Criado há 8 meses, programa de cirurgias gratuitas para vítimas de bullying não realizou nenhum procedimento
Até o ano passado, 208 pacientes estavam na fila de espera para cirurgias reparadoras em Campo Grande
Lethycia Anjos –
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Em maio de 2023, Mato Grosso do Sul anunciou que pré-adolescentes e jovens em idade escolar teriam o direito a cirurgias plásticas reparadoras gratuitas. Inédita no país, a ação integra o projeto ‘MS Saúde: Mais Saúde, Menos Fila’, e visa ampliar o combate ao bullying e reduzir a evasão escolar decorrente dessas situações.
No entanto, passados oito meses nenhuma cirurgia reparadora foi realizada em adolescentes vítimas de bullying no Estado.
Na lista de procedimentos inclusos, estão cirurgia mamária feminina não estética; plástica mamária masculina; e tratamento cirúrgico não estético da orelha (otoplastia). Até o ano passado, 208 pacientes estavam na fila de espera das três cirurgias reparadoras em Campo Grande. Ainda nesse rol de cirurgias preventivas de bullying, foram incluídos 30 encaminhamentos para correção de estrabismo na lista de espera da área oftalmológica.
Questionada sobre o número de cirurgias reparadoras realizadas desde a implementação do projeto, a SES (Secretaria de Estado de Saúde) informou que as cirurgias destinadas a estes procedimentos serão realizadas no primeiro semestre de 2024, ou seja, nenhuma cirurgia reparadora foi realizada nos últimos oito meses.
Projeto gerou polêmica
Embora especialistas enfatizem a importância do projeto no combate ao bullying, muitos ainda veem as cirurgias reparadoras como procedimentos meramente estéticos e que escapam do real combate à discriminação. Na época em que foi lançado, o projeto foi alvo de críticas nas redes sociais por pessoas que o consideraram ‘desnecessário’.
Em meio a isso, episódios de humilhação e agressão entre estudantes se tornaram cada vez mais frequentes: somente em 2022, Mato Grosso do Sul registrou 142 casos de violência escolar em função de alguma situação estética.
Além de trazer inúmeros prejuízos à vítima, o bullying contribui para o aumento dos índices de evasão. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar mostram que, em 2022, 13,4% dos estudantes deixaram o ambiente escolar por não se sentirem seguros – índice que fez com o que Mato Grosso do Sul ficasse em segundo lugar no ranking, atrás apenas de Roraima.
O levantamento apontou, ainda, que 29,2% dos estudantes de Campo Grande sofreram provocações mais de uma vez no intervalo de 30 dias.
Vale lembrar que alguns procedimentos, como a otoplastia, já estão previstos no SUS (Sistema Único de Saúde). O procedimento é realizado quando há comprovação médica que a condição afeta a saúde da pessoa ou interfere, de forma grave, em seu bem-estar.
Dados da SBCP (Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica) apontam que o problema afeta cerca de 5% da população mundial, que, além do desconforto estético, tem um impacto direto na autoestima. Pessoas afetadas por essa condição genética costumam enfrentar situações de bullying, baixa autoestima, sensação de insegurança e até mesmo distúrbios psicológicos.
Mais Saúde, Menos Fila
Com a meta de zerar as filas de cirurgias em MS até abril de 2024, o Programa Mais Saúde, Menos Fila anunciou no ano passado que daria andamento em 1.375 cirurgias judicializadas, já em fase de cumprimento de sentença, das quais cerca de 90% eram ortopédicas.
De maio de 2023 a fevereiro de 2024, o programa realizou 25.591 atendimentos, conforme aponta os dados da SES (Secretaria de Estado de Saúde). Desse total, 14 mil correspondem a exames (54%) e 11.583, a cirurgias (45%).
Entre os procedimentos realizados estão cirurgia no aparelho de visão (7.626), aparelho digestivo (2.381) sistema osteomuscular (723), aparelho geniturinário (488), vias aéreas superiores da face e cabeça (202) e aparelho circulatório (163).
Além das cirurgias reparadoras, o programa oferta cirurgias eletivas nas especialidades de oftalmologia, otorrinolaringologia, cirurgia vascular, cirurgia geral, ortopedia, ginecologia e urologia.
Já os exames diagnósticos incluem ressonância magnética com contraste, ressonância magnética (sedação), tomografia computadorizada, endoscopia, densitometria, eletrocardiograma, ecocardiograma transtorácico, ultrassonografia, entre outros.
Ao todo, foram investidos R$ 52,9 milhões no programa, sendo R$ 45 milhões em recursos estaduais e R$ 7,9 milhões em recursos federais. O menor benefício até o momento já previsto é para procedimento cirúrgico de pterígio — condição conhecida popularmente como ‘carne no olho’ — no valor de R$ 500.
Já o maior incentivo, previsto em R$ 30.516,28, é a cirurgia para correção de quadril. Para tratamento de varizes, por exemplo, custeio da modalidade bilateral chega a R$ 2.910.20, enquanto a cirurgia para artrodese da lombar anterior pode ser bancada em R$ 26.810,56.
Como entrar na fila?
Apesar de se tratar de um programa estadual para custeio dos procedimentos, a seleção dos pacientes ficará a cargo dos municípios de Mato Grosso do Sul. O Jornal Midiamax buscou entender o ‘caminho’ que deve ser percorrido por pacientes e responsáveis até a realização da cirurgia.
Segundo a Sesau (Secretária Municipal de Saúde de Campo Grande), o acesso para o serviço será iniciado nas unidades básicas de saúde da Capital.
Assim, o paciente passará por uma consulta com o médico geral, que deverá realizar o encaminhamento para uma consulta especializada. Logo depois, o profissional especializado que determinará se a pessoa precisa ou não da cirurgia.
Caso o reparo cirúrgico seja necessário, o médico indicará o procedimento e o paciente será inserido no Sisreg (Sistema de Regulação) – a conhecida fila – e deverá aguardar a disponibilidade de uma vaga.
Moro no interior, como faço?
Para pessoas que residem em municípios do interior, o caminho é basicamente o mesmo. Entretanto, a unidade de origem deverá inserir o pedido no sistema, sugerindo o encaminhamento para um serviço de referência.
Por fim, o tempo de espera para a realização do procedimento irá variar conforme a complexidade, quadro clínico do paciente e oferta de vagas.
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