O anuncio do Governo quanto à redução dos juros pode gerar um endividamento da população que precisa estar atenta as reais necessidades de consumo.

Analisando este contexto e visando contribuir com os leitores, o Midiamax entrevistou o economista Norman Kalmos.

Kalmos fala de redução dos juros bancários, movimentação da economia e faz uma análise geral da evolução do governo desde o período Lula, mostrando o momento em que o mercado interno vive.

O economista questiona a falta de investimento em qualificação profissional e o destaca o incentivo ao consumo. Confira a entrevista com o economista Norman Kalmos:

Midiamax – A redução dos juros bancários que foi recentemente anunciada pelo governo é uma situação perigosa, economicamente falando?

Norman – Muito perigoso e é uma necessidade do governo federal neste momento de criar uma situação para que a economia não caia demais. Que o nível do desenvolvimento da economia não caia mais ainda.

Midiamax – Essa movimentação da economia teve início agora, no governo Dilma?

Norman – Este é um processo que foi iniciado lá atrás com o Lula, na época eu me lembro dele falar para que todo mundo comprasse carro, porque a crise econômica não chegaria ao Brasil, que era uma marolinha, que o Tsunami não ia chegar aqui. É verdade em termo que não chegou. A marolinha do Lula vem aumentando desde então. Eu na época falei a respeito e alertei para isso. O problema não é necessariamente em consumir e sim em que consumir.

O brasileiro não tem muita à tendência de empreender, aversão a empreendimento. Brasileiro quer emprego, de preferência com pouco trabalho e muito salário. Isso é geral, não é especificamente em determinado local. Mas, o que aconteceu no Brasil é que esta tendência foi aprofundada com o governo Lula, porque evidentemente existe um aparelhamento do estado.

Midiamax – Então podemos dizer que é resultado do governo petista em nosso país?

Norman – O PT (Partido dos Trabalhadores), de forma geral, isto é só uma constatação e não uma crítica necessariamente, ele usou o estado e os cargos do estado como forma de trazer mais adeptos. Então, cresceu violentamente o tamanho do estado, com esse crescimento do estado começou a ter muito mais vagas, as pessoas começaram a se empregar mais no estado e se existia alguma tendência de empreender, essa tendência acaba diminuindo porque os jovens hoje querem prestar concurso. Fazem faculdade, preferencialmente Direito, querem prestar concurso para serem funcionários públicos. Isso não vai dar certo. Aí junta isso esse problema da economia real, não tem mercado. Hoje o mundo inteiro está passando um rearranjo, por causa dos Estados Unidos, toda a tendência e aquele ciclo de crescimento que a gente tinha acabou vertendo neste momento e o Brasil precisa exportar.

Se o Brasil não consegue exportar não tem como fortalecer o mercado interno. Essa é a lógica.

Midiamax – Com toda a crise, Grécia, Europa, o mercado interno passou a ser interessante?

Norman – A primeira fase do governo Lula, antes do problema Grécia e Europa, foi muito interessante porque houve uma redistribuição desta renda e as classes mais baixas tiveram acesso ao consumo. Isso é um negócio espetacular, essencial, porque realmente aumentou o mercado.

A partir daí, o que acontece? Precisaria ter essas classes, ou alguém, produzindo mais. Precisaria produzir bens de valor agregado. Precisaria ter tecnologia sendo produzida.

As classes mais baixas, de forma geral, tem problema muito sério de capacitação. Nós não tivemos capacitação das classes baixas, não tivemos uma melhora significativa da capacitação da classe média. Por tanto, nós não tivemos nenhum incentivo ao desenvolvimento de tecnologia, de conhecimento.

Nós continuamos hoje exportando bens primários e o que temos de tecnologia está basicamente direcionado a produção de agropecuários, de bens primários. Então, não adianta nada a gente inchar este mercado, fazer com que as pessoas consumam, seja lá o que for, carro, geladeira, televisão. Não adianta nada se nós não estamos fazendo crescer a economia. Isto não é sustentável.

Midiamax – Por que não é sustentável?

Norman – Embora o governo alegue o contrário, não é sustentável. Nós estamos fazendo com que estas famílias se endividem e essa é a tônica. Ah, se as fábricas de geladeiras estiverem produzindo eu mantenho o emprego: perfeito. Mas, até quando? As famílias de baixa renda, que são as que têm problemas de capacitação mais acentuados, são estas famílias que estão sustentando o mercado.

Com que dinheiro se a economia não está crescendo? Isso não funciona. Em algum momento vai estrangular. Esse é o ponto.

Midiamax – E o que deveria ser feito? Ou já foi feito?

Norman – A única iniciativa que eu claramente vi, desde o governo Lula, foi essa viagem da presidente Dilma dizendo que ela quer trazer o AMT (Tecnologias Avançadas de Manufatura – AMT – abreviatura em inglês) para o Brasil. Primeira vez que alguém está falando em tecnologia.

O que a gente tem de polo de tecnologia no Brasil, mesmo aqui em Mato Grosso do Sul, Embrapa, por exemplo, ninguém ouve falar que recurso tem. Esses órgãos que precisam ter um investimento maciço, não tem.

As empresas de tecnologia, Mato Grosso do Sul como um todo, mas especialmente Campo Grande, que teria a possibilidade de ser um polo de desenvolvimento de tecnologia muito grande, porque a gente tem uma cidade com uma infraestrutura legal, comunicação boa. Cadê as empresas de tecnologia de Campo Grande? Estão escondidas. Não existe uma organização do estado (como poder) no sentido de promover qualquer tipo de atividade economicamente viável.

O que o nosso governo faz? Vamos promover o consumo. Aí, chega ao estrangulamento e evidentemente as famílias vão ter problemas com o pagamento e de novo, ao invés de promover uma produção sustentável, a gente vai lá e abaixa os juros.

Midiamax – Reduzir os juros seria uma alternativa, mas não uma solução?

Norman – Não é uma alternativa. Existem indicativos, alguns índices que são indiscutíveis em economia, que são historicamente comprovados. Então, um deles é a possibilidade, é a capacidade de autofinanciamento de uma economia.

Qualquer economista vai dizer que é impossível sustentar o crescimento de uma economia com menos de 22% de poupança.

No Brasil nós chegamos ao máximo a 17%. Isso é insustentável. Então nós não temos condições de sustentar um crescimento, porque não temos capacidade de investimento.

Midiamax – Considerando todas estas questões, o que ocorre então, quando se reduz os juros?

Norman – Quando se reduz juros, e eu não sou contra a redução de juros, mas o que aconteceu com a poupança, por exemplo, tivemos que mudar a estrutura da poupança para que ela não passasse a ser exageradamente rentável para quem não quer correr risco. Poupança não tem este sentido de investimento, sendo simplesmente uma reserva de valor. Correto. Tem que mudar mesmo.

Midiamax – E o que pode acontecer com esta mudança?

Norman – É bastante possível que as pessoas pensem que a poupança não está rendendo e resolvam gastar este dinheiro. Aí, de novo a gente não tem poupança mais. Aí, nós não estamos atacando as causas.

Então no Brasil a gente não tem educação, a gente não tem investimento suficiente, não tem poupança para fazer investimento, nós não temos valorização do conhecimento e o estado não está nem um pouco preocupado com isso. Os problemas estruturais são muitos e eles só vão se aprofundar. E, vai chegar a um determinado momento em que as famílias não vão ter como pagar.

Midiamax – Então seria necessário reduzir não só os juros e IPI?

Norman – O que precisa reduzir é a carga tributária. A presidente disse que ela vai baixar na medida do possível. Mas isso não quer dizer nada, porque na medida do possível hoje, ela não tem condição de reduzir absolutamente nada, pelo contrário, o estado acaba exigindo mais.