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Cotidiano

Na luta por sobrevivência, indígenas chegam ao alto escalão com lista de desafios para MS

No Dia dos Povos Indígenas, comunidade comemora conquistas, mas ainda luta por direitos básicos
Priscilla Peres -
Indígena da aldeia Barro Preto (Foto: Alicce Rodrigues/ Jornal Midiamax)

Em janeiro de 2023, os povos indígenas de conquistaram uma importante posição no governo federal, com a nomeação do advogado Luiz Eloy Terena como secretário-executivo do Ministério dos Povos Indígenas. É algo a ser celebrado, já que, quando se trata de direito dos povos indígenas, a conquista de um cargo alto significa oportunidade de lutar pelo básico, como moradia, alimentação e saneamento.

Em mais um 19 de abril, data que celebra a luta dos povos originários do Brasil, é hora de comemorar, mas também de refletir sobre os abismos sociais vivenciados pelos povos indígenas e quanta luta ainda é necessária para garantir direitos básicos.

Em entrevista ao Jornal Midiamax enquanto exercia o cargo de ministro interino, Eloy Terena destacou o trabalho no Ministério dos Povos Indígenas e as dificuldades e pressões enfrentadas. Para Mato Grosso do Sul, ele afirma que desde 2023 priorizou a retomada da regularização fundiária, que teve demarcações paralisadas nos últimos anos, mas que voltaram a andar.

“Temos demandas sociais importantes como garantir acesso à água, saúde e soberania alimentar. Mas também estamos colaborando para o protagonismo , principalmente no âmbito da Funai de MS sendo ocupada por indígenas. Isso é uma marca importante, com indígenas sendo gestores e ocupando os espaços fora das aldeias”, disse.

No que tange a causa indígena de Mato Grosso do Sul, Eloy comemora a abertura de diálogo junto ao Governo do Estado, que possibilita o avanço na resolução de problemas e criação de políticas públicas conjuntas. Corroborando o destaque para o tema, em fevereiro de 2023, o indígena Fernando da Silva Souza foi nomeado subsecretário de Políticas Públicas para Povos Originários da Secretaria de Cidadania de Mato Grosso do Sul.

Confira trecho da entrevista com o secretário-executivo do Ministério, Luiz Eloy Terena

“Avançamos, mas precisamos de mais”

Natural da reserva indígena de , o subsecretário de Políticas Públicas para Povos Originários de MS, Fernando Souza, sentiu na pele a marginalidade imposta à sua comunidade e conta como viu nascer políticas públicas importantes, mas que ainda precisam de implementação de fato.

“Sou da década 70 e a gente não tinha nenhuma estrutura dentro dos territórios, nada mesmo. Hoje, por exemplo, temos uma política escolar indígena que na minha época nem existia, também temos políticas de saúde pública. Mas ainda precisamos avançar para que o acesso à água e saneamento seja integral, que tenha escolas estruturadas dentro de todas as aldeias”, afirma.

Fernando, que assim como Eloy é Terena, destaca a importância de polícias públicas que ajudam os indígenas a crescer e conquistar espaços, dentro e fora das aldeias. Mas o caminho para a ascensão passa pela mudança na forma como os indígenas são vistos na sociedade.

“Precisamos ser respeitados e inseridos nas políticas públicas de fato, mudar a mente para inserir a população dentro dos planejamentos. Necessário que se faça o recorte étnico na distribuição de recursos, só assim vamos conseguir deslumbrar ações mais efetivas”, afirma o subsecretário, que diz tentar mudar a visão de seus colegas para fazer a escuta dos povos indígenas.

“O mês de abril é para isso, fazer essa reflexão, fortalecer as lutas e destacar o empoderamento dos povos e fazer o diálogo intercultural desse público com todo seu histórico e sua população”, afirma Fernando.

Falta saneamento, sobra violência

Dados do Censo 2022 do (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que 25,6 mil indígenas não têm acesso a banheiros, utilizando sanitários ou buracos para dejeções, enquanto outros 1.395 não tinham nem sanitário para a realização das necessidades básicas. Os números evidenciam a falta de saneamento básico e extrema pobreza a qual as comunidades são expostas.

Com a escassez do básico, os povos indígenas se tornam mais vulneráveis à incidência de drogas e álcool e consequentemente de violência e danos psicológicos e emocionais. O Atlas da Violência do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostra que, em 2021, a taxa de violência no Estado chegou a 19,4%, enquanto a taxa de violência contra indígenas chegou a 39,4%.

Análise do Ipea sobre a maior incidência de suicídio de indígenas residentes em Mato Grosso do Sul relaciona a situação aos conflitos fundiários e a violência relacionada aos interesses político-econômicos. “A demanda reprimida pela demarcação de terras indígenas envolve indígenas em confrontos letais e frustra expectativas de melhoria da qualidade de vida diante da morosidade das demarcações”, diz o Ipea.

A psicóloga Vanessa Terena destaca que as condições em que vivem os indígenas de Mato Grosso do Sul formam um ambiente que impossibilita a saúde mental. Além disso, a ciência da psicologia ainda não dispõe de ferramentas suficientes para atender os povos indígenas sem ser atravessada pelas barreiras culturais.

“É inconcebível considerar que uma pessoa em uma aldeia com falta de água, alimentação digna, trabalho e que convive há gerações com a violência, vai ter condições de saúde mental. E é justamente como consequência de toda a realidade que os suicídios aparecem”, afirma a psicóloga indígena.

Por que tratamos tão mal os indígenas?

Mato Grosso do Sul tem mais de 110 mil indígenas autodeclarados, de acordo com o Censo 2022. Mas apesar de representar uma parcela da população, culturalmente os indígenas são vistos como uma espécie de “cidadãos de segunda classe”, como explica o professor e historiador Eronildo Barbosa.

“Historicamente a gente percebe esse preconceito com os povos indígenas desde a chegada dos portugueses, quando começaram a ser vistos como uma espécie de escravos, só que mais difíceis de lidar do que os negros. Desde aquela época veio a cultura de que indígenas não trabalham ou coisas parecidas”, afirma o historiador.

Ele explica que em Mato Grosso do Sul os indígenas sempre foram tratados em situação análoga a dos escravos e com o avanço da ocupação dos espaços eles começaram a morrer ou fugir, como ocorre até hoje.

“Há na sociedade uma discriminação acentuada em relação aos povos indígenas, que é muito predatória na relação com o pobre em geral. E vemos uma população elitizada que perpetua a relação discriminatória em relação aos povos indígenas, mas não analisa as condições em que eles vivem e são impostas”, afirma.

O pesquisador avalia os avanços dos povos indígenas na sociedade como resultado das políticas de incentivo, visto que os direitos humanos para essa comunidade ainda hoje não são um espaço conquistado e que depende da atuação e boa vontade direta de quem está no poder.

Por fim, Eronildo lembra de Paul McCartney na canção ‘Ebony and Ivory‘, que traduzida para o português, questiona “O ébano e o marfim vivem juntos em perfeita harmonia, lado a lado no teclado do meu piano. Oh, Senhor, por que nós não?

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