Inauguração teve tentativa de protesto e homenagens

Se há poucos meses ela era alvo de questionamento judicial , neste domingo a ciclovia da Avenida Paulista provou que veio para ficar e marcar de vez, e na cor vermelha, o principal cartão postal da cidade de São Paulo. A inauguração, que aconteceu de manhã, fechou a via para os carros e foi marcada pela presença massiva de ciclistas, cicloativistas e pedestres – com ou sem animais de estimação – que aproveitaram o clima de parque do local e o tempo bom para mudar a paisagem rotineiramente marcada pelos congestionamentos. Parentes de pessoas que morreram de bicicleta na avenida também compareceram.

Presente de manhã na Paulista com os filhos e a mulher, Ana Estela, o prefeito Fernando Haddad (PT) admitiu que o fechamento da Paulista aos domingos deve ser a próxima empreitada pela ocupação da via como espaço de convivência. Antes disso, porém, o Minhocão deve ser fechado à circulação de carros também aos sábados – atualmente, é apenas aos domingos.

 “O fechamento definitivo [da Paulista] aos domingos é alvo de um estudo a cargo da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), que testa dois modelos: o da Paulista e o do Minhocão. E lembrando que a Paulista já foi fechada, no passado, aos domingos – um por mês. No caso da avenida, o estudo sobre isso partiu dos técnicos; no caso do Minhocão, a proposta partiu da comunidade local”, afirmou.

Indagado sobre prazos, o prefeito disse apenas que “nos próximos meses” deve haver uma resposta. “Não temos pressa. Mas é importante porque ela é um espaço público, e faltam espaços públicos. As pessoas moram em apartamentos e, quando não estão em um dia de trabalho, querem ar livre para que possam respirar”, afirmou.

Haddad concedeu entrevista coletiva em frente ao hospital Santa Catarina, da rede privada. Enquanto ele falava, pessoas que saíam da instituição tentaram tumultuar a entrevista com gritos de “Sérgio Moro” – referência ao juiz da operação Lava Jato que determinou a prisão de petistas e nomes de outros partidos acusados de participar de esquemas de corrupção na Petrobras. “Obviamente que essas pessoas sabiam que eu ia estar aqui… tem uma certa infiltraçãozinha, mas a gente tem que respeitar, porque a manifestação é democrática”, minimizou o petista.

Ao sair para uma pedalada entre o hospital e a Praça do Ciclista, Haddad foi aplaudido por ciclistas e cicloativistas que gritaram, por alguns minutos, o nome do prefeito. Uma equipe de TV do programa “Pânico”, da Band, por outro lado, foi hostilizada aos gritos de “fora”. Mais tarde, o mesmo aconteceria com manifestantes do Movimento Brasil Livre, os quais protestavam contra as “pedaladas” fiscais investigadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) nas contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff (PT).

O sceretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto, reagiu com deboche a um dos manifestantes que o hostilizaram junto a Haddad. “O cara falou para eu ir pra Cuba. Mas até o Obama foi”, riu.

De acordo com Tatto, a proposta do município é pela “abertura da Paulista”: “Acho bom fechar todo domingo. Temos que abrir a Paulista, que hoje está fechada – e abrir para todos: aos ciclistas, aos pedestres, aos veículo não motorizados”, sinalizou. “Do ponto de vista da circulação viária, não há dificuldade nenhuma: há várias alternativas na cidade, e já falei com a área técnica da CET, que consegue uma operação espacial aos acessos de hospitais e a moradores da região, por exemplo, comko já é feito perto do Autódromo de Interlagos quando acontece a Fórmula 1”, declarou. “Não estamos inventando a roda: no mundo todo já estão se abrindo espaços públicos nesses moldes”, enfatizou o secretário.

Ao todo, a ciclovia na Paulista tem 2,7 km de extensão, sem contar o 1,7 km de ciclovia também na rua Itápolis. A via tem duas mãos e ocupa o canteiro central da avenida entre a Praça Oswaldo Cruz e a rua Haddock Lobo, mais um trecho, após o túnel de acesso à avenida Rebouças, entre a rua da Consolação e a avenida Angélica. No sentido oposto da Paulista, já na avenida Bernardino de Campos, no sentido Vila Mariana (zona sul), estão em andamento obras de requalificação urbana que liguem a Paulista a esse trecho. No total, estão sendo gastos R$ 12,1 milhões oriundos do Fundo Especial do Meio Ambiente, vinculado à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente.

“Haddad lindo”

Com faixas de “Haddad Lindo” na cabeça, as amigas Bianca Macedo, 24 anos, engenheira, e Mariana Araújo, de 28, arquiteta, estavam entre as primeiras a chegar à pedalada de inauguração da ciclovia.

“A Paulista é uma conquista simbólica dos ciclistas, e uma das avenidas onde teve mais mortes de ciclistas em São Paulo. Apoio a política do Haddad, o qual acho que enfrenta muita oposição de uma sociedade ‘carrocrata’. Se a infraestrutura para quem pedala aumenta, aumenta também a demanda – e seria maravilhoso que fechassem a avenida todos os domingos”, opinou Bianca.

“É impressionante o quanto que a gente tem visto de bicicleta em São Paulo em tão pouco tempo. Acho que ter ciclovia e fechar a Paulista aos domingos são coisas distintas, mas acho que esse é um caminho: não apenas ciclistas, mas pedestres querem usar esse espaço como lazer para fazer outras coisas, e não só para a circulação de automóvel. Hoje mesmo, com esse tanto de ciclista aqui, não faz nenhum sentido ter carro na rua”, definiu Mariana.

Presente de bicicleta com o filho de cinco anos “para dar um pouco de adrenalina a ele”, o engenheiro Rogério Cordeiro, de 49 anos, avaliou que a ciclovia “fazia mesmo falta” à Paulista. Se ele defende o fechamento da via todo domingo? “Já tem bastante ciclovia de domingo, e todas bem sinalizadas… Acho que não é o caso de fechar dessa forma, porque pode atrapalhar emergências de hospitais, por exemplo. Mas talvez fechar um domingo por mês seja uma boa ideia”.