Disse ter sido ‘usado pelo diabo'

Depois de ser condenado a pagar R$ 100 mil de aos filhos por manter a família em cárcere privado por mais de 20 anos, o marido de Cira Belarmino dos Santos, teria procurado o sogro para pedir perdão. “Ele me pediu perdão. Disse que foi o diabo que fez ele fazer coisa errada né”, disse o aposentado de 77 anos.

Com emoção, o pai de Cira lembra dela ainda sofrendo por conta de um câncer ocasionado depois de uma lesão no joelho. “Ela veio para casa e tava com aquele machucado na perna. Ele não deixava ela ir ao médico. Conversei com ela até que ela foi. Passou pela primeira cirurgia e tudo ficou bem. Mas depois de um tempo o machucado voltou e descobrimos que era câncer. Foram 60 dias até que ela não resistiu”, disse.

O aposentado, que faz bico de vigilante para dar conta de cuidar da casa em que mora junto com a esposa – atualmente acamada por questões de saúde – , os três netos adolescentes e mais duas filhas, diz saber que o acusado não tem dinheiro para pagar a indenização, mas que espera que pelo menos ele venda o terreno onde fica a casa da família, no bairro Aero Rancho na Capital,  e divida o dinheiro entre os filhos. “Os três adolescentes ficaram comigo. O mais velho casou, tá no quartel mas vem sempre visitar a gente. O pai deles não tem dinheiro. Eu sei que não tem. Quero que o juiz fale para ele vender pelo menos o terreno e dê o dinheiro das crianças”, contou.

“Nós estamos bem. As crianças estão bem, quando lembram da mãe ficam tristes, muito sofrimento né? Eu conheci eles depois de grande, mas a gente vive bem, eles não estranharam não, e não querem de jeito nenhum morar com o pai”, explicou o idoso ao ser questionado sobre a relação com os netos já grandes.

Cira teria conhecido o marido durante o trajeto do trabalho e quando apresentou o então namorado para a família de acordo com o pai, que teria alertado para que ela não casasse. “Eu disse para ela não casar, mas ela quis. Cheguei a ir na polícia para ver se ela voltava para casa, mas ele já estava ameaçando ela. Ele não deixava a gente se ver. Eu fiquei muito triste”, falou o aposentado.Após morte de Cira, marido agressor procurou sogro para pedir perdão

Foram 22 anos de , e a família de Cira só teve conhecimento após a polícia constatar a veracidade das denúncias. “Os vizinhos que denunciaram junto com o agente de saúde, aí que a gente foi descobrir. A polícia me levou lá. Eles não tinham nem água para tomar banho. Muito sofrimento, só Deus mesmo para ajudar”, concluiu.

O pai de Cira contou ainda que só teria encontrado com o genro, depois de tudo vir à tona,  no Fórum. “Eu não vi mais ele. A gente se falou por telefone. Só encontrei com ele no Fórum lá da Justiça”.

A equipe de reportagem do Jornal Midiamax entrou em contato com o acusado, mas ele se recusou a dar entrevista dizendo que já teria procurado um advogado.

Caso

O pedreiro manteve a mulher em cárcere privado durante 22 anos, a história veio à tona em 2013 após um agente de saúde visitar a casa onde a família morava no bairro Aero Rancho e constatar que no local não existia nem banheiro. 

O homem foi condenado em junho de 2014 pela 2ª Vara de Violência Doméstica pelos crimes de lesão corporal, constrangimento ilegal e ameaça, em relação à esposa Cira Belarmino dos Santos. Em janeiro do ano seguinte, a condenação foi dada pela 7ª Vara Criminal por maus tratos e constrangimento ilegal em relação aos seus quatro filhos.

Após a primeira condenação criminal, a Defensoria Pública entrou com uma ação de reparação de danos morais contra o pedreiro. Com a morte da mulher em 2015 devido a um câncer em uma das pernas, o processo foi assumido pelos filhos por serem herdeiros.

O casal vivia juntos desde 1991 e a mulher sofria violência desde o começo do relacionamento. O patriarca da família foi acusado de ameaçar de morte e até de agredir a esposa porque ela havia aceito pães de uma vizinha na época. O pedreiro também foi denunciado pelo Ministério Público por maus tratos e cárcere privado após a constatação de ele não deixa a família sair de casa.

As condições de vida da família eram precárias, sendo que os filhos eram impedidos de frequentar a escola, tinham que ajoelhar para se dirigir ao pai além de sofrerem constantes agressões verbais, psicológicas e físicas. Uma das crianças já teria quebrado um braço quando tinha 3 anos.