Há anos, moradores do bairro Nova Campo Grande e regiões próximas convivem com um odor tão constante que se tornou uma marca registrada do local. O cheiro forte, atribuído a fábrica da JBS, costuma se intensificar ao anoitecer, causando sérios transtornos à população. No entanto, há meses moradores afirmam que o odor tem se espalhado pela cidade.
Vera Lúcia Menezes, mora há 29 anos no Nova Campo Grande e relata que, na noite desta sexta-feira (14), o cheiro estava tão forte que era quase impossível permanecer dentro de casa. Mesmo diante do calor, ela precisou manter todas as portas e janelas fechadas
“Está insuportável, pior que lixão. Fechei tudo, mas, ainda assim, o odor entrou em casa. Estamos cansados, e parece cada vez mais difícil de alguém tomar uma atitude”, lamenta.
Mau cheiro percorre a cidade

O problema, porém, não se restringe ao Nova Campo Grande. Nos últimos meses, moradores de diversos bairros relataram que o mau cheiro tem se espalhado por um raio de 10 km, atingindo áreas como União e Jardim Leblon. Na noite de sexta-feira (15), o odor se mostrou tão intenso que muitos recorreram às redes sociais para expressar sua indignação.
“Morei no Dom Antonio por um ano com cheiro insuportável. Hoje moro no Leblon, mas o odor chegou até aqui”, escreveu uma moradora via redes sociais. Outro usuário comentou: “Aqui no Los Angeles, todo dia contamos com essa podridão.”
Mesmo que não haja estudos conclusivos que confirmem a origem do odor nos bairros mais distantes, a população segue convencida de que a fábrica da JBS é a principal fonte do problema.
“No Jardim Carioca está insuportável. Acredito que seja por conta da JBS; estive lá e o cheiro estava ainda pior.” Outro completou: “É o cortume do Nova Campo Grande.”
No caso em específico da região do Nova Campo Grande, em janeiro deste ano, uma nova fiscalização constatou que a unidade frigorífica continua exalando mau cheiro e determinou uma série de providências à gigante de alimentos.
Mas ainda não está claro como o mau cheiro consegue alcançar bairros tão distantes, o que pode estar relacionado à poluição ambiental, à contaminação dos córregos e do ar, ou até mesmo aos problemas na rede de esgoto da cidade.
Odor pode se espalhar por longas distâncias?

Widinei Alves Fernandes, físico e coordenador do projeto QualiAr – que monitora a qualidade do ar na Capital – explica que um odor originado por fontes que emitem compostos odoríficos pode, sim, percorrer distâncias consideráveis.
No entanto, isso depende de uma série de fatores, como condições meteorológicas favoráveis para dispersão dos poluentes para grandes distâncias, velocidade do vento, temperatura e umidade.
“Depende das características da fonte, se são fontes pontuais, por exemplo, uma chaminé ou se ela sai de alguma lagoa. Essas características juntas que irão determinar o alcance dessas odores. Por isso, depende tanto das condições meteorológicas quanto das características das fontes”, explica.
Embora seja possível que o odor se espalhe por toda a cidade, o especialista ressalta que, no caso específico da situação ocorrida nesta sexta-feira não há confirmação de que advém da JBS.
“É possível, mas ainda não fiz análise aprofundada, por isso não posso dizer que é uma fonte que advém desse local”, esclarece.
O Jornal Midiamax entrou em contato com os órgãos competentes do Estado para obter esclarecimentos, mas, assim como os moradores, segue sem respostas definitivas.
Entenda: nova fiscalização confirmou o mau cheiro
Em janeiro deste ano, uma nova fiscalização constatou que a unidade frigorífica continua exalando mau cheiro e determinou uma série de providências à gigante de alimentos.
Recentemente, o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) recebeu novas denúncias de moradores dos arredores do frigorífico sobre ‘odor terrível’ vindo da JBS.
Diante disso, a equipe técnica do Daex (Secretaria de Desenvolvimento de Apoio às Atividades de Execução) realizou nova fiscalização no local e confeccionou, em outubro, novo laudo sobre a situação na planta da JBS.
Assim, os técnicos confirmaram os relatos dos moradores e, por meio de estudos e análises, concluíram que é possível haver incômodo a partir do forte odor emitido pela produção do frigorífico. “Relevante destacar que em situações de constante percepção/inalação desses odores pela comunidade adjacente ao frigorífico, o incômodo pode surgir”.
Isso ocorre devido a uma série de ‘falhas’, segundo os técnicos, ainda não sanadas. Por exemplo, a nova vistoria constatou que “foi possível confirmar a presença de aberturas capazes de permitir o escape de gases oriundos do processo produtivo”.
Além disso, detectou-se falha na cortina arbórea que deve existir no entorno do frigorífico. “Além do suprimento com vegetação nas falhas apontadas na primeira vistoria técnica (lateral leste, Av. Cinco), a equipe do DAEX recomenda a instalação de cortina arbórea na lateral oeste do terreno, junto às linhas externas de condução de efluentes do processo produtivo, por meio do plantio de mudas com porte e características adequadas”.
Pedido de providências
Os técnicos recomendaram que a JBS adote as seguintes providências para acabar com o mau cheiro que chega ao bairro:
- Realizar o total cobrimento, vedação e isolamento das unidades com maior emissão de gases com maus odores (principalmente unidades componentes do sistema de condução e tratamento de efluentes que apresentem maior turbulência no escoamento e, consequentemente, maior desprendimento dos gases);
- Realizar o planejamento, a médio prazo, visando ao deslocamento da planta produtiva para outro local mais adequado (núcleo industrial, por exemplo), de modo a não causar mais incômodos na vizinhança.
Enquanto a situação perdura, Inquérito Civil tramita no MPMS, sob o número 06.2024.00000496-4.
JBS foi alvo de protestos, audiência e ‘intervenção’
A unidade frigorífica localizada na Avenida Duque de Caxias também foi alvo de protestos de moradores, audiência pública e até uma reunião para ‘intervenção’ feita entre vereadores e representantes do Imasul (Instituto de Meio Ambiente de MS), responsável pela fiscalização de questões ambientais.
Dessa forma, diversas melhorias foram exigidas pelo órgão ambiental para que houvesse a renovação da licença ambiental. No entanto, nova denúncia pode barrar essa renovação.
Ainda no bojo do Inquérito Civil, instaurado em maio de 2024, a promotora Luz Marina Borges Maciel Pinheiro solicitou parecer do Imasul sobre o PAM (Plano de Monitoramento) apresentado pela JBS. “Se já foram analisados e, em caso positivo, quais as conclusões obtidas”.
Além disso, o juiz Flávio Saad Peron, da 15ª Vara Cível de Competência Residual, propôs audiência de conciliação em mais três ações de moradores da região do bairro Nova Campo Grande contra o mau cheiro vindo da unidade da JBS.
No caso, a Justiça chegou a marcar uma audiência de conciliação para o dia 30 de janeiro de 2025 em um dos processos. Porém, a gigante frigorífica que obteve lucro de R$ 3,9 bilhões (no 3º trimestre deste ano) alegou que não tem interesse.
O número de ações pedindo indenização por prejuízos causados pelo mau cheiro pode chegar a 200. O valor pedido varia de R$ 25 mil, R$ 50 mil, R$ 75 mil ou R$ 150 mil a depender da quantidade de pessoas que entraram contra o frigorífico no mesmo processo. Além disso, também há um pedido indenização por desvalorização dos imóveis da região.
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