Passageiros fogem dos ônibus em Campo Grande, e queda de usuários pode ajudar empresas
As empresas podem estar se preparando para aproveitar a queda no número de usuários na renegociação do contrato milionário de concessão do transporte coletivo urbano em Campo Grande, mas os passageiros culpam o próprio Consórcio Guaicurus e a Prefeitura Municipal pela ‘fuga’ para alternativas como motos de baixa cilindrada e aplicativos de mobilidade. A qualidade […]
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As empresas podem estar se preparando para aproveitar a queda no número de usuários na renegociação do contrato milionário de concessão do transporte coletivo urbano em Campo Grande, mas os passageiros culpam o próprio Consórcio Guaicurus e a Prefeitura Municipal pela ‘fuga’ para alternativas como motos de baixa cilindrada e aplicativos de mobilidade. A qualidade do serviço é péssimo, e o preço da passagem, alto.
Recentemente, até o diretor-presidente da Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito), Janine de Lima Bruno, endossou o discurso sobre a ‘tendência nacional dos aplicativos de mobilidade’, e deixou escapar que a situação ainda poderia justificar a redução de 15% na frota.
Coincidentemente, na sequência, as empresas foram à Justiça pedir dados que, de acordo com o contrato milionário assinado na gestão do ex-prefeito Nelson Trad Filho (PSD), já deveriam estar disponíveis sobre a exploração do transporte coletivo em Campo Grande.
A suspeita é de que uma eventual renegociação contratual melhore ainda mais os lucros das empresas, e prejudique os passageiros e empregados do transporte coletivo urbano de Campo Grande.
Na Câmara Municipal, vereadores já antecipam que a ideia de todo o ‘episódio’ seria criar ambiente favorável para renegociar o contrato favorecendo ainda mais os empresários com a liberação de obrigações básicas, como manter os ônibus da frota com idade mínima de 10 anos.
“Isso aí é um teatro que já vimos antes, para terminar sempre a favor dos donos das empresas e com prejuízos para os passageiros e os empregados”, resumiu parlamentar que não quis se identificar.
Ônibus ruins: mais motos e ‘epidemia de traumas’
Entre os principais interessados, passageiros que dependem diariamente de ônibus, sobra insatisfação. Uma pesquisa realizada pelo Ibrape apontou que apenas 16% dos clientes considera os serviços bons ou razoáveis. O resto, considera o transporte coletivo de Campo Grande ruim ou péssimo.
Como o preço é alto, ganham força alternativas como comprar motocicletas de baixa cilindrada, que são econômicas e práticas, ou usar aplicativos de carona, que oferecem comodidade muitas vezes com o mesmo preço que o passe de ônibus para locomoção de famílias, por exemplo.
Os prejuízos para a cidade são enormes. Com mais motos nas ruas, o trânsito faz mais vítimas e aumentam os gastos com a verdadeira ‘epidemia de traumas’ apontada pelos hospitais. Com menos gente usando ônibus, mais carros disputam espaço com as motos, pioram o trânsito e se envolvem em acidentes, poluem mais, etc.
Nas ruas de Campo Grande, os passageiros chegam a admitir que muitas vezes, quando podem, preferem pagar um pouco mais por corridas com motoristas de aplicativos, por exemplo, do que esperar a demora e lotação dos ônibus caindo aos pedaços.
De tão ruim, quem pode, não usa
A prestadora de serviços gerais, Joelma da Silva, de 47 anos, gasta em média R$ 19 reais por corrida de aplicativo para fazer o trajeto do bairro Vieira Park, até o serviço. Ela poderia pagar os R$ 3,95 da passagem de ônibus, mas sempre que pode, prefere gastar quatro vezes mais pelo conforto.
“Na verdade eu queria que o serviço do ônibus fosse de qualidade e isso que disseram sobre os aplicativos serem o motivo de diminuir a frota é desculpa para não colocar novos veículos para circular”, reclama.
“As linhas do Santa Emília e Portal Caiobá, por exemplo, estão velhas e não sei porque só os ônibus do centro têm ar condicionado. Situação precária”, lamenta a passageira.
Já a auxiliar de cozinha, Eliane Santos de Oliveira, de 35 anos, usou o transporte coletivo urbano campo-grandense por anos. Justamente por não aguentar mais as condições precárias dos veículos, comprou uma motocicleta.
“Você sai às 17 horas, cansado e não encontra lugar para sentar, além de muita gente nova não respeitando os mais velhos. Não me arrependo de ter comprado uma moto, mas entre pegar ônibus e um carro por aplicativo prefiro pagar pelo carro”, pondera.
O estagiário Felipe Chianezi de Sá, de 24 anos, preferiu deixar o passe que ganhou da empresa em casa. “Eu preferi gastar um pouco mais do meu bolso do que depender do transporte coletivo, pois a qualidade do serviço deixa muito a desejar. Outro ponto, é a falta de conforto, não é nem a questão de sentar no ônibus, mas a superlotação em todos os veículos no horário de pico”, reclama.
Denúncia antiga, reação nova
Na última terça-feira (7), o diretor-presidente da Agetran, Janine de Lima Bruno, afirmou que um novo contrato para o transporte coletivo urbano pode reduzir ainda mais a frota. E até antecipou um percentual: 15%, reforçando as suspeitas sobre a ‘coincidência’ da fala com o pedido na justiça das empresas.
Conforme Janine, a redução seria proporcional à queda de 15% no número de usuários, que se deve a tendência nacional, após o aumento dos aplicativos de mobilidade.
Ao mesmo tempo, o serviço oferecido pelo transporte coletivo de Campo Grande, é alvo de polêmicas, principalmente, no que diz respeito a qualidade da frota.
No início do mês, após inúmeras denúncias e flagrantes de ônibus rodando fora da idade limite, feitas inclusive pelo Jornal Midiamax, ao longo dos últimos anos, finalmente o prefeito Marquinhos Trad (PSD) tomou uma atitude para pressionar o Consórcio Guaicurus.
Os empresários receberam o prazo de 15 dias para substituir cerca de 50 ônibus vencidos já há bom tempo. Caso o consórcio não cumpra a obrigação, que já estava no contrato milionário que ganharam e conheciam desde antes de concorrerem, pode levar uma multa de R$ 2,7 milhões por desobediência de contrato.
O valor ainda é pouco, perto do lucro anual das empresas, mesmo levando em conta apenas os cerca de R$ 12 milhões de reais por ano como valor de referência.
‘No limite das forças’
A reportagem entrou em contato com o Consórcio Guaicurus através da assessoria de imprensa mas, como tem sido usual nos últimos anos, não obteve resposta até o momento.
No entanto, em resposta à decisão da Prefeitura, o Consórcio Guaicurus foi à justiça solicitar perícia no contrato milionário de concessão do transporte público e afirmou que as empresas que exploram o transporte coletivo com frota vencida operam “no limite de suas forças”.
Conforme o pedido, a perícia deverá responder algumas questões, entre elas, a diminuição no número de passageiros e aumento da concorrência de aplicativos e motos.
O Consórcio afirmou ainda, que enfrenta dificuldades financeiras econômicas causadas por “desajustes/fatos novos ocorridos após o contrato”.
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