Nas Moreninhas, orgulho dos moradores supera passado de pobreza e violência do bairro

No bairro onde moradores nascem e morrem, viver em outro local está fora de cogitação

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Moreninhas
Comércios nas Moreninhas (Alicce Rodrigues, Midiamax)

O letreiro na entrada do bairro declara com orgulho: “Eu amo as Moreninhas”. A frase reflete um sentimento compartilhado pelos mais de 70 mil moradores do segundo maior bairro de Campo Grande. Criado há 43 anos, as Moreninhas buscam a superação de seu passado de pobreza e violência e, a cada dia, transforma-se, tornando-se um dos bairros mais promissores da Capital.

O potencial do bairro é facilmente aferido pela presença de “âncoras” no bairro: Correios, bancos, clínicas médicas, concessionária e até franquias nacionais – as opções são tantas que caminhar pelas Moreninhas é quase como visitar outra cidade, o que inclusive já foi cogitado pelo poder público municipal. Para os moradores das Moreninhas, dividida entre a unidade 1 e 4, a maior vantagem é não precisar sair do bairro para quase nada.

Na Rua Ipamerim, prolongamento da Fraiburgo, porta de entrada do bairro, a variedade comercial é um convite aos visitantes. O comércio central do bairro se expande para as ruas Barueri, Barreiras e Tambaíba, que na região do terminal de ônibus do bairro, ganha movimento com a demanda de passageiros.

Mas a transformação desse bairro – outrora isolado – em um bairro promissor é um fruto da determinação de uma comunidade que há quatro décadas se mobiliza para reivindicar melhorias.

Moreninhas
Letreiro ‘Eu Amo as Moreninhas’ (Alicce Rodrigues, Midiamax)

‘Quando cheguei aqui era tudo mato’

Quando Marlene dos Santos, de 68 anos, chegou ao local onde hoje se encontra a Moreninha 3, era literalmente ‘tudo mato’. Tanto é que a própria moradora teve que capinar seu lote e todo o entorno para transformá-lo em sua moradia.

Há 43 anos na Moreninha III, Marlene foi uma das primeiras moradoras do bairro e relembra com clareza cada transformação pela qual a região passou.

“Saí do bairro Guanandi com meus filhos e irmãos. Quando cheguei aqui era um lugar isolado, tudo mato, tivemos que roçar. Na época não tinha nem água encanada”.

Assim que se mudou, Marlene se deparou com inúmeras adversidades, a principal, segundo ela, era a falta de água encanada. Por oito meses, os moradores precisaram buscar água diariamente em um poço que, hoje, abriga a Igreja São Pedro e São Paulo.

“Como não tinha água, os moradores pegavam lá no poço. Todos os dias tínhamos que ir e voltar com os baldes. Hoje não existe mais, no lugar virou uma igreja”, relembra.

‘Só saio daqui para o cemitério’

Moreninhas
Marlene (Alicce Rodrigues, Midiamax)

Marlene conta que o progresso chegou aos poucos e sob muita pressão dos moradores, que promoveram diversos protestos para solicitar o básico como asfalto, policiamento, posto de saúde e ônibus.

“No início não passava ônibus na região, o jeito era andar até o local mais próximo”, relembra.

A moradora ressalta que por muitos anos a violência tomou conta das Moreninhas. Mortes, roubos a tráfico de drogas eram cotidianos na região, mas agora a situação está mais tranquila

“Antes era muito violento, roubo, morte, era difícil conviver. Ainda têm violência, mas melhorou muito. Além disso, fiquei aqui porque fui beneficiada por um programa de habitação e doação de comidas do ex-governador Pedro Pedrossian”, diz.

Apesar das dificuldades que passou, Marlene é enfática ao dizer que só sai do local onde mora se for para o cemitério, que, aliás, também fica nas Moreninhas.

Amor pelo bairro ultrapassa gerações

Moreninhas
Feira (Alicce Rodrigues, Midiamax)

Sem ter moradia e com três filhos para criar, Luzinete Silva Ferreira, de 69 anos, encontrou no bairro Moreninhas uma oportunidade de mudar de vida. Ela conta que chegou ao bairro em 1983, após ser contemplada por um programa de habitação do então governador Pedro Pedrossian.

Moreninhas
Luzinete (Alicce Rodrigues, Midiamax)

“Eu amo as Moreninhas, não penso em sair daqui. Meus filhos eram pequenos quando chegamos, eles cresceram com o bairro e aqui continuam. Temos um laço muito forte com esse lugar”.

Luzinete também relembra as dificuldades que passou ao longo dos 41 anos morando nas Moreninhas, assim como Marlene, ela precisou se adaptar à falta de estrutura e ao passado de violência da região.

“Acompanhei tudo, a primeira delegacia, primeiro posto de saúde, escola, comércios. Hoje fico feliz, porque a moreninha cresceu muito rápido. Aqui têm muita oportunidade, as pessoas moram e trabalham no próprio bairro”, diz.

‘Minha vida toda está aqui’

Moreninhas
Marcia Vernal (Alicce Rodrigues, Midiamax)

Márcia Vernal, de 42 anos, chegou ao bairro quando tinha 15 anos. Ela conta que foi nas Moreninhas que construiu sua vida, conheceu seu marido, criou seus dois filhos, de 18 e 4 anos, e abriu seu próprio negócio.

“A situação atual do bairro nem se compara com antigamente. Antes, era morte e assalto todo dia. Agora está mais tranquilo, por isso decidi abrir minha mercearia, e meu marido tem sua própria serralheria. Minha vida toda está aqui”, ressalta.

Para os recém-chegados, a estrutura surpreende, mas ainda há uma sensação de cidade do interior. Valdir Ferreira Braga está há três meses nas Moreninhas, após sair de Rio Brilhante. Ele relata que praticamente tudo o que precisa, ele encontra no bairro.

“Sinto que a vida aqui no bairro é até melhor do que na cidade. Estou há pouco tempo, mas percebo o potencial de crescimento da região, por isso, não penso em sair daqui”, afirma.

Atraso e progresso caminham lado a lado

Asfalto na Moreninhas
Asfalto nas Moreninhas (Divulgação)

Apesar dos avanços, a região das Moreninhas ainda enfrenta problemas latentes que acompanham seu desenvolvimento, muitos dos quais se mantêm ao longo dos anos, em contraponto ao progresso.

Durante o período chuvoso, as ruas não asfaltadas se transformam em lamaçais, dificultando a locomoção dos moradores e até mesmo impedindo que saiam de casa.

Rua Paranapiacaba
Rua Paranapiacaba nas Moreninhas (Leitor Midiamax)

Em abril deste ano, a Agesul (Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos de Mato Grosso do Sul) anunciou que contrataria uma empresa para realizar obras de infraestrutura urbana em Campo Grande, no valor de R$ 1,3 milhão. No cronograma estão inclusas obras de pavimentação de ruas em diferentes regiões das Moreninhas.

Conforme o projeto, está prevista a realização da primeira etapa de pavimentação asfáltica e drenagem de águas pluviais no bairro Moreninha IV. Além disso, estão planejados outros investimentos na região, como pavimentação e recapeamento de vias urbanas nas Moreninhas I e II, juntamente com obras de drenagem, esgotamento sanitário e sinalização viária.

A obra de acesso à região das Moreninhas chegou a 65% de conclusão com a instalação do sistema de drenagem de águas pluviais, em sua primeira etapa. A obra está prevista para ser entregue ainda em 2024.

O projeto iniciou em dezembro de 2022, com a revitalização da Avenida Alto da Serra. Conforme o plano, estão confirmados 92.584,06 m² de implantação de asfalto novo, 31.825,64 m² de recapeamento e 9.346,74 m² de drenagem.

Guerra de facções

Moreninhas
PM Moreninhas (Alicce Rodrigues, Midiamax)

Distante das áreas comerciais, as vielas do bairro ainda são assombradas pela violência. Nos últimos anos, a Moreninhas se tornou cenário de execuções decorrentes da disputa pelo controle do tráfico de drogas na região, que seria liderado pelo PCC (Primeiro Comando da Capital).

A vítima mais recente, foi um adolescente, identificado como Gustavo de Lima, de 17 anos, executado a tiros em frente a uma residência na Rua Macabá. Conforme o B.O, o jovem era usuário de drogas.

No ano passado, Gabriel Jordão foi executado após se envolver no tráfico de drogas com um fornecedor de fora da facção. Desde 2022, quatro pessoas morrerem na ‘guerra de facções’ do bairro Moreninhas.

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