A próxima quarta-feira (3) pode marcar o fim da espera de mais de 4 anos de ex-funcionários das Farmácias São Bento, que aguardam os pagamentos dos seus direitos trabalhistas após a falência da rede.

Reportagem do Jornal Midiamax apurou que muitos aguardam os valores para realizar cirurgias, pagar dívidas e reformar suas casas. “Pessoas que por décadas se dedicaram para proporcionar a luxuosa vida que os donos da São Bento possuem atualmente, mas não são respeitadas pelos seus ex-patrões”, diz um profissional, que preferiu não ser identificado.

Por conta da demora na recuperação judicial da empresa, iniciada em 2015, a Justiça do Trabalho iniciou um Regime de Execução Forçada no processo que ex-funcionários movem contra a empresa para receber os valores. Esse processo pode dar luz aos cerca de 200 funcionários que passaram pela mesma situação.

A Justiça do Trabalho determinou a penhora de 3 fazendas dos sócios da São Bento, no valor de R$ 23 milhões. Depois, a penhora foi embargada e atualmente aguarda o julgamento no TRT (Tribunal Regional do Trabalho). Entretanto, este recurso já foi retirado da pauta de julgamento três vez, postergando ainda mais a espera daqueles que acabaram sem nada.

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Prédio da São Bento atualmente (Arquivo, Jornal Midiamax)

O TRT informou à reportagem que o recurso volta às mãos do desembargador Cesar Palumbo para julgamento na quarta-feira (3). Ainda de acordo com o apurado pelo Jornal Midiamax, caso o recurso saia novamente da pauta, CNJ (Conselho Nacional de Justiça), a Corregedoria do TST (Tribunal Superior do Trabalho) e o MPT (Ministério Público do Trabalho) devem ser acionados.

16 anos e 7 meses que resultaram em nada

O hoje aposentado Nelson Carvalho, de 66 anos, ficou por 16 anos e 7 meses na São Bento e sua demissão aconteceu em 2019. “A gente vestiu a camisa da empresa. Eu, no caso, trabalhei 16 anos e 7 meses. Nunca perdi um dia de serviço; nunca abateu um dia de serviço; nunca tive nem atestado médico. Fui um dos que vestiu a camisa da empresa. Aí no final fizeram isso com a gente”, lamenta ao Jornal Midiamax.

Nelson tem para receber cerca de R$ 30 mil há anos. Segundo ele, após a demissão, ainda conseguiu arrumar outro emprego, mas a pandemia da covid-19 dificultou a vida.

“Ficou difícil pra me aposentar, pra eu trabalhar. Aí veio a minha aposentadoria e estou me virando com a minha aposentadoria, que não é grande coisa. A gente trabalhou com amor na empresa; a gente fez o que pôde e no final os caras fazem isso com a gente”, diz.

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Nelson trabalhou mais de 16 anos na São Bento (Arquivo pessoal)

Por conta da demora para receber, Nelson diz que nem chegou a fazer planos para o dinheiro. “Eu não tenho nem plano de dinheiro porque tem hora que a gente perde a esperança deles pagarem a gente […] se eu chegar a receber esse dinheiro aí, se chegar cair na minha mão, aí que eu vou ver o que eu vou fazer, mas no momento eu não tenho plano”, conta à reportagem.

Dívidas

Quem também passou aperto durante a pandemia após a demissão foi a ex-farmacêutica da São Bento, Maiza Baez da Silva, de 42 anos. “O dinheiro fez falta na hora que mais precisei. Meu salário já vinha com atrasos desde agosto e ainda não pude receber seguro desemprego porque tinha CNPJ dos meus carrinhos de açaí de rua, que me auxiliaram a não passar fome e amigos e familiares que me ajudaram”, conta à reportagem.

Maiza tinha cerca de R$ 60 mil para receber, mas entrou em acordo para o pagamento apenas de R$ 40 mil. Entretanto, mesmo com o acordo, ainda tenta receber os valores.

“Tenho que pagar dívidas acumuladas pela minha demissão; fiquei desempregada quase 7 meses. Com ajuda de familiares e amigos consegui voltar ao meu município porque com o covid ficou pior a situação de arrumar emprego. Foi um dos piores momentos que já passei”, diz.

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Maiza deixou o antigo emprego para ‘salvar’ unidade em Ponta Porã (Arquivo pessoal)

Dinheiro será investido na saúde

Outra ex-funcionária, de 53 anos e que prefere não se identificar, trabalhou por 9 anos na São Bento e precisa do dinheiro dos direitos trabalhistas para investir na própria saúde e bem-estar.

“Eu mesmo estou precisando do dinheiro para tratamento de saúde. Tenho problemas na coluna. Gasto com remédios e faço hidroginástica e pilates para não precisar fazer cirurgia. Gasto por mês 850 reais”, relata ao Jornal Midiamax. Ela mora com a mãe, de 83 anos, e sustenta a casa com salário de doméstica, que não passa de R$ 2,5 mil.

“Não esperava isso de uma empresa grande”

Neide Vital da Silva, de 57 anos, trabalhou por 1 ano e 3 meses na São Bento e hoje tem cerca de R$ 27 mil para receber. “Eu não esperava isso de uma empresa grande. Meu acerto era de 5 mil e hoje deve estar em torno de 27 mil”, relata.

Neide quer usar o dinheiro para comprar uma moto e ter uma qualidade de vida melhor. “Trabalho em casa de família e faço serviços por conta em casa. Eles [da São Bento] deixaram de recolher nosso INSS, pagaram só uma parte do FGTS e todo nosso acerto ficou na esperança”, conta ao Jornal Midiamax.

Quem também deseja investir em bens para melhorar a qualidade de vida é um ex-funcionário de 31 anos, que prefere não ser identificado. “Planos todos temos, no meu caso esse dinheiro me ajudaria muito a financiar minha casa e meu carro; coisas que facilitariam muito o dia a dia de um trabalhador”, diz.

Ele tinha em torno de R$ 18 mil para receber em 2018, sem correção de juros. Com isso, o valor atualmente deve estar maior. “Não esperava tanta barbárie e descaso que estão fazendo com nós ex-funcionários da empresa, pois todos nós vestimos a camisa até os últimos dias de São Bento”, desabafa o trabalhador.

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Ex-unidade da São Bento (Nathalia Alcântara, Jornal Midiamax)

Julgamento pode dar fim à espera

Há cerca de dois anos, as farmácias São Bento desapareceram por completo das esquinas de Campo Grande. A rede, que tinha mais de 74 anos de tradição, fechou as portas permanentemente após declarar falência. 

Conhecida por toda a população, a rede São Bento chegou a ter 80 lojas em 23 cidades. Até 2022, o grupo mantinha duas lojas abertas na Capital: na Avenida Guaicurus e na Rua Ceará.

Falência

A crise financeira da Rede São Bento é antiga, tanto que em 2015 a empresa entrou com pedido de recuperação judicial – medida usada para evitar a falência quando a empresa perde a capacidade de pagar suas dívidas. Uma forma de reorganizar novas formas de pagamento.

Na época, a rede tinha 1,2 mil funcionários em 80 lojas, o que resultou numa dívida de R$ 75 milhões, além de cerca de 2 mil credores, considerando também as demandas trabalhistas.

Atualmente, conforme apurado pela reportagem, os votos dos relatores no TRT já estão prontos para julgamento e o dinheiro das fazendas penhoradas podem estar em caixa. Apenas o julgamento pode dar fim à espera dos ex-funcionários.

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