Lin, mesa-tenista chinesa que se mudou para o Brasil aos 12 anos, foi para os Jogos de Londres. Larry Taylor, armador norte-americano, já tem Olimpíada e Mundial pela seleção brasileira no currículo.

“Cada confederação sabe onde seu calo aperta. Prefiro formar campeões em casa, mas sabemos que a pressão por resultados em 2016 é grande e quem corresponder sairá na frente para o próximo ciclo olímpico em termos de investimentos”, admite Pedro Gama Filho, presidente da Confederação Brasileira de Lutas Associadas. “Nós fomos procurados pelos atletas e estamos ajudando. Os dois (Soghomonyan e Garipov) são grandes lutadores e moram no país há anos. Estamos ajudando no processo”, completa.

A naturalização, porém, não é das mais fáceis. No Brasil, é assunto do Ministério do Trabalho. Normalmente, é preciso morar por quatro anos no país antes de pedir a naturalização. É possível, porém, acelerar o processo. Casar-se com um brasileiro ou ter um filho no país são itens previstos para isso. Outro atenuante é ser recomendado por sua capacidade profissional. Esse é o ponto que está sendo usado para as naturalizações.

O Ministério do Esporte e o COB (Comitê Olímpico do Brasil) estão ajudando as confederações interessadas. “A iniciativa de naturalizar um atleta parte da própria confederação, que tem o conhecimento específico detalhado. Não vemos nenhum tipo de problema se a confederação ver isso como algo positivo e seguir as regras das Federações Internacionais e do COI. Quem faz todo o processo, é a própria confederação. Não temos um programa específico para ajudar, mas podemos prestar apoio jurídico e legal de acordo com nosso conhecimento”, diz Adriana Behar, medalhista olímpica no vôlei de praia e hoje gerente de planejamento esportivo do COB, trabalhando diretamente com as confederações para o planejamento esportivo para o Rio-2016.

O sucesso com a estratégia de naturalizações não é garantido. Mas o exemplo de Londres-2012 é bom. A Grã-Bretanha disputou os Jogos com 61 “plastic brits”, os atletas naturalizados, e terminou em terceiro lugar, com 29 medalhas de ouro, atrás apenas de EUA e China. Segundo o jornal londrino The Independent, 24 das 65 medalhas conquistadas nas Olimpíadas tiveram influência dos naturalizados – o mais famoso deles era Mo Farah, campeão dos 5.000m e 10.000m no atletismo, que nasceu na Somália.

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