Um dos símbolos dos ‘Anos Dourados’ em Campo Grande, Clube Libanês está à venda por R$ 4,3 milhões

O Clube Libanês foi por muitos anos o ponto mais badalado de Campo Grande com bailes, formaturas e casamentos. Atualmente, espaço precisa de manutenção para “reviver” centro

Nathália Rabelo – 19/08/2023 – 07:21

Ouvir Notícia Pausar Notícia
Compartilhar
Clube Libanês em Campo Grande
Clube Libanês, na Rua Dom Aquino, está à venda (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

Impossível pensar na história de Campo Grande sem associá-la ao simbolismo que o Clube Libanês representa à Capital. Com mais de 60 anos, o casarão verde situado no coração de Campo Grande foi palco de grandes festas e eventos das comunidades libanesas que encontravam no espaço um lugar de comunhão e sinergia de culturas.

Não é à toa, portanto, que o clube tenha sido, por muitos anos, um verdadeiro “point” da vida noturna campo-grandense, com os seus famosos bailes. No entanto, a cidade cresceu, novos empreendimentos surgiram e o Clube Libanês ficou na história e no imaginário de quem ali viveu a sua juventude. Fechado há anos, espaço foi colocado à venda por R$ 4,3 milhões.

O imóvel, situado na Rua Dom Aquino é ofertado para fins comerciais e conta com área total de 1.290 m². Desse total, 1.129,48 m² de área construída. Imóvel ainda tem acesso à água, asfalto, calçada, esgoto, muro, piso tátil, rampa de acessibilidade e rede elétrica. “Imóvel comercial em excelente localização, contento ambiente térreo e piso superior, com várias repartições e banheiros disponíveis”, informa a corretora de imóveis.

Clube Libanês
Clube Libanês tinha bailes, formaturas e diversos eventos (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

Por trás de uma fachada já desgastada pelo tempo e da porta que há anos não recebe visitantes, existem memórias eternas de pessoas que se deparavam com a felicidade lá dentro. Vamos recordar um pouco dessa história? Confira.

Clube Libanês: a nostalgia no coração campo-grandense

Em meio ao movimento da Rua Dom Aquino fica preservado o prédio do antigo Clube Libanês. Espaço é um “tesouro perdido” que atualmente passa despercebido pelos pedestres, mas que antigamente era o lugar mais badalado da cidade com festas, carnavais e bailes que duravam a noite toda.

Por lá, histórias se acumulavam no prédio que lutou por anos para se manter vivo, mas que viu os seus anos dourados ficarem no passado.

O Clube Libanês foi construído ao longo de 10 anos, entre 1952 e 1962, por 400 libaneses que se dedicavam à obra apenas aos fins de semana, quando tinham tempo disponível, e utilizaram de recurso próprio para manter a construção.

Clube Libanês
Interior do Clube Libanês quando eventos eram realizados (Marcos Ermínio, Jornal Midiamax)

O povo libanês, a propósito, faz parte do grupo de imigrantes que compõe a identidade cultural da cidade, ao lado de japoneses, sírios, paraguaios e portugueses, dentre outros. Entre os fundadores do clube, está Cônsul Assaf Trad, avô do ex-prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad.

Festas, casamentos e carnavais

A inauguração aconteceu assim que as obras terminaram, em 20 de outubro de 1962. Desde então, o Libanês, ao lado de grandes clubes da época como Estoril, Surian e Rádio Clube, fez parte da vida social das famílias de Campo Grande. Entre os eventos que aconteceram no clube estão formaturas, bailes de debutantes, shows, apresentações de orquestras, carnavais e casamentos.

A aposentada Mariam Kodjaoglanian, hoje com 74 anos, chegou a dar entrevista para o Jornal Midiamax em 2018 para recordar a sua vida social no Clube Libanês nos anos 60 e 70.

“Fui em vários casamentos lá. Inclusive, da minha irmã. Era um clube lindo, enorme. Estava entre os 3 ou 4 maiores e mais frequentados clubes de Campo Grande. Todos os anos havia 5 noites famosas de carnaval. Íamos de clube em clube todas as noites”.

Quando questionada sobre o atual estado do clube, Miriam ressalta que não houve uma decadência. “Não entro no Libanês já faz 10 anos. Os tempos mudam. O lugar foi substituído por outros que a nova geração frequenta. Não foi uma perda, o progresso substituiu. Houve uma modificação, não decadência”, disse ela na época.

“Fiz muitos amigos lá”

O Clube passou por transformações após o surgimento de novos estabelecimentos e o advento da modernidade. Com cada vez menos sócios, o Clube tinha apenas um projeto em atividade e se transformou em uma casa de bailes para o público da terceira idade.

Quem fazia as festas para o público mais velho era Ruth Ribeiro. Ela ficou na atividade por cerca de 18 anos e realizava os bailes todas as sextas-feiras e domingos, das 18h às 23h30. Na época, ela elencou as maiores dificuldades de manter as portas do Clube Libanês abertas.

“É uma pena, porque é um clube maravilhoso. Para manter um clube desses tem que ter sócios, mas não há mais o interesse. Aqui tiveram peças de teatro, desfiles de moda, quando não tinha esses outros lugares. É uma pena isso não continuar […] Quando comecei a frequentar o baile em 1999 tínhamos uma base de 50 pessoas. Hoje em dia são mais de 150, 200 casais. E o público é mais a terceira idade. Há jovens, mas não muitos. Aqui não tocamos sertanejo, é dança de salão. Gosto de mexer com isso aqui”, disse ela à reportagem em 2018.

Ruth Ribeiro Clube Libanês
Ruth Ribeiro, responsável por realizar as festas para terceira idade no Clube Libanês (Marcos Ermínio, Jornal Midiamax)

A pensionista Hermínia De Campo Ribeiro, de 64 anos, lembra bem dos bailes. Frequentadora assídua dos bailes para a terceira idade, ela “batia ponto” no evento Domingueira que acontecia no antigo Libanês. Ela recorda junto ao Jornal Midiamax que era o momento de se divertir com os amigos e a família.

“Fiz muitos amigos lá e tenho eles até hoje. Tinha dança, pessoal chamava pra dançar, era maravilhoso. Eu frequentava com o meu marido, que era ferroviário, com as amigas. Lembro que fechou um tempo e abriu a Domingueira. Era muito bom. Levei muitos colegas e meus filhos ficavam na porta me esperando. Iam mulheres, homens, solteiros e viúvas. Sem o Clube ficou uma opção a menos de lazer”, recorda Hermínia.

Nas redes sociais, muitos antigos frequentadores recordaram com carinho do clube. “Vivenciei momentos inesquecíveis neste clube. De Carnaval a bailes, passando pela discoteca e danceterias. Ah! Ainda teve a academia de ginástica! Tá tudo na memória da história”, disse um morador em post do Facebook.

“Nesse Clube em 1972 numa terça-feira de Carnaval, comecei o namoro com minha esposa. Vamos completar ano que vem 50 anos de casados. Muitas saudades”, disse outro internauta.

Prédio pode ser comprado ou alugado

Quem está à frente da venda do imóvel é a corretora Lara Sleiman, parente da família dona do espaço. Ela contou ao Jornal Midiamax que o antigo proprietário do Clube, o libanês Abdallah Georges Sleiman morreu em 2021 e que o prédio foi herdado por uma de suas filhas, Yassmin Sleiman Saab. A venda do imóvel vem de acordo com o objetivo de voltar a dar vida ao espaço depois do seu fechamento.

Por isso, o Clube Libanês pode ser comprado por R$ 4,3 milhões – ou alugado por R$ 20 mil. “A gente quer voltar a movimentar aquela parte da Dom Aquino porque o prédio está sem manutenção, precisa ter alguém para dar vida ao imóvel”, diz.

O prédio abrigava uma academia no andar de cima, que fechou em 2012, e realizava os bailes da terceira idade. O fechamento ocorreu em meados de 2018, segundo a corretora, porque ficou inviável de receber as pessoas lá dentro por faltas de manutenção. Além disso, o custo para manter tudo arrumado era muito caro e a antiga locatária não conseguia arcar financeiramente. Para evitar danos materiais e riscos aos visitantes, o espaço veio a fechar. Lara ainda explica que o espaço conta com cinco IPTUs que devem chegar a R$ 30 mil. Além disso, o prédio conta com a presença de guardas que fazem a segurança do local.

Clube Libanês
Clube Libanês, na Rua Dom Aquino (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

“O estado de conservação não permitia mais ninguém lá dentro e, para evitar danos, o proprietário decidiu fechar. Por isso a pessoa que for alugar ou comprar tem que fazer os reparos. Por dentro não tem rachadura, está perfeito, mas precisa fazer manutenção. O telhado, por exemplo, está condenado, está bem antigo e precisaria trocar. Tem que fazer reparos e reformar. O que a gente quer é voltar a dar vida naquela região central. Pode ser uma igreja, escritório, uma empresa, um coworking. Daria para movimentar o centro com vários comércios”, conclui.

Conteúdos relacionados