No suporte que deveria sustentar um balanço, sobraram apenas as correntes. As praças mudam, mas o cenário nos parquinhos de Campo Grande permanecem o mesmo: ferrugem, sujeira e brinquedos quebrados. Enquanto isso, crianças brincam no que deveria ser uma academia ao ar livre e dividem espaço com pessoas em situação de rua.

Em meio à precariedade das áreas destinadas ao lazer na cidade, a pergunta que fica é: você confia em deixar seu filho brincar nos parquinhos públicos de Campo Grande?

Balanço quebrado na Praça das Araras
Balanço quebrado na Praça das Araras (Foto: Nathalia Alcântara, Jornal Midiamax)

Na Praça das Araras, quatro brinquedos são disponibilizados para as crianças. No entanto, dois foram quebrados. O balanço, tem base para três assentos, mas o do meio foi arrancado. Quanto à gangorra, metade ainda funciona. Na outra, restou apenas a estrutura de ferro fincada ao chão.

Expostos ao sol e à chuva, os brinquedos que ainda permanecem inteiros exibem inúmeras marcas de desgaste e pichações.

Gangorra quebrada
Gangorra quebrada na Praça das Araras (Foto: Nathalia Alcântara, Jornal Midiamax)

Além disso, ao lado do parque, a Praça Cuiabá se transformou em moradia para pessoas em situação de rua e dependentes químicos – o que, segundo os moradores, torna ainda mais difícil para as crianças ocuparem espaços como este.

“Está tão desgastado que crianças brincam no ‘estica velho'”

A situação se repete no parquinho da Praça Ary Coelho, onde o único brinquedo com ‘boas’ condições de uso é um escorregador, mas de tão velho até já perdeu a cor.

Osvaldo Mazzaro
Osvaldo Mazzaro (Alicce Rodrigues, Midiamax)

Osvaldo Mazzaro mora em um prédio em frente à Praça. Por isso, sempre que pode, leva a bisneta Ana Julia, de sete anos, para brincar no local.

Para o morador, a situação do parque reflete o descaso da prefeitura com os espaços de lazer da Capital.

“Já foi um parque muito melhor, tinha mais brinquedos. Agora está deteriorado, enferrujado, isso é um verdadeiro desleixo, em pleno coração da cidade”, destaca.

Em meio a um cenário desanimador, as crianças optam por brincar nos equipamentos disponibilizados na academia ao ar livre. Em pouco tempo no local, a reportagem observou o parquinho vazio, enquanto seis crianças brincavam nos equipamentos destinado à prática esportiva.

“Os brinquedos estão tão desgastados que as crianças preferem brincar na ‘estica velho’ [academia ao ar livre]. Tinha que ter investimento, reforma, trazer novidades. É preciso olhar melhor para esses espaços que, infelizmente, deixam a desejar”, diz Osvaldo.

Brinquedos da Praça Ary Coelho
Brinquedos da Praça Ary Coelho (Alicce Rodrigues, Jornal Midiamax)

Pai de Enzo Gabriel, de sete anos, e de Pedro, de cinco anos, José Alves admite que não confia em deixar os filhos brincando no local. No entanto, sem parques próximos ao seu bairro, o Jardim Los Angeles, a única solução é se deslocar até o Centro.

“Confiar, eu não confio, tanto que não saio do pé deles. Não sinto segurança porque os parques estão em situações precárias. Falta investimento em lazer para as crianças”, afirma José.

‘Faltam opções de lazer nos bairros’

Formigueiros na Praça do Rádio
Formigueiros na Praça do Rádio (Foto: Alicce Rodrigues, Jornal Midiamax)

José ressalta que, além da precariedade dos parquinhos, há uma insegurança causada pelo alto número de pessoas em situação de rua nas praças. Além disso, a falta de opções de lazer nos bairros expõe a desigualdade entre quem mora na periferia e os que vivem no centro.

“Meu bairro é o Los Angeles, lá não tem nada para as crianças fazerem. Até levo meus filhos na avenida principal para andar de bicicleta, mas a ciclovia não está bem feita e traz perigo para as crianças”, explica.

Para Danuza Pinheiro, mãe de Miguel, de seis anos, o problema é o mesmo. Devido à falta de opções de lazer em seu bairro, Jardim Colúmbia, a solução é utilizar os parquinhos de praças e parques da região central.

“Campo Grande precisa ter mais opções para as crianças. Com a falta de brinquedos, as ‘bençãos’ só gostam de ir na academia ao livre, mas não é apropriada para isso”.

Precariedade coloca crianças em risco

Parquinho na Praça do Rádio
Parquinho na Praça do Rádio (Foto: Alicce Rodrigues, Jornal Midiamax)

Na Praça do Rádio, a situação do parquinho é tão precária que, mesmo em dia de feriado, não se vê crianças no local. Dos dois balanços de plástico ‘disponíveis’, um estava quebrado; no gira-gira, as engrenagens estavam duras e enferrujadas; e na gangorra falta um lado devido ao banco quebrado. O escorregador? Também danificado.

Apesar da péssima condição, os brinquedos não foram retirados ou interditados, o que torna o local propício à ocorrência de acidentes. Além disso, na praça há inúmeros formigueiros que também oferecem riscos às crianças.

Em todos os pontos percorridos pela cidade, apenas dois apresentam parques em boas condições de uso: a Orla Morena e o Parque das Nações Indígenas (gerido pelo Governo do Estado). Na Orla, apesar do balanço estar quebrado, havia um aviso que sinalizava o perigo de usá-lo.

Parquinho Parque das Nações
Parquinho no Parque das Nações Indígenas (Foto: Nathalia Alcântara, Jornal Midiamax)

ECA assegura o acesso ao lazer

Muitas vezes negligenciado, o acesso ao lazer é um direito de toda criança e adolescente, assegurado por lei. No entanto, sem espaços públicos de qualidade, esse direito acaba inviabilizado e restrito a determinadas classes sociais, já que pessoas de baixa renda acabam limitadas a espaços precários, quando há opção.

O Artigo 16 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), de 1990, estabelece que a criança e o adolescente têm o direito de “brincar, praticar esportes e divertir-se”.

Balanço vazio
Balanço vazio (Foto: Nathalia Alcântara, Jornal Midiamax)

Além disso, a Constituição de 1988, em seu Artigo 227, estipula que “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer”.

A garantia do direito de a criança brincar também está expressa na Declaração Universal dos Direitos da Criança, da ONU (Organização das Nações Unidas), de 1959. O Princípio 7º determina que “a criança terá ampla oportunidade para brincar e divertir-se”.

Conforme a Constituição Federal, o direito à moradia digna também é garantido e deve ser assegurado em competência comum da União, dos estados e municípios. No entanto, isso não impede que cada vez mais pessoas em situação de rua ocupem parques e praças de Campo Grande.

O que diz a Prefeitura?

Estrutura do balanço
Estrutura do balanço (Foto: Nathalia Alcântara, Jornal Midiamax)

Questionada sobre a situação precária dos parquinhos e o uso indevido da academia ao ar livre, a prefeitura de Campo Grande, por meio da Funesp (Fundação Municipal de Esporte), esclareceu que realiza visitas regulares para verificar as condições dos aparelhos. Contudo, não esclareceu a situação dos parquinhos.

Conforme a Funesp, caso os usuários identifiquem a necessidade de manutenção em algum equipamento, podem encaminhar suas demandas de duas maneiras. A primeira é por meio do envio de um ofício diretamente para a Funesp, na Rua Dr. Paulo Machado, nº 663, bairro Santa Fé.

A segunda opção é realizar o encaminhamento de uma mensagem no link “Fale Conosco”. Além disso, é possível entrar em contato com a ouvidoria por meio do telefone (67) 3314-4639 ou enviar um e-mail para ouvidoriageral@cgm.campogrande.ms.gov.br.

Sobre a falta de espaços de lazer no Los Angeles, a Funesp informou que está prevista a instalação de academias ao ar livre no bairro ainda neste primeiro semestre de 2024.

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