A empresa contratada para fazer vistoria veicular deveria trabalhar exclusivamente com este tipo de serviço, conforme Resolução 282 do Denatran. Empresa considerada apta, no entanto, trabalha com produção de lacres.

Após denúncia da Associação Nacional das Empresas de Perícias e Vistorias Veiculares (Anpevi) sobre os valores da licitação do pregão eletrônico 003/2013 do Detran-MS, novos dados sugerem irregularidades na contratação da empresa, como atuação conflitante no mercado.

De acordo com o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), a empresa é certificada apenas como “produtora de lacres com sistema de controle integrado a serem aplicados nas placas de veículos automotores”. Este fato, por si só, impede a atuação da empresa na vistoria veicular, já que é preciso credenciamento no órgão para a realização do serviço.

Outro problema encontrado na contratação é o conflito que surge com a Resolução 282 do Denatran, Art. 1 parágrafo 2, onde “as empresas credenciadas deverão comprovar sua atuação exclusiva no mercado de vistorias, mediante certidão emitida pelo órgão competente e cópia do contrato ou estatuto social vigente”.

A empresa Ice Cartões, portanto, não poderia ser considerada hábil a participar do pregão, já que não atua exclusivamente com vistorias. Para tanto, a empresa tentou certificação, mas o pedido foi indeferido pela área técnica e jurídica do Departamento, exatamente por atuar como produtora de lacres e CNHs.

Edital com irregularidades

Também chama a atenção a elaboração do edital do Detran-MS para a contratação da empresa de vistorias, quem não contém itens básicos para que as empresas participantes estejam habilitadas para realização do serviço de vistoria.

No item 4.1.6, das propostas, o Detran não pede que a empresa tenha certificado homologado pelo Denatran para vistorias, conforme determina a Resolução 282, pedindo apenas  que a empresa siga as Resoluções 287, 16, 187, 310 e 272. Esta última é exatamente a única certificação que a empresa Ice Cartões possui para a prestação do serviço especificado.

Ilegalidades

Segundo a Anpevi, há ilegalidade de todas as formas nesse contrato. Primeiro porque jamais a administração pública poderia contratar o serviço de vistoria veicular, que é uma vistoria documental e estrutural nos veículos, sem uma Audiência Pública.

Também porque como o serviço diz respeito a uma atividade fim é preciso haver uma concessão do serviço, ao invés de licitação por Pregão Eletrônico, como foi realizado.

O documento aponta que “a pior de todas as ilegalidades está no fato de que o Detran-MS esqueceu que existe uma legislação própria para a atividade, sendo que, somente poderia ser licitada a concessão da atividade de vistoria automotiva a empresas credenciadas para essa atividade, o que não é o caso da Ice”.

Com a contratação, a Anpevi afirma que as vistorias realizadas em MS serão feitas por empresa sem qualificação técnica, sem credenciamento, sem os equipamentos obrigatórios exigidos em lei, e pior, as vistorias estarão fora do SISCSV do Denatran, que é o sistema único onde todos os Estados devem realizar as vistorias. “Ou seja, teremos caminho aberto para fraude em vistorias”, conclui a denúncia.

Ice Cartões

A empresa Ice é uma das doadoras de campanha do candidato derrotado à prefeitura, Edson Giroto (PMDB). Nas eleições de outubro de 2012, por meio de transferência eletrônica, a Ice Cartões do estado de São Paulo, doou ao todo R$ 150 mil para as eleições campo-grandenses.
Posteriormente, a Ice tentou embargar a licitação para inspeção veicular, homologada no apagar da luzes da administração Nelsinho Trad (PMDB), publicada no dia 20 de dezembro de 2012.

O Consórcio Inspecionar venceu a concorrência e deveria arrecadar R$ 503 milhões no período de 20 anos. A consórcio era composto pela empresa sul-mato-grossense Ivex Inspeção Veicular Ltad (empresa líder), Otimiza Sistemas Ltda (MG) e Cotran Controle de Transportes (RJ). Pelo menos 25 empresas retiraram o edital na época, mas apenas o Inspecionar apresentou proposta, levando a outorga.

A empresa Ice Cartões Especiais, de São Paulo, tentou cancelar a licitação, mas o pedido foi negado pela Justiça. Após onda de protestos e uma série de denúncias de irregularidades, o prefeito Alcides Bernal (PP), cancelou a licitação com aval do MPE.